“Dobre-me um dedo...! ” (PARAPSICOLOGIA E TERROR)

Inacinho Luleta afirmava ser o verdadeiro Cão do Segundo Livro, o próprio secretário do Capeta.

Um dia, ele resolveu dar um susto no Padre V-Quêdu porque esse santo homem (que também era Parapsicólogo) costumava espalhar que o Capeta nunca havia existido e que tudo isso definitivamente... “non équi-ziste”.

Aproveitando uma entrevista que o Padre V-Quêdu daria para um canal de televisão, o Inacinho Luleta produziu um truque de materialização e surgiu instantaneamente no palco onde estavam o entrevistador e o famoso parapsicólogo.

O entrevistador (um tal famoso Palito Dentili) entendeu que aquilo daria uma audiência extraordinária e imediatamente incentivou a discussão de ambos.

Um diálogo sinistro foi iniciado ao vivo, diante das câmeras.

O Inacinho Luleta falava... e o Padre V-Quêdu respondia com uma fisionomia de ceticismo.

............

— Suncê anda púr aí dizênu cô num izisto, é isso...? Vô te jogá uma mardição, modiquê o meu chefe Rei dos Capetas num tá gostánu disso aí não, seu cabra!

¬¬ Se você é mesmo filho do Tinhoso, dobre-me um dedo. Está aqui, ó...!

— Ah! O santinho padreco fazénu gesto indecoroso, é?

¬¬ Você sabe muito bem que este dedo não é aquele usado para gestos indecorosos. Não mude de assunto.

— Tá bom! Mas suncê pede isso como se fosse pra dizafiá eu. Modiquê?

¬¬ Estou lhe dando uma oportunidade para você demonstrar que tem poder de amaldiçoar. Vamos...! Prove...! Dobre-me um dedo!

...............

E o Padre V-Quêdu levantava o braço em direção ao Inacinho Luleta, insistentemente.

...............

— Ói que eu dobro mêrmu, padreco...!

¬¬ Mas sou eu que estou pedindo... dobre-me um dedo! Vamos! Você não é filho do Rei dos Capetas?

................

Num gesto rápido e covarde, Inacinho Luleta deu um bote e conseguiu agarrar o dedo esticado do Padre V-Quêdu, ao mesmo tempo em que o arrancava do lugar com uma falsa unha que nada mais era do que um canivete. A plateia gritou horrorizada e o apresentador Palito Dentili tomou um susto tão grande que correu para se agarrar com Roger, um líder da Banda de Rock que auxiliava o programa na parte musical.

Porém, a cara do Padre V-Quêdu aparecia no telão do estúdio e... para surpresa de todos... a fisionomia do Padre V-Quêdu era de ceticismo, com um sorriso de deboche ainda no rosto.

Inacinho Luleta deixou o queixo cair de espanto, enquanto todos no estúdio em um só coro soltavam um: Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó...!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

É que, inexplicavelmente, outro dedo apareceu no lugar daquele que havia sido cortado. E nem mesmo sangue se via na mão do Padre V-Quêdu.

Todos que antes gritaram, simplesmente esfregavam os olhos... sem nada entender.

Inacinho Luleta ficou ofendidíssimo, pois aquela que deveria ser uma vítima indefesa continuava com o mesmo gesto, com o braço levantado, e com um dedo na mesma mão igualzinho e novinho... novinho em folha... levantado. Nem parecia que algum dedo havia sido arrancado. E não era um dedo usado para gestos indecorosos, pois o homem diante dele, ali, era um santo.

O desafio foi repetido, ecoando no estúdio... onde um silêncio arrepiante se fazia.

................

¬¬ Estou lhe dando outra oportunidade para você demonstrar que tem poder de amaldiçoar. Vamos...! Prove...! Dobre-me um dedo!

................

Inacinho Luleta, olhando para as próprias mãos abertas sem encontrar mais o dedo que havia arrancado da vítima, deu um novo bote e conseguiu facilmente alcançar mais uma vez o indicador esticado do Padre V-Quêdu, ao mesmo tempo em que novamente o arrancava utilizando-se do mesmo artifício covarde de antes.

Mesma reação de todos no estúdio (inclusive com o apresentador totalmente em pânico agarrando o Roger ainda mais fortemente). Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó...!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Repetiu-se o estranho milagre, com um novo dedo surgindo e o Padre V-Quêdu tornando a desafiar com a mesma frase: “Dobre-me um dedo!”

Enquanto alguns começavam a se benzer e a sussurrar a palavra “milagre”, parecia que aquilo era um filme gravado porque tudo foi se repetindo, sem que o Inacinho Luleta conseguisse deixar o Padre V-Quêdu com apenas nove dedos — coisa que, se acontecesse, o deixaria com as mãos parecidas com as do chefe do Inacinho Luleta, o mencionado Rei dos Capetas que aparecia em forma humana sem um dos dedos das mãos.

Tudo foi se repetindo, com o padre parecendo cada vez mais forte na medida em que o Inacinho Luleta foi se cansando, até se enfraquecer e desanimar diante da plateia aturdida.

O Padre V-Quêdu repetiu ainda uma vez o desafio, mas aí o Inacinho Luleta jogou a toalha, ou seja, ouviu-se a voz dele quando gritou:

— Eu não aguento mais! Vou chamar o meu chefe! Vem Satanáááááás...!!!

....................

Diante daquilo, a fisionomia do Padre V-Quêdu parecia ainda mais risonha. Todos os demais presentes gritaram juntos! — NÃÃÃÃÃOOOOOO...!

