Abduzido

Setembro acabou e levou com ele o setembro amarelo e a esperança de Elmo em dar um fim à própria vida. Agora ele teria que esperar o próximo ano para criar coragem para tal. Ele não suportava mais a insignificância da sua existência. Engenheiro de formação mas que trabalhava como professor porque foi a única oportunidade que apareceu. Ele vivia uma vida triste, em um emprego que não gostava e se sentia incapaz e com complexo de impostor. Elmo, que já estava na casa dos quarenta anos, não via perspectiva de melhora financeira. Achava que iria morrer e não conseguiria se livrar de suas contas e dívidas, não iria comprar as coisas que sonhava ter quando adolescente. Frequentemente Elmo imaginava alguma forma de desistir da vida. Numa noite em que a lua fazia hora extra no céu, Elmo mais uma vez não conseguia dormir pensando nas contas que eram maiores do que o salário que recebia, abriu a porta do quintal da sua casa, olhou para o céu e desejou que alguma entidade cósmica o levasse embora. O feixe de luz que o encobriu não durou um segundo. Elmo assistiu a um flashback da sua vida como uma pessoa que assiste a um filme sozinho no cinema. Ele presenciou a primeira corrida que ganhou, quando ainda era um espermatozoide que precisou chegar primeiro para fecundar o óvulo na barriga de sua mãe. Assistiu ao seu nascimento, suas primeiras palavras, seus primeiros passos. Reviveu sua infância cheia de abusos físicos, psicológicos e sexuais. Reviu a sua fúria adolescente rebelde, seu primeiro grande amor não correspondido. Revisitou seus dias e amigos de faculdade e em seguida de trabalho. Com os olhos lacrimejando ele observou os passos que o levaram até aquele momento. O momento em que conheceu a sua mulher, o momento em que se casaram, o nascimento de sua filha, suas primeiras palavras e primeiros passos. Elmo deu-se conta do quanto a existência humana é um evento improvável e aleatório. Elmo percebeu que os seus erros e escolhas eram o que fazia ele ser quem era, o pai amoroso, o marido compreensivo e paciente, o filho querido. Ele pediu perdão por ter cogitado a possibilidade de acabar com a própria vida. Era tarde demais... Elmo começou a ver o quanto seus problemas eram insignificantes enquanto estava sendo esticado, como se tivesse ultrapassado o horizonte de eventos de um buraco negro. Elmo viu sua casa ficar menor, depois viu a sua cidade, seu estado encolher, depois o seu país, seu continente e por fim o seu planeta. Ele percebeu o quanto era pequena sua vida e seus problemas comparado ao tamanho e complexidade do planeta onde morava. Viu também que seu planeta era um dos menores do seu sistema solar e que o sol do seu sistema era uma estrela anã amarela no meio de outros sistemas solares que compunham a sua galáxia que era apenas mais uma no meio dos superaglomerados de galáxias que faziam parte do universo. Elmo tentou ver a criatura que o carregava. Não tinha forma definida. Ele percebia seus membros esticando a distâncias inimagináveis. A criatura falava com ele como se estivesse dentro da sua cabeça, dentro do seu corpo. A sensação era a de que pouco a pouco seu corpo era invadido por uma sensação de inquietação e agonia, como se algo quisesse expulsar todo o seu interior para fora. "Desculpe", pensou Elmo, com a sensação de que uma lagrima escorria por onde antes havia um rosto. "É tarde demais, você virá conosco", ele ouvia a voz responder de dentro do que ele acreditava que ainda era a sua cabeça. Ao amanhecer o dia os familiares de Elmo deram por sua falta. Foi emitido avisos de procura pelas forças policiais. Durante muito tempo seu caso foi tratado como pessoa desaparecida. Depois de dez anos sem evidencias do seu paradeiro, as autoridades pararam de procurá-lo. Mas Elmo continuava em posse da criatura cósmica que o havia levado rumo ao longínquo, solitário, escuro e desconhecido confins do universo.