MISTER MAX E O CAVALEIRO DAS TREVAS, Parte 2

(Batman é personagem criado por Bob Kane nos quadrinhos em 1939)



SEGUNDA PARTE:

O HOMEM DAS TREVAS



— Eu não deveria fechar a loja — disse Mercedes. — Esse homem não poderá me perseguir para todo o sempre. Não quero ser uma covarde.
— Eu tenho minha própria opinião, mas acho que você deve decidir por si. Max, como de hábito, era frio e brusco, quase grosso. Não era uma pessoa de fáceis amizades e nem fazia questão disso. Entretanto, não abandonaria uma amiga.
— Talvez eu devesse tentar localizar Square — lembrou, por fim. — Tenho negócios em Londres e me parece que Ted não se prende a nada.
— Seu amigo deve estar muito ocupado e eu não creio que chamar um aventureiro ajude — Mercedes sorriu tristemente. — Deixe-me só um pouco, Dr. Max, por favor. Preciso refletir sozinha e de qualquer modo amanhã é sábado e eu só teria de reabrir a loja na segunda.
Max colocou o chapéu e desceu. Saiu à rua para tomar um pouco de ar, com a vaga idéia de alugar um carro, se precisasse permanecer mais tempo em Gotham. Quando virou a esquina um carro negro e inconfundível estacionou ao seu lado e uma voz cavernosa chamou:
— Dr. Max, entre, por favor. Nós precisamos conversar. Max resolveu dar uma chance ao Cavaleiro das Trevas e aceitou o convite.
— O senhor tem alguma idéia? — perguntou.
— Imagino que o senhor ficou com má impressão de mim — disse Batman, impassível. — Mas saiba que eu não fiquei parado. Estive acessando a internet e descobri coisas muito interessantes a seu respeito, Dr. Max.
— Aonde está querendo chegar? Não sou eu quem está sob investigação.
— Correto. Mas eu precisava saber alguma coisa a seu respeito e agora compreendo melhor porque Mercedes o chamou. O senhor é um homem que se dedica a causas nobres.
— Isso faz alguma diferença?
— Eu gosto do seu estilo cortante — assim dizendo Batman deu um sorriso contido, uma grande concessão ao bom humor. Max permaneceu em silêncio e o Cavaleiro das Trevas continuou, como se devaneasse:
— Deve compreender que eu sou um homem traumatizado pelo destino, Dr. Max; sou um homem amargo e sem ilusões. A minha grande frustração é não ter conseguido acabar com o crime, sequer em minha cidade.
— Meu senhor — observou Max cuidadosamente — não tenho grande interesse em tomar conhecimento dos seus traumas de infância e dos seus conflitos existenciais. Existe um caso concreto, uma grande amiga está sob ameaça de morte. Por falar nisso, para onde estamos indo?
— Vamos para o bairro das Tralhas, um subúrbio esquecido de Gotham City. — Doutor Max, o que eu lhe disse sobre a dificuldade em proteger inocentes é a expressão da verdade. Suponhamos uma pessoa qualquer, que incorra nas iras do crime organizado e venha a ser condenada á morte pelos gangsters. Tal pessoa pode, é claro, ser protegida dia e noite pelos agentes da lei. Então eu pergunto: e quem protege os protetores? Todo agente de proteção tem também a sua vida pessoal. Vamos supor que o bandido, não podendo de imediato matar determinado cidadão que está sendo protegido, resolva escolher um dos guarda-costas em seu lugar. O homem terá de revezar, ir para casa, ele tem também a sua família, talvez filhos pequenos. Do jeito que a sociedade está organizada, é fácil espalhar o terror. O criminoso está oculto, a vítima tem uma vida aberta. O agente da lei também está exposto. E não se iluda, Dr. Max: eu também ficaria exposto e minha vida não valeria um níquel, se a minha identidade secreta se tornasse conhecida.
Alisando a bengala, Max respondeu: — Eu na verdade já pensei muitas vezes nesses aspectos... o quanto as pessoas normais ficam expostas e a covardia com que agem os criminosos. Mas e daí? Onde é que isso nos leva?
— Dr. Max, já lhe ocorreu que nós, que estamos ao lado da justiça, temos às vezes de utilizar métodos astuciosos para enfrentar esses canalhas?
— Mas é claro. Tinham chegado à Radial Oeste e agora afastavam-se rapidamente do centro de Gotham. Batman prosseguiu explanando:
— Na última internação do Coringa ele foi sedado a pretexto de uma terapia de sono qualquer — o psiquiatra estava me ajudando, pois eu sabia que iria precisar disso alguma vez. O fato é que, atualmente, Jack Napier carrega sem saber, dentro do seu corpo, um chip de localização.
Max engoliu em seco. Percebeu, num instante, as implicações daquela informação.
— Então você sabe onde ele está?
— É claro que sei, Dr. Max. Eu tenho um localizador que nesse momento está bancando o relógio de pulso na minha mão direita.
— Isso é incrível! A tecnologia que o senhor usa...
— Pensei que nunca se admiraria — e o Cruzado de Capa sorriu ligeiramente. O batmóvel estacionou num sinal vermelho de um grande cruzamento e Mister Max, sentindo-se inquieto, olhou para os lados e para trás.
— Julga-se em perigo, Dr. Max? Alerto-o de que o batmóvel aguenta até tiro de bazuca.
— O que pretende fazer, Batman?
— Já lhe digo. Sei exatamente onde está o Coringa. Recorda tudo o que eu lhe falei?
— Como assim?
— Da inutilidade em prender certos criminosos e da inconsistência do sistema jurídico-penal no mundo liberal dos nossos tempos?
— Sim.
O carro deu a partida.
— Então, Doutor Max, faltam poucos quilômetros e minutos para que eu faça o que tenho que fazer — ou morra tentando. Decida o quanto antes se deseja me acompanhar.
— Senhor Batman, eu estou armado.
— Isso quer dizer “sim”. Todavia, uma simples arma não deterá o Coringa e a sua gang.
— Mas o senhor irá mesmo sozinho. Qualquer reforço é válido.
— Boa lógica a sua! Mas não teme complicações com a lei?
— Sou um advogado. As leis nunca se voltaram contra mim.
— Então vamos, Dr. Max.
O batmóvel arrancou por uma avenida de alta velocidade.
— Não conheço Gotham City — observou Max, aparentemente tranquilo. — Qual é o nosso destino?
— A vasta Gráfica Dostoievski, que pertencia a proprietários russos mas se encontra fechada e abandonada há décadas. Tem muita coisa assim em Gotham City, que é uma cidade decadente e frívola. A bandidagem se aproveita desses lugares abandonados e aí estabelece os seus redutos.
— É de estarrecer. Em Londres não é assim.
— Acredito que não.
O localizador mostrava em sua tela um ponto vermelho pulsante, e a seta negra que representava o batmóvel aproximava-se aos poucos.
— Dr. Max, sabe usar uma granada de mão?
— Nunca usei, mas não deve ser muito difícil.
— E não é. Vou lhe explicar rapidamente. Na hora H use-a em vez do seu revólver. Além de ser mais eficaz, diminui a chance de que o senhor venha a ser implicado.
— Pensei que o Cavaleiro das Trevas não fazia uso de armas — ironizou Mr. Max.
— Armas de fogo — explicou Batman. — Granadas são explosivos.
— O que você acha que o Coringa pretende fazer com os mini-mísseis?
— Com as adaptações que ele está processando... uma das idéias é explodir a chefatura de polícia quando Gordon estiver lá dentro. Afinal, o Coringa tem contas a ajustar com o comissário.
— Gordon já deve ter bastante tempo na polícia.
— É isso que eu temo. Pelo andar da carruagem é pouco provável que Gordon seja substituído por um policial tão competente... ou não contaminado por idéias “moderninhas”.
Max recostou-se no assento, tentando relaxar um pouco.
— Estamos chegando — avisou Batman, sombriamente.
O bairro era decadente, cheio de cortiços e casebres arruinados, e a vasta fábrica denotava à distância, pelas torres esburacadas, muros meio quebrados e paredes carcomidas, um abandono de vários anos. Batman já tinha tudo calculado.
— Nós vamos explodir isso aqui antes que o Coringa receba os seus detonadores para sofisticar os brinquedinhos da Mercedes.
— Temos chance de sair com vida?
— Preste atenção. O batmóvel é a prova até de metralhadoras e outras armas pesadas. Mas será preciso que você abra um pouco a sua janela para arremessar a granada. Eu arremessarei a outra do meu lado e isso deverá resolver tudo.
— Você acha que estamos fazendo o que é certo?
— Dr. Max, isto é uma guerra.
— É o que eu penso também — respondeu o advogado. Lembrou-se de um detalhe importante. — O local está todo fechado. Como é que nós vamos entrar?
— Pelo portão, é claro. Não importa que ele esteja fechado.
— Suponho que o batmóvel aguenta firme.
— É um risco que corremos, é claro, mas o batmóvel é um tanque de guerra estilizado. Segure-se firme!
Batman acelerou. Alguém devia estar vigiando e rajadas vieram sobre o auto blindado, inutilmente. O batmóvel arrebentou com o portão e derrapou pelo pátio interno, o Cavaleiro das Trevas manobrou para sair ao mesmo tempo em que ele e o Dr. Max preparavam o arremesso... .................................................................. Horas depois, na tranqüilidade do seu assento no avião da British, Mr. Max lia em seu “laptop” recentes notícias de Gotham City:

