Morre menino

As tragédias do cotidiano combinavam com as tristezas, as crueldades. Agora parece longe, um tempo diferente. No campo, no mato, na lavoura, na colônia, lá fora, longe do povo. O formigueiro era mais interior do que hoje, disperso por lugarejos. Aos poucos nos juntamos neste agrupamento desajustado. Tudo estava longe. Carecia sempre das pernas para demandar. Num apuro, deus nos acuda. Nem sempre acudia, tardava, não ouvia. Curandeiro, benzedeira, rezadeira. O que tinha servia, cerzia, urgia. Mas se nem à reza reagia. Tristeza pueril transmuda aguda em agrura que para sempre dura. Picada de cruzeira, de qualquer outra peçonha. Morria. Como morria. A notícia corria lenta, chegava fria. Certa tarde, no verão daquele dia, daquele menino, do guri tão pequenino, ainda de pouca arte. Ferido em febre se derrama, sofre a mãe, ao pai clama. Nada explica a dor que se replica enquanto corre e acelera e se apressa e já escapa. A vida escapa. O colo esfria no coração da mãe. A sorte bruta cruel faz fila na ferida aberta que se esvai. Qual foi a causa, que causa foi? Qual mal, morbo, moléstia? O menino vai morrendo, vai morrer, como morre. Tristeza cruza outra. Enche outra. E a vida se esvazia. Lá no fundo da grota. A cruz jaz esquecida das vidas prometidas.