Bárbara Castro - Pela Lei | Capítulo 2

O café até que estava bom. Pra falar a verdade foi o melhor café já experimentado por Karina e olha que ela se encontra num departamento policial. Bárbara a aguardou a se recompor de sua crise de choro imaginando tamanho sofrimento e pressão vivida por ela nas últimas horas. Castro também pode perceber o seu envelhecimento. Karina tem apenas vinte cinco anos, porém seu semblante no momento a faz parecer ter o dobro disso. Relacionamentos tóxicos são mesmo catastróficos para qualquer ser humano.

— Melhor agora? — Bárbara voltou a abrir seu bloco de anotações.

— Sim! Podemos prosseguir.

— Você estava me dizendo que leu algumas mensagens no WhatsApp dele. Com quem ele falava?

Foi preciso um esforço sobrenatural para lembrar, mas Karina conseguiu.

— Suíço! Cláudio falava com um tal de Suíço no zap.

— Vou checar sobre esse Suíço, talvez ele já tenha ficha na polícia.

— Meu Deus! No que Cláudio vem se metendo. Minha mãe e eu precisamos de proteção Investigadora Bárbara. Por favor.

— Sim, claro. Vou providenciar, mas enquanto isso haja com naturalidade se ele voltar.

Karina limpou o rosto, suas mãos estavam suadas e trêmulas.

— A senhora acha que ele vai voltar?

— Difícil! Cláudio é do tipo covardão. Ameaçou e caiu fora. Mas de qualquer forma providenciarei proteção vinte quatro horas para vocês.

Karina respirou aliviada.

*

Cláudio voltava da cozinha com mais duas latas de cerveja e salgadinhos. Na TV o filme pausado o aguardava. Pensando em ter ouvido barulho de motor de carro, o namorado de Karina afastou devagar a cortina da janela e suas suspeitas se confirmaram.

— Mas que merda é essa? — murmurou vendo uma morena clara descer de um Logan marrom metálico.

Bárbara Castro tocou a campainha e aguardou. Enquanto isso ela voltou a pensar em Isaque e em seu rendimento na escola. Desde sempre o menino tinha em seus boletins notas que superavam a média e desde quando Alex e ela decidiram se separar suas notas vem despencando ladeira abaixo até mesmo em matérias das quais ele adora como história. A policial até já havia pensado na possibilidade de contratação de uma explicadora, mas Alex, pra variar foi contra, segundo ele Isaque já tem idade o suficiente para aprender a se virar sozinho.

— Pois não? — Cláudio apareceu com seu sorriso enviesado.

— Como vai? Sou Bárbara Castro, Investigadora, podemos conversar lá dentro?

O rapaz voltou a olhar para ela, porém agora com muito mais desconfiança do que antes, Investigadora?

— Conversar, sobre o quê?

— Karina Lopes, sua namoradinha.

— O que tem a Karina? — cruzou os braços.

— Podemos conversar com mais calma lá dentro ou não? — Bárbara estava começando a perder a paciência.

Só me faltava essa. Cláudio voltou a sorrir de nervoso.

— Tudo bem, Investigadora, só não repare a bagunça, sabe como é casa de homem solteiro né?

Até que não estava tão mal assim. Na sala poucos móveis, um sofá-cama novo em folha, uma TV enorme cuidadosamente fixada na parede e um quadro a óleo de Elvis Presley.

— Eu mandei pinta-lo. Gostou? — disse Cláudio ajeitou os travesseiros.

— Nada mal.

— A senhora quer alguma coisa, café, suco, cerveja...

— Quero saber o que andou fazendo com Karina Lopes.

Cláudio arqueou às sobrancelhas e coçou a cabeça.

— Nada de mais. Briguinha de casal, sabe como é, confesso que passei do ponto e... Eu a amo e estou arrependido.

— Você pensa em voltar para pedir desculpas?

Ele fez outra leitura da postura da policial. Seria ela uma reconciliadora?

— Não sei.

— Muito bem! Melhor seria se você mantivesse a distância, pelo menos por enquanto, certo?

— Tá! legal. — enterrou às mãos nos bolsos. — então, detetive Bárbara, posso ajudá-la em algo mais?

— Na verdade, sim. Você trabalha com o que, já terminou a faculdade?

