O Assassino do Condado de Cristovam

As pessoas são surpresas que tentam surpreender outras (somos suspeitos de qualquer crime que ainda está a existir em nossa própria vida. Só se pode conhecer alguém convivendo e ainda assim não podemos ter plena certeza, quem é absolvido de toda suspeita, quem é o mais bem visto pode ser o bicho papão).

L. F. B

O antigo Condado de Cristovam na verdade não é mais, apenas no nome. Aconteceu que um conde chamado Cristovam Velazo hospedou-se por um tempo em uma grande casa na região sul de Soutelo e lá viveu até sua morte. Um total de trinta anos viveu ele naquela região. O prefeito da época tomou conhecimento do conde e firmou amizade com ele. Após a morte dele o prefeito que mandou e desmandou e voltou ao poder da cidade batizou aquele lugar com o nome de Condado de Cristovam, foi uma bela homenagem, como se inaugurassem aquele lugar. Passaram-se mais alguns anos e o prefeito morreu, seu filho o sucedeu. Entretanto esse filho rebelde não se interessava pela cidade e sim, apenas pelo dinheiro. Veio a haver uma grande crise no país e mormente a cidade de Soutelo quase tornou-se uma cidade fantasma.

      Soutelo era uma cidade de oitocentos e vinte e nove habitantes e com uma área de trinta e um quilômetros  quadrados, a população havia diminuido um pouco só restava os mais jovens e idosos e alguns funcionários públicos. Claribel Halina era uma das jovens da cidade, ela gostava de ajudar os idosos que foram abandonados por seus familiares num asilo que abrigava cinquenta idosos. Claribel desceu pela trilha diante de sua casa. Tinha em mãos duas cestas com frutas, pães, leite e sopa que sua mãe fazia todo fim de semana para os velhinhos do asilo. Como era uma população pequena, não havia muitos mendigos, havia um terço de pessoas com sessenta anos ou mais e uma pequena parcela necessitava de caridade, por sorte haviam pessoas como Claribel e sua mãe Maribel Halina.

      Claribel Halina estava com dezesseis  anos de idade, moça de estatura média, cabelos e olhos negros, morena simpática. Linda como a mãe. Todos que a conheciam gostavam dela e faziam questão de dizer que era uma boa garota. Desde a morte de seu pai, quando ela tinha apenas treze anos de idade, vivia com sua mãe, dois gatos chamados Xena e Chaneco e um cachorro de nome Bob. Amava sua vida, seus animais e as árvores, vivera ali desde seu nascimento cercada de árvores. Era costume de Claribel ir todo final de semana ao asilo levar comida para os velhinhos pois a prefeitura não dava muita atenção para eles. Havia duas rotas que davam acesso ao seu destino final que era o asilo. Pela Rua das Macieiras ou pelo Conjunto das Oiticicas, sua mãe sempre gritava quando ela tocava a aldraba:

      - Claribel, vá pela Rua das Macieiras.

      - Sim, mamãe  - era a resposta.

      Maribel sabia que nos últimos vinte anos cinco garotas de idades próximas a de sua filha foram brutalmente assasinadas nas proximidades do Conjunto das Oiticicas e ela tinha medo de que acontecesse algo com sua única filha. A jovem foi ao asilo e distribuiu o que tinha junto com sua simpatia e jovialidade retornando logo em seguida. Quando estava a poucos metros de sua casa viu um grande alvoroço de pessoas velando uma mulher, era sua mãe.

      - Mamãe! Mamãe! Mamãe! - gritava ela correndo em direção ao aglomerado que rodeava sua mãe desacordada.

      - Calma, calma Claribel - disse uma senhora que era vizinha dela.

      - O que houve com minha mãe? - perguntou a garota chorando e olhando sua mãe desmaiada.

      - Não sabemos ainda, mas ficará tudo bem.

      Uma pequena ambulância chegou, socorreram a mulher e disseram que seria necessário levá-la ao hospital da cidade vizinha pois era mais apropriado para a mulher. Claribel apreenseu-se e quis ir junto.

      - Quero ir com minha mãe.

      - Você é muito nova, não pode ser acompanhante.

      - Sou jovem mas responsável e não sou menor de idade.

