Adorável Agonia

É tanta felicidade! Felicidade está que me assusta. Me assusta? Um pouco. Tenho medo da punição por ter querido ser feliz demais. Ter querido apenas? Ter conseguido. Não posso ser punida por aquilo que desejei. Não posso? Não deveria. Minha punição deveria se resumir ao que alcancei, ao que consegui alcançar após muito tentar. Tentar? Nem sempre. Às vezes algumas de minhas maiores conquistas são as que nunca cativei. Após muito trabalho alcançarei a simplicidade por mim cativada, simplicidade esta pela qual serei eternamente responsável. Sendo eu eternamente responsável por esta, no dia em que dela eu tentar fugir, começarei a ser perseguida, assombrada.

Busco a simplicidade para ser entendida. Mas busco-a na verdade para me entender. Fujo dela para não ter que lidar comigo mesma. Só tenho medo do que me é familiar. Quisera eu ter medo do desconhecido. Admiro o desconhecido, pois tenho espírito aventureiro. Quero desbravar e explorar coisas novas. Quanto mais me descubro mais me assusto. Não posso, não posso! Preciso estabelecer um limite. Se eu descobrir tudo que há em mim, tenho medo de não mais me reconhecer. Amo a minha parte oculta em mim mesma. Amo-a com tal reverência que a respeito, a ponto de não revelá-la. Como Deus. O ser humano nunca revelou Deus a si mesmo por amor e profunda reverência. O diabo já foi revelado ao ser humano. É o que lhes assusta. Tenta-se em vão conhecer o divino e destruir o profano. Tentativa essa que busco. Mesmo sem conseguir, sei que preciso tentar.

Descubro então que esta tentativa poderá ser frustrada pelo próprio paradoxo de minha busca. Descubro agora que destruir o profano seria destruir parte de mim, pois eu, incógnita de mim mesma, não sei qual erro sustenta meu edifício inteiro. E por ser cautelosa (leia-se medrosa) não me arrisco a me descobrir nem mais um pouco. Como o divino. É tão belo e poderoso que tenho medo de não suportar sua glória, eu, que sou pecadora. Tenho medo de descobrir mais do que devia saber sobre o divino, mais do que tenho permissão de saber, e ser destruída por sua ofuscante luz purificadora.

Busco a força que preciso na religião que não tenho. Quero crer! Quero ter fé! Crendo me protejo. Crê apenas. Não pergunte. Crendo terei a força da qual necessito para sobreviver o que não conheço. Tendo fé no desconhecido, protejo-me com escudo, pois não preciso fazer descobertas. Crer me isenta de tentar, de conhecer aquilo que me assusta. Os demônios também crêem e estremecem. Estremeço eu junto com eles. Estremeço com prazer. É uma agonia. Uma agonia gostosa que me aflige, excita. Agonia essa que, sem compreender muito bem como ou porque, me leva a algo novo e puro, poucas vezes experimentado: felicidade! É tanta felicidade. Felicidade esta que me assusta.

Dudlei De Oliveira
Enviado por Dudlei De Oliveira em 29/10/2010
Reeditado em 27/02/2012
Código do texto: T2585632
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.