Bia e o anjo torto

Bia nasceu, um anjo torto a abençoou de forma certa, pois sendo enviesado, via o mundo de um jeito alterado feito um ferro dilatado que podemos transformar no que quisermos. Acreditou que faria bem a menina, os anjos gostam de crer que fazem o bem mesmo sem entender. Afinal, ela viveria pelo avesso do mundo, andaria pelas margens da vida, as bordas das estrelas a fariam feliz, pensava o anjo. O problema é que a Bia não gostou em um pouco de ser assim, logo que entendeu o seu desajustamento no mundo em que vivia. A inadequação a acompanhava como uma rua sem saída. As vestes não caiam bem em seu corpo distorcido, os sapatos apertavam em seus pés pontudos. As mãos eram deslocadas de seu corpo como se não pertencesse a ela, tinham existência própria. Bia mirava as estrelas e lua e pensava. “que planeta é esse que nada me pertence em que eu sou parte nula dentro dele?” Havia uma fenda dentro dela, ninguém via, ninguém notava, mas havia e tomava conta de tudo. A cada dia que a sua inadequação se dilatava, a fenda aumentava levando tudo que havia por dentro e por fora. Um dia, depois de muito tempo, olhou-se no espelho, não havia mais nada somente uma cratera encobrindo tudo.

Sorriu feliz, nada mais havia, não precisava mais ser nada. O nada a encobrirá.

Marisa Piedras
Enviado por Marisa Piedras em 16/02/2022
Código do texto: T7453865
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2022. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.