O FABULOSO VIOLINO DO TEMPO


CONTO DE: LUZIRMIL (ISOLINO COIMBRA DE OLIVEIRA - ICOPERE)
DO LIVRO DO MESMO AUTOR
"TIMBRELINO, HISTÓRIAS DE UM VIOLINO"

A madrugada estava calma. Se alguém olhasse para o alto poderia contemplar o céu estrelado parecendo pontinhos luminosos vindos dos furos de uma caixa de luz gigante. Porém era o cosmo, dilatado na imensidão do Universo.
O sol, no horizonte leste, ainda não dava sinal de seu surgimento, mesmo assim, um professor e seu filho caminhavam por uma estrada, apreciando a escuridão da noite que logo daria lugar ao dia. No momento conversavam animadamente.
-Veja pai, quantas estrelas mudando de lugar! - disse o menino ao ver, de vez em quando, os meteoros adentrando na atmosfera – mas por que será que elas desaparecem?
-Penso que elas somem, por que entram na casa do tempo – respondeu o pai.
-Ué, as estrelas também tem casas?
-Acho que sim, filho. Tudo que existe no mundo, seja visível ou invisível, têm suas casas. As estrelas também.
-Mas quem abre as portas para que elas possam entrar?
-Ah! Certamente encontram as portas abertas.
-Já pensou, pai, se nós encontrássemos uma casa do tempo? Faríamos como as estrelas e poderíamos conhecer seu interior, não?
-É verdade filho. Você sabia que, para quem entra na casa do tempo, não encontra portas fechadas?
-Ora, pai, por que haveria de ser assim?
-O tempo, meu filho, é uma incógnita. Só pode ser futuro ou passado: em ambos os fatores pode haver movimentos físicos e fora da realidade do momento. Este é rapidíssimo e não permite que as portas se fechem.
O homem e o menino iam assim conversando, quando notaram um objeto luminoso riscando o negrume do espaço.
-Olha pai, aquela estrela não sumiu. Ei! Parece que está vindo em nossa direção!
-Vamos correr filho. Aquilo parece estar caindo, mas que não seja sobre nós!
-Mas pai, não temos tempo e nem lugar para esconder. Oh...
A velocidade daquele corpo luminoso foi tão rápida, que numa fração de segundos sua luz inundou tudo ao redor. O objeto que a irradiava tinha uma estranha forma. O homem e seu filho ficaram perplexos diante daquele fato. Perceberam quando um facho de luz, junto a uma forte harmonia sonora, foram projetadas daquilo que parecia ser um violino gigante. Mas tudo indicava que era uma astronave.
Paralisados, o homem e seu filho, aguardaram os acontecimentos. Notaram que o facho de luz incidiu-se em cheio sobre eles, e, numa fração de tempo, se sentiram elevados pela vibração harmônica e sugados para dentro do violino gigante.
No interior não havia pessoas, apenas complexos mecanismos e painéis. Mas logo ouviram uma voz que puderam entender:
-Olá, não tenham receio. Vocês estão no interior de uma nave do tempo. Estávamos pes-quisando este planeta quando notamos vocês caminhando no escuro pela estrada. Precisamos de pessoas terrenas para uma experiência local. Porém será ótima para quem dela participar. Vocês aceitam?
-Ora, nem sabemos com quem estamos falando. O que significará para nós, tal experi-ência?
-Ah! Será uma porta aberta. Terão várias prerrogativas, além de muitas comodidades, realizações e confortos.
-Mas quem fala conosco? Poderíamos nos ver face a face?
-Infelizmente não, amigos. Somos cientistas da galáxia e estamos fora do tempo, porém podemos tratar dos assuntos em questão. Digo que a partir do aceite de vocês dois, estarão sob as coordenadas da fenda do tempo.
-Não sei o que dizer – disse o professor – e você meu filho? tens palavras para responder ao nosso interlocutor invisível?
-Ora pai, estávamos falando sobre as portas abertas. Penso que nada temos a perder. O senhor é aposentado, não temos família e vivemos a andar pelas estradas sem destino certo. Acho que podemos aceitar.
-É isso mesmo. Aceitamos a experiência, afinal será uma aventura nova surgida em nossa peregrinação.
-Muito bem – disse a voz – a partir de agora poderão se apossar da nave do tempo.
