1176-OS ESQUECIDOS DE DEUS

OS ESQUECIDOS DE DEUS

Ao saírem da caverna, a trovoada e a chuva já haviam passado e a presença do Criador esvaneceu-se; o sol apareceu aquecendo a natureza.

Adão caminhava depressa e não escolhia atalhos, pulando sobre troncos caídos e não desviando de nada. Mostrava-se obstinado e não se importava que Eva ficasse para trás.

— Me espera! — Gritava a mulher, tropeçando nas pedras e nos cipós rasteiros.

Se ele estava determinado e pouco falasse, ela reclamava, gritava e por vezes choramingava. Depois de muito tempo de caminhada em passo apressado, ela queixou-se de cansaço e então pararam debaixo de frondosa árvore.

O sol já estava baixo no horizonte, tingindo céu e nuvens de brilhante luz amarela sanguínea.

— Estou com fome. — Sentada no chão, abraçou os joelhos e olho para Adão com um olhar de quem não estava gostando nada daquela caminhada.

— Vou procurar algo para a gente comer. Enquanto isto, vai ajuntando as folhas secas aqui debaixo desta árvore para termos um lugar macio para dormir.

Virou nos pés e se dirigiu a um grupo de árvores que havia na encosta de uma colina. No lusco-fusco do final do dia, viu que das árvores pendiam frutos arredondados, de cor amarela. Apanhou uma e tentou comer. Tinha uma casca amarga, que tirou usando sua rustica faca de pedra afiada e um suco doce saiu do interior. Apanhou algumas e voltou para a árvore, onde Eva já tinha amontoado uma boa quantidade de folhas secas.

Comeram as frutas, mitigando um pouco a fome. Em seguida, Adão amassou as folhas, a fim de fazer um rústico leito. A noite estava quente e deitaram-se sob o céu salpicado de estrelas.

Cobriram-se com as grandes folhas que usavam amarradas na cintura,

Aconchegaram-se. Adão desejava dormir mas Eva parecia insone e disse:

— Estou muito aborrecida porque tivemos que sair do Éden.

— Eu não. Agora sabemos o que é liberdade. Podemos escolher o que fazer e o que não fazer. Aqueles aparecimentos repentinos de Deus, com raios e trovões, me deixavam assustado. Além disso, Ele estava ficando cada vez mais autoritário.

— Você está revoltado contra nosso Criador?

— Sim, estou. Ele nos criou e disse que soprou seu espírito em nós. E na primeira vez que fizemos alguma coisa que Ele não gostou, nos castigou com maldições. Mandou a gente sair do Éden. Isto não é atitude de um pai que ama os filhos.

—Mas, por outro lado estou até achando bom esta sensação de liberdade.

Entre palavras e murmúrios, adormeceram.

Despertaram quando o sol aqueceu seus corpos. Famintos e sedentos.

A sede foi saciada com os mesmos doces e caldeados frutos que já haviam saboreado na véspera. Para mitigar a fome, Adão teve que procurar por raízes e outros frutos mais substanciosos, que não teve dificuldade em encontrar.

Seguiram caminhando. Sempre n direção de onde o sol nascia.

— Aonde vamos?

Apontando para o horizonte irregular, com fendas e picos, Adão disse:

— Está vendo aquelas montanhas azuis? Lá devem existir cavernas onde poderemos nos abrigar. ,

E caminharam. Dias e dias pela planície de campos e matas, cortada por regatos ou rios rasos. Encontraram animais diferentes daqueles que conheciam, aves em bandos que passavam fazendo alaridos assustadores. Animais pastando placidamente nas campinas, ou pulando pelos galhos das árvores.

Muitos bichos, entretanto, assustados, fugiam ao notar a presença do casal. Outros subiam pelas árvores e sumiam no meio da folhagem. Alguns soltavam fortes barulhos e mostravam-se hostis e até tentando agarrar o casal,

— Os bichos não gostam da gente. - Dizia Eva.

— Nem eu deles. Querem nos atacar, mas ao mesmo tempo têm medo. Lá de cima das árvores nos joga frutos, para nos atingir. Ainda bem que erram na pontaria e os frutos servem para matar nossa fome.

Por duas vezes presenciaram animais ferozes em caçadas mortais, coisa que os deixou assustadíssimos. Ocasiões em que Adão se colocou em guarda, segurando um duro pedaço de galho em uma mão e a rústica faca de pedra na outra,

Eva ia dando nomes aos bichos, aos locais e até às coisas que não conheciam, como “sol” para aquela grande bola brilhante que viajava pelo céu e que feria os olhos quando olhado diretamente; ou para aquela outra forma redonda, de luz suave, que chamou de “lua”. E aqueles bichinhos que ficavam piscando lá em cima, longe deles, que só apareciam quando ficava escuro, que chamou de estrelas.

Ao chegarem ao sopé de uma cordilheira de montanhas, encontram cavernas e rochedos onde se abrigam e se estabelecem. Abaixo, corria um rio mansamente, de águas cristalinas.

As frutas eram abundantes naquela região. Muitas ervas perfumadas e saborosas completam a alimentação.

Adão fez fogo, aproveitando restos de uma arvore atingida por um raio e que queimava lentamente. A princípio, ambos ficaram assustados, mas Eva se aproxima e se sente aquecida

— Se tivermos esse calor dentro da caverna, será ótimo para a gente se esquentar.

Adão consegue levar o fogo para a caverna, onde faz uma pequena fogueira. E começam pequenas experiências em assar raízes.

O tempo passa placidamente, alterado as vezes por grandes tempestades, om raios e trovões. Nas primeiras tormentas, Adão pensou que era Deus que vinha visitá-lo. Mas Ele nunca mais apareceu.

Um dia, quando raios rasgavam os céus e trovões ensurdeciam a natureza, a chuva e o vento açoitavam as árvores, sentindo-se abrigado e confiante, Adão disse para Eva:

— Acho que Deus se esqueceu de nós.

A seguir - A primeira Familia

ANTONIO ROQUE GOBBO

Sítio Estrela no sopé da Serra da Moeda -

Em 24 de setembro de 2022

Conto # 1176 da série INFINITAS HISTÓRIAS

Contos da Série A HISTÓRIA DE ADÃO

Conto 1.115 - Notícias do Éden

Conto 1.116 - Expulsos do Éden

Conto 1.176 - Esquecidos de Deus

Conto 1.1..... - A Primeira Família (A SEGUIR)

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 17/08/2023
Reeditado em 17/08/2023
Código do texto: T7863902
Classificação de conteúdo: seguro