CAMINHOS CRUZADOS

CAMINHOS CRUZADOS

Francisco, poderia se dizer, era daquelas pessoas que não eram ricas mas as que batalhavam com muito esforço para conseguir o que possuíam. Não era muito, porém orgulhava-se de tudo o que tinha. Conseguido de modo honesto e com sabedoria.

Possuía uma família maravilhosa, um casal de filhos estudiosos, esposa dedicada e que muito o ajudavam no seu pequeno comércio. Tinha tudo o que um homem poderia querer. Mas tinha um porém: não acreditava em religião, ou melhor,em Deus, ao contrário da esposa e filhos que eram muito religiosos e que acreditavam que tudo na vida tinha a mão de um ser superior. Mas puxar o assunto com Francisco, era deixá-lo mal humorado o resto do dia.

Vida simples a de Francisco, mas muito trabalhosa. Possuía uma pequena padaria na cidade e atendia a todos de forma atenciosa e cortês razão do bom conceito que tinha entre todos os moradores. Mas algo estava para acontecer que iria mudar os rumos de sua vida. Ele nem imaginava.

O padre José sempre passava de manhãzinha pela padaria para pegar alguns pães. E era o único que podia brincar com o Francisco sobre religião, que ele ainda respeitava um pouco.

- E daí Chico, vamos à Igreja? – dizia o padre.

- Mas o senhor não desiste mesmo, né padre? – retrucava Francisco.

- Todas as ovelhas desgarradas nós temos de salvar, Chico! –brincou.

Mas aquele dia estava muito bonito, com um céu azul de ofuscar a visão. O dia prometia, pensou Chico.

Era por volta das dez horas, muito tranqüilo depois de um movimento intenso, quando entrou na padaria uma pessoa diferente. Toda de branco parecendo médico, alto, l, 85 mais ou menos, olhos azuis, bem apessoado. Chico nunca o tinha visto antes. Chegou ao balcão e disse:

- Francisco – disse ele - estou com uma família passando necessidades e que precisa de dois litros de leite e dez pães, só que no momento estou sem dinheiro para lhe pagar. Se você puder fazer a caridade e fornece-los para mim e assim que puder virei lhe pagar.

Sem perguntar nada e sem saber o porquê, Francisco arrumou o que o estranho lhe pedira. Depois não soube explicar, pois não era costume seu fazer isso, ainda mais com estranhos.

- Deus lhe abençoe, Francisco! Assim que puder eu voltarei. – e foi embora.

Como que dormindo e acordasse de repente, Chico foi até a porta e não viu mais o estranho. Foi muito rápido. Mas com o serviço aumentando, esqueceu-se do ocorrido.

À noite na hora do jantar, comentou com a esposa Valéria e os filhos Júnior e Sandra, o ocorrido.

- Pode ter sido um sinal! – disse Júnior.

- Lá vem ele com essa história de novo! Você sabe que não acredito nisso. – respondeu o pai.

- Ele talvez tenha razão. – comentou a esposa.

Chico amuou e não deu ouvidos aos comentários. Resolveu, logo depois, ir dormir pois o dia seguinte prometia muito serviço. Deu boa noite, beijou a esposa e os filhos e foi se deitar.

Passaram-se alguns dias e o caso do homem misterioso parecia ter sido esquecido.

Pedro, funcionário de Francisco, chegou ao patrão e disse:

- Seu Chico, o estoque de farinha de trigo está baixo e vai faltar. Até pedir não dará tempo de chegar e o que temos aqui terá se acabado!

- Vou ver o que posso fazer, Pedro. – respondeu.

Mas nunca tinha acontecido isso. “Foi um descuido de minha parte”, pensou Chico. O jeito era ir de camionete até a cidade mais próxima, onde ficava seu fornecedor, buscar pessoalmente. Avisou a esposa e iria logo depois do almoço.

- Vai com Deus! – disse Valéria.

Fingiu que não ouviu, beijou-a e saiu com camionete. Ela e os filhos ficaram cuidando da padaria.

Chegando ao fornecedor comprou a quantidade necessária de farinha, colocou na camionete e começou o retorno para casa.

Havia chovido bastante e o asfalto estava molhado. Chegando a um lugar chamado de Serrinha notou que a estrada principal estava bloqueada pelo barro e que havia coberto o asfalto. Problemas. Para passar só cortando caminho pela Serrinha, cuja estrada não era asfaltada e muito perigosa, cheia de curvas. Mas não poderia ficar esperando. Tentou ligar para casa, mas não conseguiu falar. O celular não funcionava. Resolveu seguir. Após muitas curvas, ao chegar a uma mais fechada, entrou com um pouco mais de velocidade. De repente a camionete derrapou e escorregou na lama em direção ao precipício. Deu uma travada e parou. Ficou metade na estrada, a traseira da camionete na estrada, com a farinha, e a frente em direção do precipício. Não podia sair e nem voltar. E, pior, já estava noite adiantada. Nem uma viva alma. Teria que esperar que alguém passasse e o socorresse. Para seu bem, a chuva havia parado. O jeito era ficar calmo e aguardar.

O céu de repente limpou e mostrou uma linda noite estrelada. E ele ali, na solidão da estrada.

Após algum tempo percebeu uma luz ao longe, que cada vez mais se aproximava e ficava cada vez mais forte. Um forte clarão se fez sentir e a cabine da camioneta encheu-se de luz. Ao seu lado apareceu um homem todo vestido, de branco, como aquele que o visitou na padaria. Era ele! Reconheceu ser a mesma pessoa. Ficou assustado e tremendo.

- Francisco, não tenha medo. Estou aqui para lhe ajudar. Tenha fé e acredite em mim. – falou o homem.

Num instante Chico não enxergou mais nada. Tudo voltou ao normal e o homem não estava mais ali. Percebeu, então, que a camionete estava na estrada e pronta para seguir viagem. Estava livre do atoleiro. Acalmou-se e percebeu que lágrimas caiam dos seus olhos. Chegou a casa mas não comentou o fato com ninguém. Só queria dormir, pois já era tarde.

Na manhã seguinte não se lembrava de nada. Contou o ocorrido e o sonho que havia tido.

- Mas não foi um sonho! Você realmente foi à outra cidade buscar farinha. Pode ir ver a camionete, está toda suja, cheia de barro. Imunda. Vai ser duro lavar.

Não acreditou. Resolveu pegar a camionete e ir até o local. Foram todos.

Ao chegarem ao lugar viram sacos de farinha caídos no chão, que Chico não percebera na hora. Rastros dos pneus da camionete sendo arrastada e marcas fundas na lama, no local em que havia parado. E a frente uma enorme ribanceira. Se caísse lá teria sido o fim. Chico e a família não acreditavam! Milagre? Quem era o homem que apareceu, todo de branco? A luz à noite? Chico após um breve silêncio, comentou:

- Talvez vocês tivessem razão. Talvez fosse um sinal a me dizer para ter mais fé, acreditar. Existe alguém maior neste vasto universo a guiar todo mundo.

Pela primeira vez Chico agradeceu a Deus pelo milagre. Também pela primeira vez, sentiu a verdadeira paz a invadir todo o seu ser.

lmorete
Enviado por lmorete em 23/02/2012
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