Dizendo isto houve um relâmpago, como um flax de máquina fotográfica, após o que, nossos personagens perceberam que houve uma relação energética entre o pensar e o composto. Notaram que a ação da gravidade sobre seus corpos podia ser controlada por seus pensamentos em sintonia, isto por que ao desejarem sair da astronave, simplesmente foram transladados.
-Eureka! - admirou-se o professor – só de pensar em sair para fora daquela sala sofis-ticada, voamos como os pássaros!
-Nossos pensamentos deviam estar sintonizados, pois eu pensei a mesma coisa. Mas pai, precisamos saber mais coisas a respeito destes visitantes do espaço.
-Veja filho, o violino gigante ainda está perto de nós, voltemos em seu interior, assim poderemos fazer algumas perguntas.
Em instantes, pai e filho se encontravam no interior da astronave. Ela tinha o formato de um violino, mas era feita de material desconhecido. Em seu interior havia alguma coisa do futuro, jamais imaginada pelo homem. O menino, ansioso para saber mais coisas a respeito do que estava ocorrendo, falou:
-Olá, podemos ouvir a voz que nos falava, novamente?
-Claro que podem. No interior da nave do tempo, em qualquer ocasião poderão entrar em contato conosco – disse o ser invisível – somos uma equipe de cientistas que usamos a fenda do tempo para nos comunicar e transportar a astronave. Ela é como uma máquina do tempo. Quando quiserem se recolher dentro dela, basta acionarem seus reflexos mentais, desde que estejam a uma distância propícia, que surgirá uma ação temporal, que vos fará transladar para o local que gerou a fenda.
-Gostaríamos de ser instruídos, para procedermos de acordo com nosso trato em relação às vossas experiências – disse o professor.
-Vejam sobre a mesa ao lado – disse a voz – há duas pequenas valises. Cada um de vocês deverá se apossar de uma. No interior delas há o necessário para tudo que pré-tenderem realizar longe da astronave. As letras e números dos teclados são para serem digitados. Há também microfones e alto falantes embutidos para a comunicação sonora.
Na verdade são dois microcomputadores. Eles estão diretamente ligados com a nave, vias canais do tempo. Neles poderão tomar informações sobre todas as dúvidas que porventura vos embaraçarem.
No interior da estranha nave, além dos vários controles, havia estranhos equipamentos. Numa tela à distância, já que se encontrava na extensão do braço do violino gigante, eles viram lindas paisagens. Num relance de reflexo mental o menino se viu integrado ao lugar, isto por que pensou em fazer parte naquela maravilhosa aquarela.
-Pai onde está você? – perguntou estupefato o jovem, ao ver-se fora da nave, parecendo estar numa outra dimensão.
-Ora, estou dentro do violino luminoso, filho. Vejo-te, porém na tela. Gostaria de estar aí também.
Ao pensar tal desejo, em instante ele se encontrava junto ao filho. O local era tão a-conchegante que jamais imaginaram outro igual. Só mesmo quem estivesse presente para apreciar. Havia um conjunto de árvores iluminadas por um sol distante e sob elas uma aconchegante sombra convidava qualquer pessoa a ficar horas e horas apreciando a quietude do lugar.
-Pai, o senhor acredita na realidade do que está ocorrendo, ou é um sonho nosso?
-Sonho não pode ser filho – estávamos caminhando de madrugada, lembra-se? Íamos para a beira do rio Santa Bárbara, porém sem ter planos algum de nosso destino.
-É verdade, pai. Vamos ver o que há dentro desta maleta.
Ao abrir a pequena valise, o menino encontrou o objeto descrito pela voz que lhes falara. O mesmo encontrou também o professor no interior da sua. Por algum momento ficaram sem saber como manusear aquele dispositivo contendo nas várias teclas, o abecedário e números primários completos, além de uma pequena tela. Afinal nunca tinham visto, mesmo por que ainda não havia sido difundido no mundo, os tais microcomputadores.
-Vou apertar um desses botões – disse o menino.
Ao pressionar uma tecla, a tela do dispositivo foi iluminada.
-Uau! Exclamou o menino. Isto parece um cinema portátil.
Convém dizer que o homem, tendo cerca de cinqüenta anos, era dotado de muitos conhecimentos. Afinal ele era professor, além de peregrino, portanto tinha também, ins-truções adquiridas ao rol de suas andanças pelo mundo.