      O enfermeiro olhou para a senhora que estava com ela e disse:

      - Tudo bem, lá perto ao hospital há uma casa que hospeda acompanhantes de enfermos.

      - Senhora Vivina, tome conta dos meus bichinhos, por favor!

      - Pode ficar tranquila. Eu e Gervino cuidaremos bem deles.

      A grande cidade de Olia ficava a cerca de 57 quilômetros de distância, uma longa estirada, o hospital em que o Dr.Simoni trabalhava recebia pessoas de todas as redondezas. O doutor diagnosticou Maribel, ela tinha tido um leve AVC e precisava ficar alguns dias no hospital sob observação e Claribel lá ficou com sua mãe, ela se revezava entre o hospital e a casa de acolhimento.

      No segundo dia ela se deparou com um homem aparentando uns 45 anos, ele não parava de olhá-la. Uma mulher que estava também na casa de acolhimento alertou a garota:

      - Minha jovem, esse prefeito é um cafajeste. Não fique perto dele. Entendeu?

      - Sim, obrigada - disse Claribel saindo em direção ao hospital e esbarrando em um senhor bem vestido que se desculpou e entrou na casa.

      - Senhor prefeito  - disse o homem bem vestido.

      - Guto Solto, detetive Ira, apenas Guto Solto.

      - Ora, ora! - exclamou o detetive Ira Menandro.

      - O que traz o detetive aqui a minha procura? Já não basta todo aquele interrogatório inútil?

      - Veremos se deveras é inútil - respondeu Ira educadamente.

      - Veremos. Mas não veio aqui apenas para falar isso, foi?

      - Não.

      - Então...

      - Conseguimos encontrar um de seus ex-seguranças ou capangas.

      - O que tenho com isso?

      - Esse ex-segurança ou capanga que prestou serviços ao senhor, Guto Solto, morreu, mas deixou escrito uma carta bem reveladora sobre os assassinatos e paradeiros dos corpos das cinco garotas. Ainda conseguirei lhe incrimar e colocar você no seu lugar.

      O prefeito Guto Solto ficou nervoso de imediato.

      - O que foi, Guto? Por acaso tem algo a esconder?

      - Não, nada. Há vinte anos tudo isso aconteceu e até hoje não encontraram nada. Como pode ter coragem de continuar acusando-me. Com licença, tenho que sair para resolver assuntos pendentes.

      Claribel revia sua mãe quando o Dr.Simoni entrou no quarto onde estavam e disse:

      - Ela está bem melhor, não se preocupe.

      - Obrigada doutor.

      - Não precisava agradecer assim, estou tão solitário.

      - O que disse?

      - Ah... quis dizer que... que...

      Enquanto o Dr.Simoni gaguejava escutou uma chamada para ele que então saiu sem terminar sua explicação. A garota dirigiu-se novamente para sua mãe e acariciou-a por longos minutos, naquele dia adormeceu lá até o dia seguinte. Quando ela despertou o Dr.Simoni já estava no quarto olhando-a de perto. Ela teve um susto.

      - Bom dia doutor! Que susto o senhor me deu.

      - Não foi minha intenção, querida. Tenho uma excelente novidade.

      - Ah, qual?

      - Foi apenas um susto que sua mãe teve também, ela está muito melhor. Ela está  a dormir assim devido a medicação.

      - Mas isso é normal?

      - Sim. Estou indo para Soutelo e levarei vocês.

      - Mas e o motorista?

      - Ele adoeceu e eu tenho permissão para dirigir a ambulância também, só depende de nós.

      - Tudo bem, irei pegar minhas coisas.

       Por sorte o detetive Ira Menandro e sua equipe haviam conseguido montar o quebra cabeça em forma de carta que o ex-segurança de Guto havia escrito antes de falecer. Os corpos haviam sido queimados e as cinzas foram enterradas no Conjunto das Oiticicas. A carta dizia também que um médico e não Guto era o assassino. O detetive lembrou-se imediatamente que ao ir encontrar Guto no hospital havia esbarrado em uma jovem bela e que tinha aproximadamente a mesma idade das vítimas do tal médico. Ele não pensou mais em nada a não ser em chegar no hospital novamente o mais rápido possível.

