O homem e as flores

  Belvedere Bruno



  Rosane não escondia  sua insatisfação. Marcos sempre fora um homem de  metáforas. Enquanto ela continha diques, enfrentava tsunamis e  erupções vulcânicas, ele mastigava pétalas de rosas  . Ela era ação. Ele, meditação. Puro antagonismo. Nunca se soube porque um dia decidiram que, ficar juntos, seria o melhor para equilibrar as diferenças . O tempo apenas as fortaleceu.
  Rosane dizia : - Cansei de viver com um sonhador. Sou pé no chão, gosto de  tudo  às claras. Odeio subterfúgios !   Marcos respondia calmamente : - Retire as  rosas pálidas do buquê e deixe  apenas  os botões .Aguarde  o florescer. 
- Rosane se inquietava, vociferando :  - Raios! Você  com   essa eterna  mania de poesia! Estamos  falando sobre a  vida, o  dia-a-dia, o desgaste de nosso relacionamento e você  só raciocina em forma  de  versos ? -  Mas  Marcos nunca abandonou o lirismo, avesso que era às coisas densas da vida.  A poesia era  o seu porto seguro. Morreria assim, mesmo se chegasse aos cem anos, dizia.
  Crucial o viver daqueles dois amantes. Rosane era exuberante  em  sua clareza. Marcos se encolhia no  constante degustar de flores.
  Um dia, sem justificar o ato,  Rosane  destruiu o jardim da casa.   No lugar  das flores,  surgiu uma piscina térmica  altamente sofisticada.   Marcos, engolindo suas lágrimas, deu adeus às rosas, tulipas, gérberas, palmas, samambaias e avencas. 
 Anos depois, num canto  da casa,   escreveria,  em versos,  a história de sua vida, alheio a tudo e a todos. Acompanhava-o um copo de suco de flores, com dois  cubos  de gelo .
                                  Dos  seus olhos, pingavam  lágrimas perfumadas.