Diante dos conhecimentos que possuía com relação às letras, não foi difícil perceber que poderia escrevê-las, formando palavras, que logo apareceram na tela.
Ao digitar uma tecla, em conjunto com outra, obedecendo a uma indicação, o estranho dispositivo passou a falar, tendo o mesmo timbre que ouviram dentro da astronave:
-Você acionou o transceptor – disse a voz – através deste recurso poderão comunicar com nossa equipe de cientistas em qualquer momento, para fazer perguntas e saber das coordenadas de nossos registros.
-Caramba, pai! Nunca pensei que existisse um objeto desses!
-Muito menos eu, filho. Isso deve ser coisa do futuro.
O local em que se encontravam, era para eles totalmente estranho. Mesmo por que se relacionava com a tela no braço do violino gigante. Fora a partir de sua observação que
surgiu neles o pensamento de se integrarem em tão bela paisagem. Na continuidade dos assuntos o homem disse ao interlocutor:
-Estamos meio perdidos, não só diante deste cinema portátil, mas também quanto a nossa localização. Poderia nos informar algo a respeito?
-Digitem nas letras, as perguntas que desejarem respostas. Em qualquer tempo e em qualquer situação, obterão esclarecimentos para vossas inquirições. Mas antecipando, digo que se encontram nos chapadões montanhosos ao norte do vosso país. Observem que não há elevações nas proximidades. O horizonte plano é providencial para que tenham uma direção de vossos próximos passos.
No momento pai e filho se recordaram que naquela madrugada estavam se dirigindo em direção a um rio que já conheciam, contudo ficava num estado de sul, portanto distante dali, já que estavam no norte. Diante daquela dúvida o homem quis saber como houve aquele translado, não percebido por eles.
-Tudo foi uma função do tempo, amigos – disse a voz ao transceptor – Tal função estará a vossa disposição em qualquer instante. Poderão num segundo, se encontrarem novamente na estrada em que estavam. Basta digitarem algo nesse sentido. Saibam porém, que próximo da nave vossos próprios pensamentos acionam o tempo.
Diante da instrução, o menino escreveu naquilo que seria um monitor de vídeo do futuro, uma frase relativa ao que desejavam.
-Que interessante, pai! Cá estamos nós, sob as miríades de estrelas, como sempre, em nossas caminhadas noturnas!
-É. Tudo está como antes. Até as horas em meu relógio de ponteiros fosforescentes marcam poucos minutos decorridos em nossa caminhada rumo ao rio Santa Bárbara. Acho que sonhamos momentaneamente, filho.
-Mas e esses dois aparelhos que temos em mãos?
-É. Algo aconteceu mesmo, filho. Bem, vamos fazer uma parada e esperar o sol surgir; afinal temos dois estranhos dispositivos para, pelo menos, brincar de escrever.
A madrugada aos poucos ia dando lugar ao esplendor solar surgido no horizonte. Próximo da estrada em que seguiam, havia à direita, uma frondosa árvore, sob a qual fizeram uma parada, tempo em que puderam dormir algumas horas.
-Puxa vida, pai. Dormimos um bom tempo, veja o sol como está alto.
-São dez horas, filho. Ah! Sonhei algo interessante...mas e estas valises?
-Não sonhamos não, pai. Vivemos alguma coisa irreal na madrugada. As provas disto estão dentro dessas maletas; vamos verificar.
-Vejamos. Vou formar palavras de algum desejo nosso. Que tal a frase: “Queremos estar próximos de um rio”.
-Escreva filho, vamos ver o que acontece.
-Ué! Nada ocorreu. Vamos apertar as teclas do tal transceptor para saber.
Ao inquirirem souberam, que para confirmar qualquer sentido, longe da astronave, teriam que acionar uma tecla de entrada daquilo que se solicitasse da máquina.
-Eureka! Fomos transladados numa fração de tempo. Eis o rio. Como é grande! Nunca vimos tal, é muito largo e parece ser fundo. Veja, há uma ponte estreita, de uma unica tábua, porém contendo um corrimão. Pelo que vemos, só serve para passar pessoas de um lado para outro.
