A SOMBRA DA FLOR DO DIA (dedicado à escritora e amiga Iolandinha Pinheiro) - terror e mistério

 

A acidez do espírito, no coração generoso se derretia. Assustava à princípio, porque uma mulher dona de uma beleza extremamente inteligente e seletiva, requer coragem e iniciativa e, cá pra nós fica difícil até pra conversar. Pensemos...se faltar verbo e consistência...já era a abordagem, o candidato sairá arrasado e ela, simplesmente seguirá a vida, plena.

 

Caros leitores, considerem o texto acima, como uma abertura do que vou contar...bem mais sombrio.

 

 

Desfilava pela orla da cidade acalorada, tranquila em suas observações matinais. Era como a sua crônica de andanças diárias. Quem passasse por ela via a pele clara, sem o dourado do Sol, um sorriso de 'Monalisa' instalado no rosto...uma flor do dia com uma inusitada sombra, que a seguia em pleno dia. Os passantes do calçadão já estavam acostumados com a presença dela, mas, algumas pessoas haviam desaparecido com o tempo, só que não deixaram saudades. 

 

O novo conferente do bazar da esquina, numa certa manhã de Outono, viu um homem de bigodes retorcidos, tal e qual um  'Salvador Dali' praiano, se aproximar da beldade da sombra. Claro que de longe, o rapaz não podia imaginar o que se passaria. O bigode retorcido solta uma daquelas pérolas indesejáveis, a chamando de GOSTOSA! O resultado só foi percebido por muito pouca gente, a sombra da flor do dia, simplesmente absorveu a criatura, ficando nas pedras do calçamento um bigode retorcido lambuzado de sangue, que rapidamente foi pisoteado pelos atletas e corredores matinais. O conferente do bazar, engoliu em seco com a cena da abdução, por assim dizer e, a mulher parecia não ter percebido nada, ele era novo no serviço e preferiu calar, guardando para si o que presenciara. 

 

Mais uma manhã se espreguiça no horizonte acalorado, pessoas já correndo e se exercitando aproveitando a bela manhã. Então, surge plena em sua observadora caminhada, a flor do dia e a sua sombra. O rapaz do bazar até estremece, quando a vê ainda ao longe, então, no sentido contrário dela vem uma mulher alourada, intercalando pulinhos e corridinhas quando um cachorrinho de rua, atravessa o seu caminho e ela chuta o animalzinho, que gane e foge de perto dela. Assim que a alourada passa ao lado da sombra da flor do dia, ela é absorvida pela mesma, ficando um par de tênis cor de rosa claro, perdido sobre o calçamento, se alguém tivesse observado de perto, teria visto que as palmilhas do tênis, estavam rubras de sangue. Outra vez o conferente tremeu na base, pois ficava imaginando se a mulher da sombra, não tinha mesmo conhecimento das abduções.

 

O rapaz mal dormia, pois sua mente se torturava por se manter calado, embora internamente tivesse sentido, a vontade de bater na mulher que chutara o cãozinho. A alourada realmente não faria falta. 

 

Depois de alguns outros episódios que ele presenciou, o conferente estava um fiapo, indo trabalhar por obra e graça do divino Espírito Santo, as suas olheiras chegavam até às saboneteiras aprofundadas do corpo magro.

 

Tomado por uma coragem que ainda lhe estremecia os membros, atravessou a rua numa manhã radiante e, perguntou à mulher da sombra se ela sabia das abduções.  O rosto que virou para ficar exatamente alinhado ao seu, tinha um sorriso enigmático, com órbitas vazias que miravam o seu olhar assustado e, sem qualquer resposta a sombra absorveu ambos, ficando no calçamento da orla, um boné azul com o nome do bazar, muitos fios dos cabelos castanhos da 'Monalisa'  enquanto a sombra cinzenta esbranquiçava e sumia na brisa do mar.

 

 

Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 09/06/2023
Código do texto: T7809405
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