Sanidade...

Ele não se lembrava de como foi que aquilo tudo começou. Já fazia um ano, ou seja, trezentos e sessenta e cinco dias, e justo ele que um dia aprendeu a viver sem calendário, sem horários fixos, sem uma rotina pedante, agora necessitava desse argumento para sobreviver sem enlouquecer de vez. Claro, já havia ficado um pouco paranóico como outros sobreviventes por aí, era o que ele criava em sua cabeça para mantê-lo são... Sóbrio?! Depois de tanto ler, ver filmes, pesquisar sobre os mitos reais e esse tema, o caos finalmente havia tomado conta da humanidade. Ele sabia que aquilo ocorrera no mundo inteiro, pois a conectividade via internet era tão absoluta naquele momento de existência humana que quando tudo caiu em pedaços, a comunicação foi a primeira coisa afetada, em diversos níveis, de vários tipos, e com tantas línguas e culturas diferentes. Imagina como foi rápido e fácil ver a decadência de uma espécie que não "viveu" quase nada em seu próprio planeta e queria ir ao planeta vizinho conquistá-lo... Não entendi essa última parte aí, ele pensou naquilo novamente com mais lentidão. Somos uma só espécie, e a burrice foi tão grande que restam pouquíssimos vivos por aí, e de verdade, não sei se é uma boa ideia procurar por pessoas que estejam sobrevivendo nesse total pandemônio. E por que ele pensou desse jeito sobre nós? Cara considerei isso por um bom tempo e não cheguei a nenhuma conclusão diferente do que ele relatava. Um mesmo tipo de biologia que entrava em guerra consigo mesma, já não bastasse os próprios problemas considerados normais devido ao fato de que tudo que nasce deve morrer algum dia, e se esse tudo tiver sido conforme a escrita, depois de bem velho e experenciado dessa vidinha material. Nem precisou daqueles monstros nos primeiros meses. Os próprios sobreviventes acabaram uns com os outros por diversos motivos considerados os pecados mortais como o egoísmo, o esbanjar e o desperdício, o poder e o querer controlar, e próprio o ciúmes. Sendo assim o medo que já era algo imposto para a sociedade em geral sem que fosse uma coisa percebível no dia a dia rotineiro e maçante, as pessoas não tinham tempo para pensar em nada que não fosse trabalhar, trair, viajar uma vez por ano, bláblá... Alastrou como uma praga pandêmica. Em todo esse ano ele não interagiu, não viu, e não procurou por nenhuma outra pessoa. Também não teve o desprazer de receber visitas indesejadas do apocalipse. Ou seja, viveu um ano quieto até demais. Deu a "sorte", no primeiro momento ele pensou assim, que vivia em um pequeno prédio de um bairro burguês daquela cidade de três milhões de habitantes. Início de mês, ou seja, tinha muita comida e mantimentos estocados em todos os apartamentos vizinhos e inclusive o seu. Tanto que ele pode além disso se esbaldar em alguns momentos em festas particulares consigo mesmo. Depois de imaginar diversas coisas diferentes, como poderia se sair em situações boas ou ruins a cerca do fim do mundo, ele fez uma rotina diária que o ajudaria a manter a sanidade e a paciência. Seu corpo sentia falta de frutas, saladas, de comida sem estar numa lata ou conservada em óleos. A água também se tornou um problema bem mais rápido do que os únicos três galões que ele tinha guardado. No entanto havia filtros em quatro dos apartamentos vizinhos, e ele pode filtrar e esquentar a água que conseguia coletar. Essas ações duraram semanas, talvez meses. E isso por mais louco que pareça, o perrengue deixou-o mais disciplinado, para que pudesse sobreviver sem se por em risco por mais tempo. O engraçado é que esse tal "risco" acontece a partir do momento em que você escolhe sair da cama para suas tarefas diárias. E não se soube se por medo, ou por ser uma pessoa precavida. Acredito que um tanto dos dois. .. E para ele, enfim, nenhuma gripe o pegou...