Um fumaceiro enorme (que lembrava a fumaça de muitos maconheiros fumando juntos pelos cantos dos muros das cidades) foi o que se viu. Um fedor dos infernos espalhou-se pelo estúdio enquanto a rede de televisão sofreu uma pane e saiu do ar inexplicavelmente.

No palco, frente a frente com o Padre V-Quêdu, eis que estava o próprio Rei dos Capetas com seus nove dedos (que era cagado e cuspido idêntico ao chefe de um partido político da estrela vermelha). Outro diálogo arrepiante estava para começar.

O Padre V-Quêdu continuava sentadinho na mesma posição de antes, com as pernas cruzadas e segurando de forma tranquila um enorme crucifixo que parecia do tamanho de uma das mãos do Incrível Hulk (da MARVEL).

Uma voz rouca saiu da garganta daquele cão dos infernos, como se ele tivesse chupado manga e ficado engasgado com o caroço. Na verdade, aquilo que se escutou foi uma risada: HA – HA – HA – HA – HA – HA...

Enquanto pessoas desmaiavam ao redor do palco, o Padre V-Quêdu parecia estar repentinamente incomodado... com uma sujeirinha na unha... logo que terminava de coçar um dos ouvidos. Mas, a fisionomia era quase de quem estava morrendo... de sono, entediado.

O diálogo recomeçou entre o novo visitante e o Padre V-Quêdu, enquanto Inacinho Luleta era visto ajoelhado e de cara colada no chão, como em adoração.

..................

— Ajoelhe-se, padreco! Ajoelhe-se e me adore!

¬¬ Alguém aí desligue o telão e vamos começar logo essa entrevista comigo.

— Não é telão! Sou eu! Ei, cara! Ô do crucifixo! Sim! Você aí!

.................

O Padre V-Quêdu continuava sentadinho na mesma posição de antes, incomodado com a sujeirinha da unha, como se esperasse começar a entrevista.

O visitante espalhafatoso notou que o cara parecia mesmo ter ficado distraído, pois transparecia mesmo estar interessado somente em tirar sujeira do ouvido com uma das unhas.

Finalmente, aquela besta das trevas resolveu chegar juntinho do Padre V-Quêdu... que continuava sentadinho, sentadinho, na mesma posição de antes. A cara feia foi chegando perto do rosto do santo homem parapsicólogo, como se fosse para ficarem com um nariz colado no outro. Finalmente, depois que a criatura havia se abaixado e inclinado muito na manobra, o visitante do inferno começou a dirigir outra vez a palavra ao seu adversário humano, cujo nome era muito conhecido entre os capetas como “Padre V-Quêdu Sem Medo”.

Porém, misteriosamente, o Rei dos Capetas pareceu estar perdendo a voz. Na verdade, a voz saía de sua garganta parecendo-se um pouco com a voz de um senador brasileiro que naquela época já gostava de pedir abertura de CPI no Senado.

Aí, as falas foram mais o menos as seguintes, sempre com o Rei dos Capetas falando e o Padre V-Quêdu respondendo:

................

— E aí, padreco? Estou meio sem voz, mas eu vim aqui te buscar. Vou te arrancar todos os dedos e te fazer sangrar até a morte.

¬¬ Você “non équi-ziste”.

— Quê?

¬¬ Você “non équi-ziste”.

— Me respeita, cara!

¬¬ Você “non équi-ziste”.

— Ah! Entendi! Você está num processo de negação porque está com medo de me enfrentar (que diabo está acontecendo com a minha voz?)...

¬¬ Você “non équi-ziste”.

— Ah! Pare com isso, padreco! Tá bom, padreco! Está com a Bíblia aí? Abra ela... e confira aí. Eu existo, sim!

¬¬ Você “non équi-ziste”.

........................

O crucifixo do Padre V-Quêdu reluzia com os refletores do estúdio de televisão.

O Rei dos Capetas parou de falar, cruzou os braços e começou a mexer os quadris para um dos lados do corpo asqueroso... balançando como se requebrasse à semelhança de uma comadre quando estava para chamar a outra para a briga.

Foi então que o Padre V-Quêdu olhou finalmente bem dentro dos olhos afogueados do Tinhoso, repetindo calmamente:

¬¬ Você “non équi-ziste”. Você “non équi-ziste”. Você “non équi-ziste”.

— Eu já disse que existo. Eu exiiiisto, siiiim...!

¬¬ Você “non équi-ziste”.

..........................

As luzes apagaram-se totalmente, fazendo-se um longo silêncio enquanto as vozes faziam coro numa reza conjunta de todas as pessoas. De repente, todos pararam de rezar e começaram a repetir aquela frase que já haviam memorizado depois que o medo passou. “Você non équi-ziste. Você non équi-ziste. Você non équi-ziste”.

Ninguém sabe como, as luzes voltaram todas de uma vez. Ali, sentado na mesma cadeira, o Padre V-Quêdu levantou um dos braços num gesto de pedir silêncio. O visitante maldito havia sumido.

Então, o velho e bom padre-parapsicólogo dirigiu seu olhar para o apresentador Palito Dentili.

Todo mundo, arrepiado, esperava a palavra de fé que os consolaria depois de todo aquele medo coletivo. A produção do programa já estava pronta para gravar um sermão de meia hora, pois o momento era de fé.

O Padre V-Quêdu levantou-se e pareceu se dirigir aos bastidores, enquanto dizia:

¬¬ Marquem outro dia, pois meu tempo acabou. Alguém tem um cotonete aí?

::::::::::::::::::::::::::::::::::::

º’F’º’i’º’m’º

................

Da série: “Vocês ainda querem o nome da série?”