EXPLOSÃO EM FÁBRICA ABANDONADA MATA O CORINGA E SEUS CÚMPLICES
IDENTIFICADO O CORPO DE JACK NAPIER, O TENEBROSO “CORINGA” TESTEMUNHAS AFIRMAM TER VISTO O BATMÓVEL SAIR DO LOCAL

— Batman se arriscou muito — comentou Gordon, ao se despedir de Max. — Depois que eu me aposentar, duvido que o meu sucessor dê boa vida para ele.
— Talvez ele se aposente também, Comissário. Afinal, o grande objetivo de sua vida foi atingido. Ele eliminou o tumor que corroia Gotham. Agora ele pode se dar ao luxo de descansar.
Mercedes beijara Max ao se despedirem no aeroporto, e sussurrou:
— No fundo eu sei que você ajudou Batman. Obrigada, Max, do fundo de meu coração. E se algum dia reencontrar Batman, transmita a ele o meu agradecimento.
— Isto é pouco provável e, de qualquer modo, quanto menos você falar sobre isso melhor.
— Estamos envelhecendo, Dr. Max. Poderíamos fazer alguma coisa para o resto das nossas vidas, agora que eu encontrei um homem de verdade.
— Temo que eu já esteja muito velho para pensar nisso.
Agora no avião, Max quase se arrependia. Observando o mar de nuvens pela janela, o velho advogado pensava na Londres que se aproximava rapidamente. Londres, onde não existiam criminosos que se vestiam de palhaços e onde não havia nenhum cavaleiro das trevas fazendo acrobacias entre os prédios...
Miguel Carqueija
Enviado por Miguel Carqueija em 28/11/2013
Reeditado em 03/02/2017
Código do texto: T4590982
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