Cláudio pareceu meio que desconsertado com a pergunta. O sonho de seu pai era que ele ingressasse na faculdade de administração para seguir gerenciando os negócios da família, porém Cláudio esteve na universidade para somente se matricular e nunca mais apareceu por lá.

— Eu no momento trabalho com vendas online.

— O que vende pela internet?

Agora Cláudio estava se sentindo acuado e precisou ser rápido.

— Possuo um sexshop virtual, tenho todo tipo de “brinquedinhos” para apimentar a relação. Quer dar uma olhada? Tenho material em estoque...

Bárbara meneou a cabeça se negando.

— É casada, Investigadora?

Novamente o rapaz pode reparar no baita corpo da policial e no quanto ela é atraente.

— Divorciada. — respondeu friamente. — algo que queira saber mais sobre minha vida, senhor Cláudio Barbosa?

Suas bochechas ficaram coradas.

— Acho que terminamos aqui. Siga meu conselho, fique longe de Karina e também de encrencas, combinado? — falou se dirigindo a saída.

— Tudo bem. — tirou às mãos dos bolsos e cruzou os braços.

— E pare de ficar olhando para minha bunda. — passou pela porta.

Bastante esperta essa Ivete Sangalo do subúrbio, pensou ainda olhando para Bárbara indo embora.

*

Fora três duras horas de treinamento de arremesso ao som estridente do apito do técnico. Por ser o melhor jogador, Robson é o mais cobrado e também o que mais cobra em quadra. O dia da final do torneio regional está se aproximando e erros não serão permitidos. Para não tirar o foco do namorado, Bárbara se espremeu entre uma cadeira e outra e aproveitou o tempo para repassar mentalmente tudo o que aconteceu na casa de Cláudio Barbosa.

— Valeu rapaziada, hoje o treino rendeu bastante. Façam um círculo aqui. — vociferou o treinador. — prestem atenção. Eu quero ganhar esse torneio e para isso conto com cada um de vocês então, nada de abrir concessões, não quebrem a dieta, nada de álcool ou abram mão do descanso. Às 22 horas quero todos na cama dormindo, amanhã teremos treino cedo, entenderam?

Sim! Disseram todos aos gritos.

— Ótimo. Vão todos pro chuveiro. — aplaudiu.

Já com cãibras devido a péssima posição em que se encontrava, Bárbara pode se acomodar melhor e acenar para Robson que gesticulou a pedindo que aguardasse. Sabendo que seu namorado demoraria uns vinte minutos no banho ela aproveitou para ligar para o departamento pedindo um levantamento sobre Cláudio.

— Ele já é fichado, na verdade, duas vezes por agressão. — informou o policial do outro lado da linha.

— Imprima e as deixe em minha mesa, devo estar chegando aí em uma hora. Obrigada.

Primeiro ele abriu a camisa dela lentamente. Minutos depois abaixou uma das alças do sutiã e quando o clima já havia esquentado o suficiente, Robson Mota imaginou os berros de seu treinador no dia da final do torneio.

— Ah! droga. — choramingou.

— O que foi? — Bárbara parou os movimentos em seu colo.

— Tenho que poupar energia, sexo e treino não combinam mesmo.

Aos risos a detetive subiu a alça do sutiã e saiu de cima do namorado.

— Tadinho dele gente. — o acariciou no rosto.

— E o que eu faço com a minha ereção, meu Deus? — esfregou o rosto.

— A culpa é minha. Eu não tinha nada que aparecer lá no ginásio. — vestiu a camisa.

— Ah! para, eu curti muito. — a beijou. — e aí, como foi com o Alex?

— O mesmo de sempre, mas pelo menos um ponto positivo houve.

— Qual?

— Deixei a mãe dele fora da história.

Ambos riram.

*

Bárbara ocupou sua mesa um pouco mais cansada e em contrapartida bem mais confiante. Aqueles minutinhos com Robson em sua casa lhe serviram de válvula de escape, só Deus e ela sabem o quanto esse encontro fora necessário. Após inspirar e expirar profundamente algumas vezes a Investigadora passou a mexer nos documentos imprimidos e deixados ali como havia pedido.

— Cláudio Barbosa. — falou olhando para a foto anexada.

