UM CONTO DE HOSPITAL – ANJOS EXISTEM!

Naquela madrugada fria tudo parecia estar com ar de ansiedade, tanto pelos funcionários que deixavam seus plantões quanto para mim, que esperava no saguão a chegada de Cibele, minha primeira filha.

Tudo indicava uma noite muito comprida, o tempo não passava e o fluxo de pessoas diminuía transformando o local vazio, mas ao mesmo tempo ensurdecedor. Minha febre devido a um resfriado incomodava-me a cada instante, porém não me arrancava as forças de ter uma excelente noticia e uma prévia do futuro promissor que estava por vir. Foi quando olhando as pessoas se disciparem, notei que um senhor de pele morena e cabelos grisalhos me observava insistentemente.

Sob seus óculos um olhar fixo e indagador, senti medo confesso, mas também não desviava o olhar. Num rápido momento, um médico cruzara entre nós fazendo com que o senhor desaparecesse.

Quem seria aquele senhor?

Porque me olhava tanto?

Ele realmente havia sumido e o local ganhava agora um outro ambiente, Adriana, minha cunhada que assistira ao parto, desceu as escadas e em lágrimas sinceras de pura alegria disse-me:

- Ela nasceu!

Choque, tapa, tiros, gritos... Nada poderia desviar-me a atenção e quebrar minha

felicidade, minha vida passava a mil em minha cabeça, sentia-me como se tudo aquilo que eu já havia passado, meus erros, meus risos, meus choros, estivessem terminados para que se recomeçasse uma outra vida, como se me fosse dado uma segunda chance.

Nasci de novo, acho.

Subi rapidamente as escadas e no quarto andar encontrei-a, estava lá, terna e inquieta dentro de uma incubadora, suspirando a vida, esperando sua hora e me deixando o ser humano mais realizado de todo este mundo. Tudo em volta parecia ter sumido, contive-me para não chorar, entrando no berçário pude vê-la, tocá-la e sentir que não era sonho, tudo era real.

Passadas algumas horas, visitei o quarto da maternidade e pude rever Ivone, minha esposa e contemplar logo em seguida a vinda de Cibele trazida por uma enfermeira, confirmava-se ali a verdadeira aliança, mãe e filha se misturavam como num filme de curta metragem de nossas vidas, com um enredo fácil e com milhares de atrativos para Cibele contar para suas amigas no futuro. Segurei minha filha em meus braços contendo-me para terminar com a vontade de apertá-la, ela por sua vez dormia o sono dos justos e quando dei por mim ela sorriu e pela janela da porta do quarto onde estávamos o mesmo senhor que me olhava no saguão passava por ali, desta vez sorrindo e sumindo pelo corredor.

Naquele momento eu sabia quem ele era e porque me olhava.

Crisartes
Enviado por Crisartes em 28/12/2009
Código do texto: T2000146
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