Bárbara Castro | Pela Lei - Final

Isaque joga seu videogame sozinho sentado de qualquer jeito em cima do pufe enquanto Alex segue revisando o material que lecionará na faculdade. A TV está alta e apesar de seus pedidos para que o volume seja diminuído o garoto parece não se importar nem um pouco com isso.

— Filhão, por favor, o papai está trabalhando, diminui o volume do jogo.

— Mas, pai, a música do jogo me deixa motivado.

— Tudo bem, eu também curto essa música só que, agora ela está me atrapalhando.

Contrariado, Isaque pegou o controle remoto e mutou ou invés de diminuir.

— Isaque, vamos deixar às coisas bem claras aqui. — fechou a pasta e andou até a sala. — para morar aqui é preciso seguir às regras, você entendeu? Apronta-me mais uma dessa e você volta imediatamente para a casa da sua mãe.

O garoto abandonou o joystick branco cruzando os braços em sinal de protesto.

— Ótimo! — Alex pegou o controle remoto desligando a TV. — está de castigo. Vá para o quarto e só saia de lá quando eu mandar.

Alex voltou para os seus afazeres se odiando por ter finalmente assumido uma postura de pai rigoroso. Como ele bem falou para Bárbara, é apenas uma fase. Independente disso, filhos necessitam de limites e precisam sofrer às consequências caso ultrapasse esses limites. Na verdade, Alex não vê a hora de Isaque pedi-lo para voltar para casa da mãe.

*

Dantas deixou a sala de interrogatório com a faca e o queijo na mão como dizem os mais antigos. Como era esperado, o porteiro abriu o bico e ao saber da morte de Cláudio Barbosa o funcionário do condomínio e informante de Suíço pensou melhor e declarou que estando preso seria melhor para ele.

O delegado andou pelo corredor de forma moderada analisando a papelada seguindo para sua sala onde Bárbara Castro e outros agentes aguardam ansiosos.

— É o seguinte pessoal, o cara deu com a língua nos dentes e o que é melhor, nem foi preciso fazer tanta força.

— Já não se faz criminosos como antigamente. — Bárbara tinha o olho roxo e inchado.

— Suíço está para receber uma carga de cocaína vinda da Bolívia. Não sabemos a quantidade, mas deduz ser algo grande uma vez que Márcio Braga pretende se estabelecer como o “ The Boss” do crime.

— Sabemos o dia e horário da entrega, chefe? — perguntou Moura.

— Não, mas você é o homem certo para esse serviço. — Dantas ocupou sua cadeira. — e você, Sampaio, quero que fique de olho no condomínio, quero saber quem entra, quem sai, entregas de comida, supermercado, tudo, você me entendeu?

— Pode deixar comigo.

Emanuel e Bárbara trocaram olhares.

— Como está esse olho?

— Ainda consigo enxergar com ele.

— Ótimo! Vá ao sepultamento e tenta conversar com a namoradinha do falecido. Dispensados.

— Não sei ao certo se Karina Lopes comparecerá ao cemitério. — se levantou.

— Lembre-se, Castro: vê é sempre melhor do que não vê.

*

“A juventude é desperdiçada no jovem” já dizia Caio Fabio. Cláudio Barbosa, um rapaz bonito, de boa família, com um futuro promissor o aguardando, infelizmente deu preferência ao lado obscuro e agora seu corpo é conduzido dentro de uma urna. Seus pais e irmãos caminham lado a lado e lamentam aos prantos assim como seus amigos de farra. Cláudio não foi o primeiro e não será o último a ter a curta vida interrompida por suas escolhas errôneas. Bárbara Castro acompanha de longe o cortejo tendo os ouvidos invadidos por lamentos e protestos de todos os tipos. O pessoal da imprensa ao reconhecê-la tiraram o seu foco da pequena multidão que seguia rumo ao jazigo perpétuo da família Barbosa girando os seus canhões em direção a beldade policial. Castro pigarreou algumas vezes antes da chegada do primeiro jornalista.

— Como vai investigadora Bárbara. É verdade que o jovem Cláudio Barbosa foi executado pelo cartel de drogas do Suíço?

Ainda embasbacada com a pergunta, Bárbara respondeu de forma condescendente.

— Cartel pode ser um exagero. Asseguro-lhe que estamos trabalhando bastante nisso.

— Então, a senhora confirma haver um grupo criminoso agindo na cidade e que Suíço é o líder?

De repente a policial se viu rodeada de jornalistas, todos com seus microfones, gravadores e celulares apontados para ela. Estranhamente uma timidez a abateu.

— Digamos que há uma tentativa de retomada de “poder” porém o departamento de polícia vem combatendo às ações ainda no nascedouro.

Bárbara era açoitada com perguntas capciosas quando seus olhos avistaram Karina Lopes entrando no cemitério. Ela ainda respondia uma pergunta maldosa quando abandonou o repórter falando sozinho.

— Oi! Karina, posso falar com você um minuto?

Visivelmente abatida, Karina parou a caminhada.

