LINHA TÊNUE (loucura/mistério)


Quão tênue é a linha reta ou tortuosa entre o desejo e a obsessão, amor e loucura.

Tony amava intenso, odiava imenso, esquecia homeopaticamente e nunca remorso sentia, só o impulso fluía.

Conhecer Liana foi como se um vulcão incandescente entrasse em erupção dentro dele. Numa festa gótica trocaram simples olhares, mas, para ele foi uma declaração de 'amor do tipo pra sempre'...para Liana ele passou quase despercebido, talvez um 'quem sabe' ou mesmo apenas 'mais um' na escuridão da festa.

Liana sentia um desconforto cada vez que cruzava com Tony, ainda que não trocasse uma palavra sequer, isso a incomodava. Em dado momento viu sua amiga Marta passar um papelzinho para ele, talvez ela tenha se interessado por ele, desencanou do cara e foi buscar mais um Bloodmary pois a garganta precisava de febre, a festa estava lenta e chata, talvez melhorasse quando um poeta do estilo fizesse uma pequena apresentação, até lá mergulharia no líquido mágico e gelado da ilusão etílica.

Pouco tempo depois, ela sente alguém à suas costas e era Tony, ele lhe deu um aceno de cabeça com um olhar perturbador, ela esboçou um sorriso do tipo 'SOME!' 

Liana se afasta dele e logo depois, enquanto conversava com um amigo percebe que ele continua com ela no foco, esperou a apresentação do poeta, se despediu dos anfitriões e pegando a jaqueta deixou a festa. Chamou um aplicativo e foi pra casa. Chegando lá tomou um banho demorado e dê vez em quando, ouvia os tons de mensagens entrando em seu celular, no dia seguinte iria lê-se, estava cansada e com tédio, dormir lhe revigorava, pensando assim desligou o aparelho.

Tony não tirava a imagem daquela mulher da cabeça, os olhares dela desnudado o seu ser tumultuou suas emoções, se sentiu o próprio drink que ela sorvia, vermelho, gelado, intenso e o desejo que sentia quando ela passava a língua sobre os lábios, ardia em suas partes mais íntimas, aquela mulher estava caçando e ele era definitivamente, a presa. Pelo menos era o que ele delirava.

Liana desperta com dor de cabeça...muitos drinks na cabeça e o corpo pagando o preço, banho frio, suco de tomate com aipo e vodka, duas aspirinas e silêncio resolveria, ainda bem que era Sábado, morava sozinha e não tinha satisfações a dar para ninguém, dona do seu tempo no vazio solitário da sua casa. Lá pelas tantas da tardinha, toma um suco, come uma salada e enfim liga o celular e se assusta.

Luna vê dezenas de mensagens, declarações de amor descabidas e fotos, várias fotos da porta da sua casa repleta de flores, uma faixa sobre uma almofada de coração, onde estava escrito...Te Amo...
- Como assim!   pensou...que louco isso...

Lendo algumas mensagens percebeu de que se tratava do cara estranho da festa, mas, como ele conseguira o seu telefone, então,  lembrou do papelzinho que vira sua amiga Marta passar para ele...ligou imediatamente para ela e perguntou direto sem rodeios, ela confirmou e Liana surtou, brigou com ela contando o que estava acontecendo e a sua própria impressão sobre ele, desligou possessa com a amiga e bloqueou o telefone do camarada. Jogou tudo que estava em sua porta na lixeira da rua, tomou outro banho e ligou seu aparelho de som donde saiu sons densos e para ela reconfortadores. Ficou pensando no que iria preparar para o almoço e desistiu, pediu um prato tailandês bem apimentado e um doce cremoso, aguardou a entrega, recebeu e comeu e quando foi descartar a embalagem viu escrito à caneta no fundo externo da caixinha a frase...
- Você descartou as flores, mas, a intensidade do seu gesto prova que não me enganei com seus olhares ardentes por mim.  
Aquilo estava ficando perigoso...maldita Marta...que inconsequência...fechou as cortinas, baixou o som e ficou vigiando a rua para ver se o cara aparecia, cansou e ligou a televisão para assistir a um filme e desanuviar a tensão.

Noite alta e Liana como uma coruja insone e alerta. Pega o celular e entra na única rede social que tem e encontra uma publicação do seu próprio convite de casamento, seu status modificado, um monte de comentários com perguntas sobre o segredo que ela fizera sobre aquela relaçâo, até sua mãe ligou pra ela coisa que não fazia há anos, outras pessoas a parabenizavam. Deu a louca avisou ao servidor, cancelou sua página e sentiu um frio na espinha, precisava procurar a polícia só que estava com medo de sair. Na madrugada Liana já parecia um zumbi, cansada, portas e janelas trancadas, empurrou móveis por trás das portas, ligou o som para não ouvir os próprios pensamentos, acabou dormindo com uma inquietude no corpo.

Pela manhã ouve um burburinho na rua e olha através da cortina da sala e a sua garganta seca. Bem em frente à sua porta um carro de som alardeava mensagens de amor eterno para ela e meninas distribuíam brigadeiros aos passantes...o homem era louco e a situação estava ficando insustentável. Mais tarde abriu sua caixa de correspondências e estava lotada de cartas elegantes Com fotos bem próximas das janelas de sua casa..deu medo...ele poderia invadir a casa e ela corria real perigo. Ligou para o Disque Denúncia e desabafou sua apreensão, mas, ela nâo tinha um nome  ou foto para apresentar, não sentiu que fossem ajudá-la, fez o B.O. indicado e lhe restava esperar. Fez um café e comeu uns biscoitos, se trancou no quarto e ouviu psius próximo à janela, com receio entretanto a cortina e viu o rosto com o olhar perturbador de Tony...gritou a altos brados até ficar rouca e ele sumiu pela rua...Liana estava em pânico...tremia por inteiro.

Passou-se uma semana com terrores e ruidos, Liana não saía para trabalhar, pouco se alimentava, dormia a base de calmantes e enveredou pelas bebidas como uma descompensada, via Tony até de olhos fechados, mantinha o som alto ligado para abafar os ruídos e batidas em portas e janelas, não atendia nenhuma ligação estava surtada e apavorada.

O Domingo seguinte chegou, Liana amanheceu trôpega e xingando impropérios, andava às tontas pela sala até que ouve um carro parar à sua porta, arrastando os pés para fora e sai gritando pela rua em sua direção
- Me leva, me leva, não aguento mais, cansei da sua perseguição, não vivo mais, só tenho medo, chega, chega!

Os vizinhos chamaram uma ambulância, pobre moça, gritando para uma rua interna de condomínio, descabelada, vestindo um pijama velho e sujo, ninguém sabia o que poderia ter acontecido com ela. No seu celular encontraram mensagens de sua mãe e terapeuta, querendo saber o que estava acontecendo com ela, sumira por mais de uma semana, estavam todos preocupados, pois depois que saíra do sanatório há três meses, nunca mais tinha aberto a sua porta.

Numa lanchonete afastada, Marta curtia um saboroso café da manhã com seu noivo Tony, era o início das comemorações dos seus dois anos de noivado.



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Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 24/03/2021
Código do texto: T7214929
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