1987 (a hora chegou)

Chin Sang-Ki atendeu o telefone no segundo toque. Era exatamente quem ele esperava.

- Ele falou? - Perguntou a voz do outro lado. Seu superior hierárquico, Sok Yeong-Sik.

- Ainda não, senhor, mas vai falar. Vamos quebrá-lo hoje.

- Quebrar aí, só em sentido figurado, Sang-Ki... nada de deixar marcas; já andamos lidando com muitas queixas de violência policial.

- Sim senhor, sem marcas... já discuti o procedimento a ser aplicado neste caso com meu colega, Seung-Won.

- Sem marcas, mas quero resultados, Sang-Ki. Precisamos saber do paradeiro do agitador Kim Jae.

- Teremos resultados, senhor. Vamos começar imediatamente.

- Me ligue de volta, então.

- Sim, senhor!

Chin Sang-Ki colocou o fone no gancho. Do outro lado da sala, seu colega Ryo Seung-Won bateu a cinza do cigarro que estava fumando, no cinzeiro na mesinha de centro à sua frente.

- Era o chefe? - Indagou, colocando o cigarro no canto da boca.

- Ele mesmo. Avisou para não deixar marcas no garoto...

- Meio tarde para dizer isso... já levou uns tapas e uns apertões.

- Acho que estava se referindo a espancamento...

- Nesse caso, eu até concordo... a banheira será mais efetiva.

- É um bom método. Vamos começar?

- Podemos - retrucou Seung-Won erguendo-se.

* * *

O prisioneiro, amordaçado, pés atados, mãos amarradas atrás das costas, havia sido jogado no chão do banheiro, ao lado de uma banheira cheia d'água. Era um jovem na faixa dos 20 anos, vestido com calças jeans, tênis, camiseta branca e um agasalho esportivo grená, da prestigiosa universidade estatal onde estudava. Ergueu a cabeça quando a porta do aposento foi aberta, e arregalou os olhos de terror ao ver seus sequestradores entrarem.

- Muito bem, garoto. Vamos fazer um pequeno interrogatório agora - avisou Chin Sang-Ki, agachando-se ao lado dele. - Você já sabe a informação que queremos, portanto, não nos faça perder tempo. Eu vou retirar a mordaça, e sugiro que não grite, ou vamos lhe partir os dentes.

- Também não adianta chamar pela polícia... - riu sardonicamente Ryo. - Você já está na presença da lei.

A mordaça foi removida. O prisioneiro passou a língua pelos lábios ressecados.

- Vocês cometeram um engano... eu conheço Kim Jae, mas não faço a menor ideia donde ele está!

- Mas claro que sabe... - ciciou Ryo, cigarro no canto da boca. - Talvez precise apenas de um pequeno incentivo para lembrar.

Chin e Ryo agarraram o jovem pelos braços e o puseram de joelhos em frente à banheira. Enquanto Chin o segurava, Ryo empurrou brutalmente a cabeça do rapaz para dentro d'água, e o segurou ali por quase um minuto, enquanto ele se debatia. Finalmente, o puxaram de volta, arquejante.

- Eu não sei! Eu não sei! - Gritou ele.

- Vamos refrescar sua memória... - retrucou Ryo, empurrando-o novamente para dentro d'água.

A cena se repetiu cerca de meia dúzia de vezes, sempre com desfecho semelhante. Finalmente, Ryo perdeu a paciência e pressionou o pescoço do rapaz contra a borda da banheira, enquanto segurava sua cabeça debaixo d'água.

- Ei, calma... - alertou Chin.

O prisioneiro debateu-se com violência, estrebuchou, e finalmente ficou imóvel. Quando sua cabeça foi retirada da água, não reagiu.

- Diacho - sussurrou Ryo.

* * *

- Chefe? - Chin tentou aparentar tranquilidade ao telefone, embora estivesse com as mãos úmidas. - Tivemos um problema no interrogatório...

- Que espécie de problema?

- Bom... o prisioneiro não resistiu.

- O que aconteceu?

- Asfixia. Provavelmente.

- Que inferno. O pior é que a notícia da prisão dele já correu por toda Seul... vamos ter que inventar alguma coisa para dizer à imprensa.

- Meu colega sugeriu... parada cardíaca. Uma fatalidade. Pode acontecer até com pessoas jovens.

Dez longos segundos de silêncio se passaram até que o chefe se manifestasse.

- Está bem. Vamos vender essa ideia... parada cardíaca. Levem o corpo para o instituto de medicina legal, discretamente. Vou avisar aos legistas para prepararem um laudo de acordo...

E, subitamente lembrando-se de como a história começara:

- E sobre o paradeiro de Kim Jae, ele falou?

- Não, senhor - admitiu mortificado Chin Sang-Ki.

- Incompetentes - resmungou o chefe.

E terminou a ligação.

- [22-03-2018]