Luz Azul

Os cobertores jogavam seu peso sobre o corpo pequeno da criança que se remexia ali embaixo lutando contra o sono, aquela criatura insistente que cismava em esticar seus braços para abraçar o menino e que ganhava força a cada tique e a cada taque que o relógio fazia ao trotar pelo campo preto e branco.

O criado mudo ao seu lado sustentava sua luz noturna, uma constelação giratória que em seu balé estelar iluminava o quarto durante a noite escura. Os pontos azuis brilhavam e desenhavam sistemas solares inteiros enquanto um pequeno foguete cruzava o teto em uma viajem infinita.

Seguindo o embalo do relógio o vento do lado de fora roçava a janela, o tipo de vento que antecede a chuva, que acaricia cada folha e cada galho do quintal. Ele contava histórias, revelava ao menino os segredos que guardara, falando sobre cada barco que empurrara pelas planícies de azul finito e cantando toda e qualquer melodia já disparadas a ele pelos pássaros que em suas correntes mergulhavam.

O sono e o trote do relógio juntos davam vida a cada ponto de luz que se moldavam pela voz suave da brisa, tirando-as das paredes aos pulos para se tornarem tangíveis entre os dedos do garoto que ria, acompanhado pelas cigarras e grilos que se escondiam entres as árvores para ouvir o que o vento tinha a dizer.

Agora os pássaros cantavam ao seu redor, brilhando em luz azul, barcos velejavam por seus cobertores que tremulavam sempre que um golfinho saltava para o ar entre uma acrobacia e outra.

Quando a chuva veio o vento se despedira, as luzes voltaram ao seu lugar, pijama e cobertor o abraçavam forte quando vinham os trovões desenhando rios dourados entre as nuvens. Os insetos foram silenciados pela água que lavava as folhas e fazia gotas correrem pela vidraça, e o sono, já alimentado por seus sonhos semiconscientes o chamava mais e mais para que a criança se pusesse a dormir.

Mas ela ainda queria ouvir o que o vento tinha a dizer, queria novas melodias e queria ver mais golfinhos de luz saltando em seu cobertor, mas o senhor do sono, a cada tentativa do menino de manter os olhos abertos, sussurrava docemente em seus ouvidos.

“Boa noite meu pequeno. ”

Seus braços faziam peso sobre a cama quando ele se inclinou e beijou a testa do menino dizendo:

“Tenha bons sonhos. ”