-Tudo está confuso, filho. Vamos atravessar por esta pinguela de tábua. Vejo que do outro lado há um morro, lavrado, porém estranho. Para que haja mais segurança poderás ir sobre meus ombros – disse o homem – assim atravessaremos sem medo.
-Oh! Pai, volte – disse o menino ao ver que em meio ao rio a tábua estava mergulhada em certo trecho – não vamos nos arriscar a passar nesse ponto. Que coisa impressionante!
Diante do que se apresentou, o professor voltou imediatamente, porém penalizado por não poderem atravessar o rio, já que a passarela sofrera uma avaria bem em meio às grandes águas.
-Mas quero ir àquele morro – disse o homem – vamos acionar nosso dispositivo de translado.
Digitando palavras no sentido de realizarem aquele ideal, se viram num ponto alto do íngreme morro, com aparência de uma lavra de mineração do lado em que se encontravam.
Numa aventureira escalada, puseram-se a subir, isto numa branda ladeira, até chegarem a um ponto em que havia dificuldade para continuar. Contudo dali podiase avistar além, um lugar estranho, parecendo o leito de um rio que secara.
-Se observarmos deste ponto – disse o homem – podemos ver a outra vertente desse morro, filho. Vejo uma espécie de valado, muito largo, como se fosse um rio em tempos anteriores.
Mesmo não tendo condições de galgar a íngreme lavra, já que se tornara mui vertical, podia-se, todavia, ver por sobre suas bordas, aquilo que parecia ser um antigo rio.
-Gostaria de ter informações – disse o professor. Digite nas teclas, filho.
-Diz aqui, pai, que o grande rio no qual tentamos atravessar na passarela foi desviado de seu curso, para que mineradora retirasse minério deste morro.
-Digo que fiquei frustrado por não atravessar o rio – disse o professor. Pareceu-me uma incapacidade pessoal. Precisamos tentar de novo.
-Não vejo tanta importância no fato, pai. Eu porém, gostaria de ir para a nave do tempo. Achei seu interior aconchegante. Que tal voltarmos?
-Então acione as teclas, filho. Certamente em instantes estaremos lá.
Ao ser digitado aquele sentimento, houve um movimento em torno deles, momento que alçaram um vôo muito alto, de cujas alturas podiam ser observadas uma extensa região. Lá em baixo estava o morro, que parecia se interpor entre o grande rio e seu possível curso anterior. Notaram, sem que tivessem planejado, que no vôo empreendido por eles, se dirigiam à cabeceira do rio.
Montes e vales se descortinavam sob seus olhares, admirados por tantas contemplações. O translado estava sendo feito de forma diferente.
-Veja, pai. Estamos voando em direção às montanhas a noroeste. Em qual delas estará o violino gigante?
-Só não estou entendendo, por que nosso translado não ocorreu como os demais? – disse o professor.
-Talvez tenhas digitado a tecla de outro dispositivo. Depois procuraremos saber.
-Ah! Lá está, pai. Parece-me realmente que agora temos uma casa. Sempre desejamos possuir uma. Mas por quanto tempo estaremos sonhando?
-Pelo que fomos instruídos, filho, o tempo é um componente no qual tem uma fenda chamada momento. À esquerda ou à direita desta fenda está o que denominamos de passado e futuro. Provavelmente estamos usufruindo destes componentes, que embora abstratos, contudo nos dão condições de agirmos no sentido de proporcionarmos algum bem para nossos semelhantes. Se observarmos os lugares por onde sobrevoamos poderás notar muitas pessoas sofrendo com o trabalho no campo, sob o ardente sol. Acho que poderíamos ajudá-los de alguma forma.
-Mas pai. Neste mundo cada um tem sua maneira de viver. Nós, por exemplo, antes deste sonho estávamos caminhando.
-É verdade, filho. Não podemos mudar as coisas. Mas gostaria de ter alguma aventura em que participassem outras pessoas. Vamos nos instruir na casa do tempo, sobre esse meu sentimento.
No passar dos minutos, logo avistaram o violino gigante. Ele se encontrava numa região, num vale entre duas montanhas.
-Lá está, pai, a fabulosa máquina do tempo. Sua aparência de violino conota com a idade daqueles instrumentos, são antigos. Gostaria de ter um para aprender a tocar.
-O interessante filho, é que me parece conhecer esta região. Ah! É a cadeia de montanhas que circunda o norte do nosso estado, conhecida por “Triângulo Cassiano”.