      Ao chegar na recepção perguntou:

      - O Dr.Simoni está aqui?

      - Não, saiu há alguns minutos.

      - Para onde?

      - Soutelo, senhor.

      Mas Simoni já estava longe, estava em torno de um quilômetro do Conjunto das Oiticicas, numa casa pequena que pertencia a um amigo, a casa estava vazia, ele convenceu a garota a ir com ele pegar uns medicamentos para a mãe dela.

      - Não tenha medo, querida, iremos pegar uns comprimidos essenciais para a recuperação de tua mãe.

      - Tudo bem - disse a garota claramente assustada.

       Entraram na casa, a porta rangeu de forma estridente, era uma casa bem simples.

       - Vamos, estão ali no quarto.

      - Pode ir o senhor, espero aqui.

      - Vamos, não tenha medo.

      - Não.

      - Vamos garota! Você veio até aqui para desistir assim? Pense em tua mãe.

      Claribel, inocente cedeu.

      - Isso, venha.

       A garota entrou no quarto bagunçado, o homem deixou ela tomar a frente dele e sacou um revólver apontando para a cabeça dela.

      - Boa garota, agora quero que deite-se sobre a cama, mas antes tire o vestido. Rápido!

      - Não farei isso - disse a jovem com uma voz trêmula e os olhos brilhando cheios de lágrimas que derramaram-se quando ela recebeu um tapa em seu rostinho.

      - Então eu tiro por você - disse o médico velho e doente tirando um bisturi do seu bolso - Isso é meu instrumento preferido, sabia? Também sou cirurgião.

      Cortou as alças do vestido de Claribel  e empurrou-a sobre a cama. Pegou o celular e fotografou-a deitada chorando vestida apenas com as roupas íntimas. Tirou o casaco e jogou do lado da garota. Sempre muito calmo, mas por um descuido apenas, a garota conseguiu ver e pegar um outro bisturi que se encontrava no bolso do casaco dele.

      - Agora nós iremos brincar um pouco e depois cortarei você bem aqui - falou apontando o dedo para a jugular - e em seguida levarei você para um lugar não muito distante daqui para queimá-lá e enterrá-la.

O homem começou a despir-se e justamente na hora em que ele tirava a blusa ela travou na região da cabeça e a menina deferiu um golpe no pescoço do médico velho.

- Socorro! Socorro! Socorro! - gritava ela.

- Sua estúpida - disse o velho pressionando o corte - como pôde fazer isso comigo? Eu cuidei de tua mãe.

- Você é louco, tenho nojo de você, monstro! Socorro! Socorro!

- Irei matá-la.

A garota sem ação diante do sangue que jorrava, pegou apenas o lençol e cobriu suas partes pueris. Já ele pegou o revólver, apontou para ela e disse:

- Não tem balas. Como você é burra, garota. A jugular é aqui - disse ele mostrando a região em que se localiza a jugular - seu corte foi muito superficial. Eu sou o assassino, eu e Guto. Mas sou melhor, nunca dou pistas do que faço, mas você conseguiu acabar com isso, mas não com minha vida - em seguida com o próprio bisturi cortou a sua jugular e caiu sangrando ainda mais.

Minutos depois o detetive e os policiais chegaram, encontraram Claribel sobre a cama enrolada com o lençol e muito assustada. Eles recolheram o celular e para surpresa de todos, estava no modo vídeo. Simoni iria gravar o estupro e quiçá a morte da garota, mas felizmente isso não aconteceu. Enfim não só o assassino mas ambos os criminosos tiveram um fim, um na prisão por ter sido cúmplice de Simoni nos outros crimes brutais contra as garotas assassinadas e o outro na sepultura comum da humanidade.

Claribel jamais foi a mesma, porém ela sempre buscou em Deus tudo o que lhe faltava, hoje, dez anos depois, ela tem uma bela casa noutra cidade e vive uma nova vida com sua mãe, sua filha Clarinda e seu marido Felisberto.

Leandro Ferreira Braga
Enviado por Leandro Ferreira Braga em 02/03/2018
Reeditado em 09/03/2018
Código do texto: T6269057
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