— Sim!

— Sinto muito pelo Cláudio.

— Não sinta, detetive. Infelizmente Cláudio fez a escolha dele. E desde já devo confessar que ele esteve lá em casa no dia de seu assassinato.

— Sobre o que conversaram? — Bárbara estava começando a se irritar.

— Foi uma despedida. Ele me pediu perdão e...

Agora Castro cruzou os braços.

— Há! Que se dane. Vou falar tudo. Cláudio estava negociando a empresa do pai para lavar dinheiro do tráfico.

— Mais alguma coisa?

Karina enxugou às lágrimas que começaram a brotar e depois olhou para os pais de Cláudio voltando do sepultamento. A paciência de Bárbara começara a desaparecer.

— Antes de ir embora, ele me disse que o Suíço comprou com o dinheiro que o Cláudio roubou da empresa do pai uma boa quantidade de drogas e que será entregue amanhã no rio São Paulo se eu não estiver enganada.

Agora Bárbara sentia uma onda de adrenalina percorrer seu corpo tamanha era sua excitação. Ela sacou o celular se afastando de Karina e a agradecendo pela rica informação.

— Moura!

— Pode falar, Castro.

— Acabei de ser informada que, a carga será entregue amanhã no rio São Paulo.

— Que merda, hein. Precisamos nos apressar então.

— Estou voltando para o departamento. Dantas precisa saber disso. Ligue para o Sampaio. Nós vemos em meia hora na sala do chefe.

— Copiado.

*

Uma van preta em alta velocidade saiu da via principal para encarar os trinta minutos de estrada de barro e cascalho. Em seu interior cerca de dez homens armados com fuzil e pistolas conversam entre si, acertando os últimos detalhes do trabalho. Entre eles encontra-se Suíço tendo a seu lado o seu cão de guarda revendo os pontos importantes da negociação com os bolivianos.

— O lance é o seguinte, Márcio, não podemos ultrapassar dez minutos, isso é de extrema importância.

— E quanto a eles, você coloca sua mesmo no fogo? — Suíço perguntou.

Braddock é um ex militar da marinha que por anos arriscou sua vida em missões longas e complexas honrando às cores do país no exterior. Conseguiu até uma certa fama por ser bom estrategista e melhor ainda no confronto mano a mano. Hoje, próximo de completar setenta anos, ganha a vida emprestando seus bons serviços a chefões do tráfico como matador e guarda-costas.

— Isso é lá pergunta que se faça a mim? — Braddock retirou seus óculos de leitura. — posso garantir que estamos negociando com gente séria.

— Relaxa! Só quero me assegurar que nada dará errado.

— Mudando de assunto. E quanto ao meu pagamento pela morte do playboy?

A expressão de Márcio se tornou sombria, porém não foi o suficiente para intimidar o velho matador.

— Terá sua grana ainda hoje. O que pensa que sou?

— Não estou pensando em nada. Trato é trato. Eu cumpri com o meu e agora cabe você cumprir com o seu.

Agora a van tomou outro caminho por dentro da mata onde dentro de poucos minutos estarão no lugar combinado. Suíço e Braddock seguem com a resenha sobre os acertos pendentes.

— Estamos chegando. Vou descer primeiro. Me certificarei se é seguro o bastante, só então lhe darei o sinal, estamos entendidos?

Suíço assentiu.

Lá está ele, o rio São Paulo, recebeu esse nome em homenagem ao personagem bíblico que mais contribuiu para a propagação do evangelho.

— Lá estão eles. — disse Braddock. — deixe a van com o motor ligado. Vou descer.

Perto da pequena embarcação haviam dois sujeitos portando fuzis e logo de cara o cão de guarda de Suíço reconheceu o terceiro que se encontrava de pé tragando seu cigarro de maconha em cima do barco de pesca.

— Está atrasado. — falou com seu sotaque boliviano.

— Não seja dramático. — Braddock cumprimentou os seguranças. — posso ver o material?

— Posso ver o dinheiro?

Braddock inspirou profundamente.

— Vamos logo com isso, temos pouco tempo.

O boliviano jogou a binga na água e autorizou a subida do idoso. Tudo em ordem. Toda a droga foi cuidadosamente embalada e armazenada em caixas de papelão. Com um sorriso de satisfação Braddock sinalizou para a van. Nesse momento, os dois homens que faziam a segurança da embarcação foram abatidos com tiros precisos na cabeça. Braddock sacou sua pistola e apontou para o boliviano.

— Que merda é essa, você nos atraiu para uma armadilha seu desgraçado.

O traficante teve o crânio estourado pela arma do cão de guarda. Imediatamente ele correu para dentro do barco alertando aos demais companheiros.

— A polícia tá na área, saiam daqui.

A van manobrou levantando poeira sentido mata. Dentro, Suíço dita palavras de combate aos seus comandados.

— Abram fogo contra esses vermes.

Braddock se preparava para pular no rio quando das águas turvas surgiu um agente da polícia com trajes de mergulhador segurando um rifle numa proteção de plástico.