-Veja, a porta do violino está aberta. Poderemos entrar como as estrelas, pai.
-Certo filho. No interior da máquina faremos um estudo para nos adaptarmos à melhor forma de agirmos para ajudar nossos semelhantes.
CAPÍTULO 02
-Pelo meu relógio já é quase meio dia – disse o professor – estou pensando de como vamos fazer para nos alimentar, já que não temos recursos, ou temos? Digite algo no sentido de conseguirmos um almoço, filho.
-Vou digitar o transceptor para conversarmos com nosso interlocutor invisível.
-Olá, amigo cientista. Estás nos ouvindo?
-E muito bem, por sinal. Temos acompanhado, passo a passo, vossos procedimentos. Sabemos que estão querendo almoço e já que se encontram dentro da nave do tempo, queiram se dirigir até a sala de refeição. Lá verão um dispositivo com teclas semelhantes às que já conhecem. Digitem os alimentos de suas preferências e aguardem quinze segundos, tempo em que se abrirá a porta de uma espécie de forno e aparecerão os alimentos solicitados.
Mediante as instruções, logo estavam apreciando a deliciosa comida.
-Eureka, pai! Isso é que é refeição! Nunca tivemos uma igual!
-Acho que estamos realmente sonhando, filho. Está bom demais para ser verdade.
-O importante é que o almoço está ótimo. Jamais tivemos comida tão deliciosa.
-Eis uma forma de ajudar nossos semelhantes andarilhos, filho: lhes dando comida.
Certamente na casa do tempo há de tudo com muita fartura, não é assim? amigo cientista da galáxia?
-Oh! Sim – respondeu a voz invisível – Nosso intuito é justamente coordenar vossos sentimentos a fim de que possam, com nossos dispositivos diversos, ajudar os necessitados, porém sempre de forma invisível. Poderão isto fazer usando frações de tempo passado.
-Puxa! Como faremos para operar os dispositivos para isto?
-É muito simples, basta digitar e dar entrada. Dependendo da fenda do tempo usada, poderão dar um prato de comida fresquinha, para qualquer pessoa faminta sem que ela veja de onde surgiu.
-Isso será muito bom – disse o professor – Muitos passam fome pelas estradas sem saber como conseguir um prato de comida. Além de alimentos poderíamos lhes arranjar roupas e calçados?
-Sim – confirmou a voz – poderão conseguir tudo que quiserem, pela fenda do tempo.

A estada deles dentro do violino gigante perdurou por todo o restante daquele dia, no qual, desde o amanhecer, estiveram em muitos lugares, inclusive na distante chapada do norte e sobre o grande rio desconhecido.
Ao anoitecer, depois de muitas perguntas, verbais ou escritas, o homem e o menino quiseram repousar. Para tal encontraram confortáveis camas num quarto no interior do violino do tempo.
-Olá, em pai. Só rei para dormir em camas como estas – se vangloriava o menino.
-É verdade, filho. Estamos tendo um sonho completo. Amanhã, porém estaremos fazendo nossas caminhadas rotineiras. Esse sonho irá terminar.
A noite passou silenciosa. Pai e filho dormiram toda ela, sem uma única interferência em seus sonos. Ao amanhecer do outro dia, antes, porém, do sol surgir, o homem disse para o menino ao despertá-lo:
-Acorde filho. O sonho acabou. Vamos fazer nossas andanças.
-Mas pai, ainda estamos dentro do violino gigante.
-É verdade, filho, porém o que estamos vivendo não é uma realidade. Vamos embora. Não levaremos nada, nem as valises. De repente a gente acorda e teremos uma grande decepção.
-Ora, pai. Podemos ir, mas levarmos pelo menos um dos aparelhos de teclas. Se ele desaparecer não ficaremos tão frustrados
Diante do que trataram saíram da astronave e iniciaram uma caminhada em meio à mata existente entre as montanhas. Para o homem era como se estivesse saído de um sonho bom, mas teriam que enfrentar a realidade da vida.
O dia amanheceu. Na caminhada que empreenderam logo encontraram uma estrada pela qual seguiram sentido leste.
Logo nas primeiras milhas, encontraram com um homem portando uma enxada. Era um trabalhador de roças. Pela primeira vez depois dos últimos movimentos viam um semelhante.