Há mais ou menos dois anos, Cláudio se envolveu numa discussão de trânsito. Recebeu uma fechada de um idoso que não havia prestado atenção perdendo a entrada. Conclusão: Cláudio o perseguiu por quase um quilômetro até conseguir para-lo e mesmo com os insistentes pedidos de desculpas do velho, o rapaz o acertou duas vezes no rosto com socos. A pobre esposa do senhor agredido por pouco não sofreu um ataque do coração ao ver seu companheiro de anos esvaindo em sangue. Dias depois, representado por um advogado, Cláudio Barbosa se apresentou a polícia. Foi Obrigado a pagar uma indenização ao idoso e pronto.

— Essa justiça brasileira é uma mãe mesmo. — declarou se apossando do outro documento.

Cláudio curtia com amigos o aniversário de um deles numa casa noturna. Todos já haviam bebido muito quando uma não muito famigerada banda de rock subiu no palco enlouquecendo a jovem massa ali presente. Claro que isso não iria terminar bem. Sem querer ou não, Cláudio recebeu uma cotovelada que lhe abriu o supercílio esquerdo o deixando tonto. O caldeirão ferveu e ferveu muito. Os amigos de Cláudio identificaram o rapaz e o apontaram. O namorado de Karina sempre foi robusto, grande e fã de uma violência gratuita então o franzino garoto foi um prato cheio para um sujeito como ele. Mesmo já tendo o nocauteado Cláudio seguia com as agressões e só parou com a chegada da segurança local.

— Meu Deus! o que um animal desse faz fora da jaula?

Bárbara ao terminar de analisar os documentos estavam ainda mais preocupada com a integridade física de Karina e de sua mãe, Cláudio Barbosa é perigoso e capaz de qualquer coisa. Ele vai voltar a procurar por ela, pensou levantando-se e se dirigindo ao corredor que dá acesso à sala de Dantas.

— Pode entrar, investigadora. — sinalizou para ela.

— Chefe, preciso de uma viatura na residência de Karina Lopes com urgência.

— O que houve? — tirou os óculos.

— Esse Cláudio Barbosa é perigoso, eu tenho certeza de que ele ainda vai tentar algo contra essa garota.

— Positivo! Tem minha autorização. Mais alguma coisa?

— Eu acabei de checar a ficha de Cláudio e me veio a mente a conversa que tive com Karina. Ela tocou em outro nome: Suíço. Sabe quem é?

Emanuel se recostou na cadeira e por um instante ele fez uma viagem no tempo. Enquanto aguardava sua volta, Bárbara ficou a admirar sua beleza.

— Esse cara está metido em confusão e das grandes. Precisamos arrancar informações mais contundentes dele.

— Sugiro uma investigação mais próxima, ficar no pé dele mesmo.

Dantas coçou o queixo.

— Faça o que for preciso. Esse nome Suíço me cheira peixe dos grandes. Vou averiguar assim que puder.

— Obrigada, senhor.

*

Em sua idade tenra Bárbara sonhava em confeccionar os mais lindos vestidos dignos das princesas da Disney. Quantos foram os puxões de orelhas dados por sua mãe pelo simples fato de desenha-los nas folhas dos cadernos da escola até que seu saudoso pai teve uma iluminação. Aos dez anos a pequena Bárbara Castro entrou para o curso de desenho artístico e lá permaneceu somente por um ano. Resultado: novos puxões de orelha.

— Você já é uma mocinha, Bárbara, precisa decidir o que quer fazer da vida. — disse seu pai voltando com ela para casa.

Ser uma policial não estava nos planos, as coisas foram acontecendo sem ela perceber. Antes de ingressar nas forças auxiliares Bárbara trabalhava como vendedora numa loja de sapatos e não gostava do que fazia. Muito trabalho, patrão pegando no pé, metas a serem alcançadas e o salário digno de pena.

A vida é assim, se fazemos por merecer ela nos recompensará. Bárbara parou o carro perto da entrada da rua onde Cláudio mora e a partir desse ponto ela precisa estar invisível aos seus olhos. Ainda no carro ele pegou seu bloco e anotou os nomes Cláudio e Suíço. Ao lado do ex namorado de Karina ela escreveu agressor e do suposto contato dele um ponto de interrogação. O bloco voltou para o seu lugar de origem, dentro do porta luvas. Decidida a seguir os passos de seu suspeito, Castro desligou o motor do veículo e relaxou. A paciência é uma de suas principais virtudes.

Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 05/08/2023
Código do texto: T7853739
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