— Solte a arma.

— Vai pro inferno. — gritou Braddock apontando para o policial.

Não restando alternativas, o policial disparou duas vezes contra o peito do ex marinheiro que caiu morto em cima das caixas.

O motorista da van pisa fundo no acelerador ao som grave da voz do chefe apavorado só em pensar na possibilidade de ir para cadeia.

— Isso não pode estar acontecendo comigo... — vociferou.

Um dos pneus foi atingido deixando o veículo sem controle até se colidir contra uma árvore. O motorista bateu forte a cabeça no volante e apagou. Do meio do mato alto brotaram dezenas de homens com uniformes camuflados.

— Joguem às armas pela janela.

Com a batida Suíço teve uma lesão no ombro. A dor o castigava sem piedade. O restante do bando aguardava suas ordens.

— Perdi! — berrou.

Uma a uma as armas foram sendo jogadas pelas janelas da van. Em seguida Márcio Braga e seu grupo, sem esboçar qualquer resistência deixaram o veículo, menos o motorista que ainda se encontrava sem consciência.

— Suíço, você está preso.

*

De volta ao rio, Dantas e Castro pularam para dentro do barco. O corpo do velho Braddock jazia em meio a cocaína.

— Então, esse era o Braddock? — Bárbara acocorou-se.

— Pois é. Um militar aposentado que prestava serviços para a bandidagem. Estava no nosso radar fazia um tempo.

— Quanto acha que tem aqui? — perguntou referindo-se ao material apreendido.

— Nada muito grande, mas o suficiente para fazer um estrago. Parabéns, Bárbara.

Dantas foi solicitado pelo rádio.

— Dantas na escuta.

— Suíço encontra-se sob nossa custódia.

— Positivo, me deslocando para o local. — guardou o rádio no compartimento do colete. — ouviu? Vamos lá.

*

Bárbara Castro já esteve outras vezes num ginásio assistindo a jogos de basquete prestigiando não só a Robson como também a equipe a qual ele defende as cores. Mas, a cada ida é uma sensação diferente, ainda mais quando se trata de uma final onde às expectativas na equipe de seu namorado são gigantescas. Embora seu coração esteja apertado devido à falta do filho ali com ela naquele momento, a detetive, por outro lado está em paz. Desarticular uma quadrilha apreendendo um volume considerável de cocaína é um golaço digno de placa, um serviço absurdo a sociedade. E diga-se de passagem, Bárbara fez questão de se produzir para essa final do torneio regional, não há um só homem que não pare para admira-la.

A cada ponto somado e principalmente os que Robson Mota confere são comemorados a plenos pulmões.

— Vai, amor! — gritou.

Faltando poucos minutos para o final da partida e com a taça embaixo do braço praticamente, Robson decidiu dar seu show voando em quadra consagrando-se o cestinha da final. Cronômetro zerado. Fim de partida. Todo o ginásio veio a baixo com Mota e sua turma.

Nessa mesma noite Bárbara e Robson fizeram amor como nunca fizeram antes. Após um jantar esplendido juntamente com os companheiros de equipe, o casal correu para o quarto da casa da policial e ali deixaram extravasar todo o desejo represado.

— Uau! — Robson transpirava sem fôlego. — que noite foi essa?

— Noite das conquistas. — Bárbara rolou para o outro lado da cama.

— Graças a Deus! O treinador nos deu o restante da semana de folga. O campeonato nacional já bate a porta.

— Ah! Sério que vamos ficar um tempão sem transar?

— E olha que o campeonato nacional é um pouco mais extenso.

Castro voltou a subir no colo do namorado.

— Então vamos aproveitar enquanto podemos. Segundo tempo aí vamos nós.

*

Alex buzinou outra vez olhando para Isaque pelo retrovisor. O garoto parecia feliz e ele mais ainda. Bárbara apareceu no portão e sua alegria era ainda maior que a dos dois juntos.

— Mãe! — desceu do carro e a abraçou.

— Oi, filho. — o beijou na cabeça.

— Vou pro meu quarto jogar. — entrou correndo.

O professor saiu do carro e se apoiou no teto do veículo sorrindo.

— Eu falei que era só uma fase.

— Deu tudo certo? — cruzou os braços.

— Tudo em ordem, senhora. — prestou continência.

— Ótimo!

— Então está tudo certo. Eu já vou indo.

— Não quer entrar e tomar um café? Acabei de fazer.

— Adoraria, mas tenho que aplicar prova na faculdade, fica para próxima.

Bárbara e Alex o que deu de errado entre ele? Alex voltou para o interior do carro com o coração explodindo de sentimentos que maltratam bastante. Bárbara se encaminhava para o portão quando seu ex marido a chamou. Ela inclinou-se na janela do carona.

— Oi?

— Você está cada dia mais linda, Barbarete.

Castro até pensou em lhe dar um fora, mas o que saiu de sua boca foi um bálsamo para o coração dele.

— Você também, Leleco.

FIM.

Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 27/08/2023
Código do texto: T7871223
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