Alegres por aquele encontro, o pai do menino quis saber em que região se encontravam, pois se consideravam perdidos em alguma localidade estranha.
-Estão próximos da cidade de Alegria – informou o roceiro – se seguirem em frente por esta via logo chegarão nela. De onde são vocês?
-Somos caminhantes sem destino certo, falou o menino, porém saímos esta madrugada do violino do tempo. Ele se encontra além daquele morro – apontou.
-Violino do tempo? Nunca ouvi falar, conheço tudo em redor e que eu saiba ninguém possui algum por aqui.
-Na verdade, amigo, não é bem um violino, porém, uma astronave com tal formato, em cujo interior nós pernoitamos.
-Ah! Compreendo. Bem, vou seguir para meu roçado – disse o roceiro, considerando que encontrara dois loucos.
-Espere amigo. Talvez o senhor esteja necessitando de dinheiro para seus negócios – disse o menino - podemos ajudá-lo caso queira nos dar atenção.
-Quem não precisa de dinheiro? Eu estou precisando muito. Se tiverem um pouco para me emprestar eu aceito.
Confiante no operar da fenda do tempo, o menino disse:
-Temos conosco um aparelho que poderá suprir sua necessidade. Quanto precisas para sair de seus problemas?
-Vinte contos de réis me tirariam do apuro pelo qual estou passando nesses dias.
-Vou solicitar no teclado, será uma forma de testar o presente que ganhamos.
-Isso mesmo, filho. Chegou a hora de despertarmos do sono.
Ao digitar, porém, as teclas, cujas letras formaram as palavras referentes a solicitação de vinte conto de réis, para surpresa dos três, eis que houve um movimento material na atmosfera, surgindo um pacote de notas, que contados perfaziam a soma.
-Veja, pai. Pela primeira vez uma pessoa participa de nosso sonho – disse o menino.
-Qual foi o truque, garoto – disse o roceiro – deixe-me ver se essas notas são verdadeiras. Caramba! É dinheiro de verdade. Onde conseguiu este aparelho?
-Ganhamos dos cientistas do violino do tempo, amigo. Fique com o dinheiro. Vamos seguir em frente filho.
-Esperem. Vamos até minha casa, fica a dois quilômetros daqui. Com todo esse dinheiro posso ficar de folga alguns dias. Quero conhecê-los melhor.
-Infelizmente temos que seguir, amigo – disse o pai do menino - somos peregrinos, porém temos algumas obrigações a serem levadas a cabo.
-Bem, digo que não terei como vos pagar os valores que me ofereceram. Porém lhes darei as coordenadas de onde moro para me visitarem algum dia.
Em instantes o professor e seu filho se encontravam seguindo para a cidade de Alegria. Ao caminharem, notaram à esquerda, um monte de grande altura, momento em que o menino disse:
-Pai, gostaria de subir naquele monte, para ver em redor. Pelo jeito avistaremos muitos locais lindos nestes baixadões.
-Podemos contar com a ajuda do teclado, afinal parece que há uma realidade nas ope-rações.
-Não pai. Vamos fazer tudo normalmente. Caminharemos até o alto do morro, lá porém, definiremos algum procedimento a realizarmos.
Diante daquilo, pai e filho se puseram a andar em direção ao morro, que embora não parecesse, todavia ficava numa região totalmente inóspita. A princípio tiveram que transitar em meio a um intenso serrado até as bordas do morro, que circundado por uma mata fechada se tornava difícil de ser escalado.
-Acho que não conseguiremos chegar ao alto sem a ajuda do tempo, pai. A mata está intransitável.
-Mas aos poucos estamos rompendo, filho.
A intensidade das árvores, entrelaçadas de cipós e todo tipo de vegetação, ia tornando a locomoção cada vez mais difícil. Além das dificuldades acima, havia as surpresas, tais como os insetos e encontro com serpentes, o que veio causar medo e desânimo em continuarem dentro dos esforços humanos.
-É, meu filho. Acho que não conseguiremos realizar nossa façanha. Deste ponto não vemos em que posição estamos à borda do morro. Digo que já estou temeroso de continuar.
-Vou digitar o teclado do tempo, pai. Certamente nos será aberta uma porta para que venhamos a realizar nosso ideal.
