Mamy,

Então, espero que ai debaixo das ervas estejas muito bem acomodada, porque esta tua filha aqui está muito chateada.

Olha sonhei que andava nos bombeiros e que os outros bombeiros só andavam lá no engate, talvez apaixonados, vê só que diziam que eu estava quente, a arder (como se fosse possível) e molhavam-me toda. Eu sei da minha beleza, mas nada de exageros.

Vê só que eu moro em casa, e se o cão não me tem mordido eu tinha ido viver para a casota dele, coitado do bicho, desde ontem que dorme, sossegadito e começa a deitar um cheiro algo esquisito.

Mas ao mesmo tempo achei aquilo complicado de entrar, porque ficava só com a cabeça lá dentro e o rabo virado para o ar, o caniche mordeu-me porque queria deitar-se, tadinho...

Ai minha mamy querida, os meus colegas na escola adoram-me e passam a vida a rir de cada vez que abro a boca. Sou muito faladora e devo ter uma capacidade de dizer piadas que põem-se todos a rir. É preciso ter o olho bem aberto porque há alguns que gostam de mandar coisas, miúdos, andam sempre apaixonados... vê só que me compararam a uma troglodita, há gente mesmo romântica! É a minha beleza estonteante!

Já viste, afinal na cidade dizem-nos coisas profundas e a gente agradece para não ficarmos mal vistas.

E acreditas ando encantada com o professor de Filosofia, o Belejo, que me deita uns olhinhos de carneiro mal morto e cheiro a vinho da tasca do ti Zé que me deixam toda excitada. Ai que é o homem dos meus sonhos!

Ah mas tive um colega que me mandou uns piropos, chamou-me de grunha, e aquilo teve cá uma melodia... mas tive que gozar com o miúdo, que deve gostar de mulheres mais experientes, daquelas que desmamam crianças, tão ingénuo coitado. E o que mais estranho é que ele deitou-se no chão assim que me aproximei e ficou ali quietinho, sem dizer ai ou ui, está cansado ainda apesar da cor arroxeada.

Espero, mamy, que gostes da tua unica e preferida filha e que estejas melhor da tua cegueira para leres esta carta. E acredita que fiquei em ponto de rebuçado quando confessaste que me atiravas para o primeiro asilo que encontrasses. Já viste? Cá se fazem, cá se pagam e agora estás tu no asilo minha ingrata. Espero que o olho azul escuro que te ofereci esteja mais rosadito, mas se quiseres ponho-te azul escuro de novo. Mas ao menos reaje! Arre!

Olha mamy vou acabar pois está aqui um senhor que aparece em jornais baratos a convidar-me para uma sessão com a câmara escondida.

Espero que estejas bem e que a campa para onde vais morar tenha sido bem tratada pelo coveiro, o Sr. Fodê Seidi, negro como a noite. Buuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu...

Com grunhos amorosos,

Jaquina Biruta Sangacho
Manuel Marques
Enviado por Manuel Marques em 29/08/2009
Código do texto: T1780767
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