Num Banco Amarelo

Lá estava ela sentada num banco amarelo a desfolhar páginas de um livro velho como quem finge ler. Finge... Pois seu corpo adormecia por um encanto que nos é tão desconhecido. Só o seu coração batia... batia... batia... Batia como uma canção, uma balada. Nem as asas do livro a bater despertavam-lhe desse sono e traziam-na para a realidade mórbida e dolorida que ousamos viver. Uma faísca apareceu no seu olhar, seu coração já não batia mais como uma canção, era ainda poesia, mas batia como quando vemos algo desejado, mas temos medo de quebrá-lo.

Lá estava ela sentada num banco amarelo, mas não adormecia, nem vivia a realidade aqui já dita, vivia uma realidade paralela, onde a morbidez só entraria com o desencanto. Lembrava até um relógio que só parece acordar quando os ponteiros se encontram e as batidas tornam-se mais fortes e temos a impressão de que a hora vai voar.

Ela também tinha encontrado... Os seus olhos encontraram e miravam um mar de mistérios, um mundo dourado, um corpo ausente que queria como presente. Ela encontrou a porção do seu encanto e a mesma era a responsável pelo desencanto que a menina sentada no banco sonhara outrora por acontecer. Seus olhos haviam encontrado... encontrado um outro par de olhos que não sabia o que dizer. Estes olhos eram o mar de mistérios. Era ele o causador de tamanha euforia no mundo da infante que o olhava. O olhava sem saber o motivo – ou sabia e se enganava – olhava e venerava aqueles olhos que mal sabiam o que se passava; olhava e desejava o desejo de alguém que nem poderia desejá-la; olhava e invadia aquela alma que nem imaginava ser tão cobiçada. Ela, no entanto, só achava que olhava...

Lá estava ela sentada num banco amarelo acompanhada pelo par de olhos que ela tanto admirava... Ela perdeu o sentido da fala, só seu coração gritava... gritava... gritava, mas ninguém ouvia. As palavras foram surgindo, porém elas se escondiam com medo de serem ouvidas. Palavras que deveriam ter sido ditas mesmo que não tivessem sido escutadas. A realidade estava ainda mais distorcida. Os seus olhos que tanto olhavam, agora tremiam; o livro que era enganado foi de vez esquecido; e o par de olhos que refletia o encanto da menina ao olhá-la estava tão perto, entretanto, sem o seu próprio encanto.

Lá estava ela sentada num banco amarelo com um livro de páginas velhas que ela já não desfolhava, com um par de olhos que ela tanto venerava, mas que não comprara. Estava ela em uma terceira realidade, acordada, mas distante da realidade que nos é pregada. Olhava o infinito, contemplava o nada e sentia a sensação de estar num conto. A menina foi descoberta pelo par de olhos que não a olhava e ela que tanto com isso sonhara ficou desconcertada. O encanto que poderia ter quebrado foi cravado mais ainda e, agora, cravado em sua alma. O par de olhos tão inocente não sabia o desastre que causara na moça do banco amarelo. Desastre ou vivacidade... Depende de quem lê.

Lá estava ela sentada num banco amarelo novamente a desfolhar páginas de um livro velho como quem finge ler. Finge... Pois seu corpo novamente adormece no encanto, num encanto mais profundo de quem já teve o par de olhos tão próximo e, agora, está sentada sozinha com um coração batendo em canção e com um suspirar infinito.

Lá estava ela sentada num banco amarelo...

Gabriela Ferper
Enviado por Gabriela Ferper em 15/10/2006
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