NÍVEL MÁXIMO

1

Quatro da manhã. Enquanto muitos dormem ou acordam para mais um dia de labuta, ele aguarda o momento certo de começar o que planejou a dias. Em meio a penumbra daquele corredor apertado, úmido e fedorento ele se espreme tentando manter sua respiração controlada.

Sidnei Lessa, esse é o seu nome, um sujeito magro, careca e de olhos azuis penetrantes. Sidnei olha para o relógio em seu pulso e depois para a joalheria que fica do outro lado da rua. No céu somente estrelas e nuvens. A brisa fria da madrugada ainda lhe causa um certo arrepio. Sidnei sente que está perdendo tempo e tudo o que ele quer são as joias e nada mais. A dias ele vem estudando aquela maldita loja e será hoje que ele sairá de lá um pouco mais rico.

O ladrão sai do beco. Olha para a rua e espera que um carro passe em alta velocidade não respeitando o sinal vermelho. Para não ser identificado ele coloca sua máscara e entra em outro beco estreito. Com muito cuidado ele verifica se há câmeras de segurança. Não há, caminho livre. Ele caminha até os fundos do beco onde há uma velha escada de ferro com seus degraus enferrujados. Sidnei é um homem magro, pesa no máximo 60 quilos. Sim, os degraus suportarão seu peso, por isso ele inicia a subida até seu objetivo, uma janela com sua armação de alumínio.

Último degrau, sua testa transpira por baixo da máscara. Altura nunca foi o forte de Sidnei. Pronto, resta apenas ele se esticar até alcançar o beiral da janela e ele estará lá dentro. O esforço é monstruoso, Sidnei sente os músculos de sua lombar se estendendo ao máximo. Sua mão consegue segurar em algo firme o suficiente para sustentar seu corpo. Tremendo ele se dependura no beiral até pegar impulso para ficar de pé nele.

- Ufa!

Sidnei abre a janela. Olha para baixo e sente uma leve tonteira. Sem maiores dificuldades ele entra. O lugar é uma espécie de refeitório. O cheiro de assepsia faz suas narinas arderem. Tudo está em silêncio. Estranhamente Sidnei sente medo. O lugar é amplo com mesas e cadeiras organizadas. Ele anda no escuro. O ladrão não gosta de lanternas. Uma porta, entre aberta, melhor ter cuidado. Ele passa por ela e se depara com um corredor. Mais escuro ainda, melhor encarar, as joias merecem o esforço. No final do corredor mais uma porta, uma única porta. Seu coração manda um alerta. A mão com luva segura na maçaneta e a gira. Um estalido anuncia sua abertura. Sidnei olha lá dentro e tudo está vazio, hora de começar a trabalhar.

A sala é pequena, Sidnei imagina ser o lugar onde os funcionários descansam depois do almoço, será por ali que ele ganhará a loja. Devido a escuridão ele demora um pouco a ver um tipo de portinhola que fica atrás do sofá. Vamos lá, hora de se apertar um pouco. Ele vai entrando e o cheiro de urina de rato vem ao seu encontro.

- Droga.

Mais um pouco e ele estará dentro da joalheria. Mais dois quilos e Sidnei não conseguiria passar por ali. Pronto, enfim a loja. Cansado, com o corpo doendo mas feliz, Sidnei contempla a joalheria. Realmente é bonita, mesmo no escuro. A três dias ele esteve ali observando cada canto, cada detalhe. Sem se importar com as câmeras ele passa pelo salão em busca da sacola. Ele passa por uma e dá o dedo do meio para ela. Jamais os policiais descobrirão sua identidade, jamais. Por fim a sacola preta no canto perto do banheiro para funcionários, mas antes vale fazer mais uma observação. Sidnei vai até a caixa de disjuntores e desliga toda a energia da loja. Ele anda até o salão e começa a retirar as peças e sem cerimônias ele as lança dentro da sacola. Lindas, cada uma mais bonita que a outra, todas agora pertencem a ele.

Cinco minutos depois Sidnei se encontra saindo pelo mesmo buraco pelo qual entrou. Ali mesmo no beco ele troca de roupas. Calça jeans, camisa polo, boné e a sacola pendurada pelos ombros. Sim, está um pouco pesada, mas nada que um táxi não resolva. Sidnei está com sorte, assim que saiu do beco passou um e mais que rápido ele assovia.

- Bom dia meu jovem. - diz o taxista, um sujeito já idoso. - para onde?

- Para o centro, por favor.

2

Pela manhã a joalheria está cheia, não de clientes, mas sim de policiais e peritos. Um agente vestido com um blazer preto sem gravata observa atentamente as imagens das câmeras de segurança ao lado do proprietário. Cabelos cortados a máquina, barba grande e pele parda, Paulo Alves só aguarda o momento para confirmar o que ele já suspeitava.

- Viu, sabia que era ele, filha da mãe. - cruza os braços.

- O que vai ser daqui pra frente detetive? - pergunta o dono da joalheria. - o meu prejuízo já ultrapassa dois milhões.

- Ele é escorregadio, mas um dia ele vai dar um mole, confie no trabalho da polícia senhor Lair.

*

Sidnei volta para a cidade um pouco mais rico. Na mesma sacola uma boa soma em dinheiro vivo pela venda das joias no mercado negro. Dentro do táxi ele sorrir olhando a paisagem. Até que o trabalho como ladrão profissional não é tão ruim. Um pouco mais rico, um pouco mais soberbo. Ele abre a sacola e lá está o fruto de seu esforço, notas de cinquenta e de cem, novinhas, ele rir alto causando estranheza ao motorista.

- Não liga não meu chefe, sou estranho assim mesmo.

O táxi passa em frente a joalheria. Foi preciso Lessa colocar a mão na boca para não soltar sua diabólica gargalhada. Lá está ela cheia de agentes se acotovelando e uma fita amarela restringindo a entrada. Que cena gloriosa. Valeu a pena todo o esforço. Sidnei Lessa, filho de Dirceu Lessa, o velho teria orgulho dele? Ele acha que sim. Vamos em frente o dia só esta começando. Fim.

Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 26/06/2018
Código do texto: T6374793
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