A ação da fenda do tempo foi precisa. Ao solicitarem por escrito, o desejo de chegarem ao destino, imediatamente se sentiram elevados como dois balões humanos. Com tal ocorrência logo estavam ao nível do alto morro.
-Ainda bem que já estamos familiarizados com o sonho, pai. Veja que esplêndida con-templação deste ponto. Ah! Lá está a cidade de Alegria, da qual nos falou o roceiro. Parece próxima, contudo há uma extensa plaga de serrado até lá.
Do ponto em que se encontravam, se descortinavam por todos os lados, as regiões baixas, em que se podia ver terras com plantios de café e outros cereais. Olhando para as montanhas em que deixaram o violino do tempo, notaram um clarão, destacando sobre a luz solar.
-Veja, filho: nosso violino gigante está se elevando. Ele está emitindo o mesmo clarão de quando entrou na atmosfera, ontem.
-Ei, ele é a nossa casa pai! O que está havendo? Vamos procurar a resposta no teclado, urgente. Vou digitar o transceptor.
-Estamos locomovendo a máquina do tempo para o alto do morro em que se encontram. Não se preocupem, notamos que neste ponto ela estará mais segura – disse a voz espacial.
-Que ótimo! – se alegrou o menino – Sempre desejei morar no alto de um monte!
-O melhor é que poderemos ocultar a nave do tempo em meio a caatinga fechada exis-tente no alto – continuou a voz invisível - além do mais, pela intensidade da mata às suas bordas é um lugar difícil de ser escalado. Vamos fazer o pouso da astronave bem pertinho de vocês.
Em trinta segundos o violino gigante, como que comandado por uma mão invisível, pousou mansamente num lugar limpo entre as árvores componentes no alto morro.
-Pai, já que a casa do tempo veio para um lugar maravilhoso deste, e estarmos convictos que não estamos sonhando, vamos fazer nossa morada nela.
-É uma boa idéia, filho. Mesmo por que deste ponto temos uma vista geral a trezentos e sessenta graus em redor. Ademais podemos dar nossos passeios usando o teclado do tempo para qualquer situação. Só não podemos nos separar dele; perdê-lo, ou deixar que seja furtado.
-Vamos entrar no violino, pai. A porta está aberta. Poderemos nos alimentar e descansar da jornada desse dia.
-Ótima idéia. Desejo também manter um diálogo com os cientistas galáticos para saber alguns fundamentos da sociedade da qual fazem parte.
Ao se aproximar a noite, o menino se maravilhou ao ver as sombras abrangendo aquelas regiões baixas. Com um binóculo, denominado vistatempo (existente entre os objetos do violino gigante) ele podia avistar ínfimos pontos, por mais distantes que estivessem na linha de visada. Olhando para o espaço, as estrelas pareciam tão próximas que a luz emitida por elas tinha que ser filtrada pelos dispositivos do binóculo, para não segar o observador. O menino pela primeira vez pode observar o planeta Júpiter em toda sua plenitude. Viu que era uma bola de gases com movimentos violentos, como se lá houvesse uma contínua tempestade.
-Deste local poderemos localizar muitas coisas pelo vistatempo, pai - disse alegremente o menino. Até que enfim temos um lugar ideal para passar nossos dias.
Entrando no violino gigante, conforme lhe denominaram, quiseram saber algumas coisas do interlocutor invisível, vindo eles a inquirir sobre o fundamento da existência da equipe de cientistas que controlavam a astronave.
-Somos viajantes das galáxias, porém habitávamos na terra – disse a voz – mas evoluímos em ciência. Com o fato conseguimos criar dispositivos para controlar o tempo, que se resume em duas fases, antes e depois do momento presente.
-Os microcomputadores que lhes doamos é de um tempo futuro, relativo ao início
do século vinte e um. O fato de usarmos tal equipamento é em razão de que, longe da astronave, as ações do tempo se tornam inoperantes. Os dispositivos dos teclados estão conectados à nave, via rádio-fenda, o que nos dá condições de efetuarmos as operações.

CAPÍTULO 03
A noite desceu com seu manto salpicado de estrelas. Mais uma vez nossos personagens pernoitaram no interior da nave do tempo, e como na noite anterior, tiveram muita paz.
Acostumados a se levantarem de madrugada, o professor e o menino despertaram antes do amanhecer. O menino estava curioso para vislumbrar os arredores, e principalmente a abóbada celeste, a fim de contemplar os pontos brilhantes que mudavam de lugar e desapareciam – eram os meteoros, chamados de estrelas cadentes.
Naquela madrugada teriam uma surpresa. Notaram que fora da astronave havia alguns animais. Possivelmente seriam lobos habitantes daquelas matas, e pelos ganidos que faziam, despertou no menino a curiosidade de olhar lá fora para saber o que estava ocorrendo.
Observando através de uma janela da nave notou que, além dos animais, havia um homem com a aparência dos homens das cavernas. Tinha barba serrada e longa, vestia uma tanga, estava semi-nu e ostentava uma espécie de clave.
-Pai venha ver o que há fora do violino gigante. Parece um homem e alguns lobos pré-históricos!
-Eureka! Aqueles lobos são de raça antiqüíssima; e aquele homem é da classe dos primatas, parece macaco! Impressionante filho. Vamos pedir informação ao nosso inter-locutor cientista, não podemos sair lá fora sem saber como agir.
-Não se preocupem, meus amigos. A máquina do tempo varia em seus estacionamentos. O instante em que estão entrevendo agora está numa fenda de trinta mil anos atrás, mas tudo está sob controle. Se digitarem a tecla MA do teclado do painel B, ela entrará no momento atual. Essas variações ocorrem em razão da energia temporal flutuar nas épocas. A nave, embora estacionada, porém as variações do passado e futuro se mesclam sobre ela. Outrossim, essas variações só ocorrem para quem está próximo e dentro dela. Após digitarem notarão que tudo está normal em redor, portanto dentro do tempo atual.
-Mas caso queiramos participar de uma comunicação com o homem das cavernas, o que deveremos fazer?
-Basta digitar no mesmo painel as teclas MPH. Com isso poderão sair fora da nave e viverem a mesma época da flutuação. Porém o façam com cuidado, pois há possibilidade do homem ser irracional e vos atacar pensando em defender-se.
-Ah! então é melhor colocarmos a casa do tempo no momento atual filho, não confio em homens pré-históricos.
-Mas pai, eu sempre tive vontade conhecer os habitantes antigos de nosso planeta. Vamos tentar nos comunicar com este que está ai fora.
Nossos personagens notavam que a curiosidade também estava estampada no rosto barbudo do homem, parecendo querer saber coisas sobre a nave.
-Ei – disse o menino dirigindo sua voz, desde a janela, ao homem das cavernas – você pode me entender?
-Ri-zung-bai? – respondeu o curioso homem das cavernas, se apresentando como se fosse dotado de inteligência racional.
-Ele perguntou: quem são vocês – disse o interlocutor invisível da astronave – poderão responder-lhe: bam-lai-zum, zur-far-rari. Que significa: somos daqui mesmo, porém do futuro.
* * *
O fato é que com as instruções do cientista do futuro, o professor e seu filho puderam conversar vários assuntos com o homem das cavernas, dando-lhe até oportunidade de conhecer o interior da nave do tempo. Os lobos que estavam em sua companhia, segundo disse ele, eram animais de sua estimação. O fato dele se acercar da astronave no alto do morro surgiu em razão de ter visto o estranho acontecimento, que foi sua aterrissagem, momento em que ocorreu a flutuação de épocas.
Depois de oferecerem alimentos ao homem das cavernas, o professor e seu filho acharam por bem transportá-lo à sua época, digitando tal solicitação no teclado.
A partir dali passaram a fazer do violino do tempo uma fonte de experiência. Os cientis-tas da galáxia lhes deram de presente a fabulosa máquina, sendo portanto, transformada em habitação para o professor e seu filho, que puderam, além de nela morar, fazer muitas viagens, tanto perto quanto longe, sempre usando a fenda do tempo e os dispositivos da maravilhosa astronave para a sobrevivência deles e de outras pessoas necessitadas. Além dos procedimentos acima, transmitiam aos cientistas da galáxia, dados relativos a seus deslocamentos e ações a fim de mantê-los informados.

FIM DE: O VIOLINO DO TEMPO – POR LUZIRMIL (ICOPERE)
Luzirmil
Enviado por Luzirmil em 12/07/2010
Reeditado em 26/07/2010
Código do texto: T2372462
Classificação de conteúdo: seguro
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