Beleza Roubada

Tiago e Márcio caminhavam lentamente, analisando o riacho a procura de um lugar para sentar e pescar.

Seguiram por campos um tanto distante, que não visitavam com frequencia, e encontraram uma clareira fresca, que serviria muito bem ao interesse deles.

Márcio começou a preparar as varas de pesca, colocando as iscas, enquanto seu irmão mais novo explorava com o olhar o lugar.

De repente, Tiago soltou um grito de espanto.

-Veja só! – Disse, apontando o dedo para o outro lado do riacho, onde algo branco se mexia entre a relva.

Imediatamente, os dois foram até lá, a fim de ver o que era.

Ao se aproximar, viram que se tratava de uma menina pálida, que usava uma túnica branca. Seus cabelos loiro claros estavam espalhados, misturados com a grama verde. Toda a alvura da menina era completada por um par de asas de plumas brancas.

Tiago se abaixou, maravilhado com a figura e notou, com horror, que os olhos dela sangravam.

-Precisamos tirá-la daqui! – Disse, apiedado da situação do anjo.

Márcio assentiu e os dois fizeram, com as varas de pescas e a toalha que haviam trazido para sentar, uma maca improvisada, sobre a qual colocaram o anjo.

Seguiram, então, de volta a aldeia onde moravam, carregando a maca com o anjo. Certamente, haveria quem pudesse curar os olhos feridos daquela criatura pura e bela.

Quando chegaram à ponte que ficava na entrada da aldeia, uma multidão se juntou para ver aquela estranha cena que se passava.

Os dois irmãos levaram a maca até sua própria casa, uma pequena construção de madeira.

Lá chegando, colocaram o anjo sobre a cama de Márcio e Tiago sentou-se ao lado dele. O primeiro pôs-se a colocar água numa tigela e separou alguns panos limpos, para limpar o rosto maculado de sangue da celestial criatura.

Tiago, fascinado, ficava fitando o anjo, até ter coragem de estender a mão e tocar-lhe a face, concluindo que de fato, aquilo era real. Aquele ser que ele só conhecia das histórias realmente existia. Quando o fez, o anjo sorriu-lhe.

Subitamente, um barulho se fez do lado de fora.

Márcio largou a tigela, apreensivo e foi ver o que se passava. Mal saíram de casa, dois homens fortes da aldeia o seguraram pelos braços, com força.

-O que está acontecendo?! – Questionou.

Todos os aldeões estavam ao redor da casa, com tochas e instrumentos de plantação.

Ninguém lhe deu atenção.

Dois outros homens entraram na casa, enquanto isso.

Lá dentro, Tiago notou o que acontecia e pegou a mão do anjo, miúda e pálida. Trocaram seu último sorriso, enquanto o anjo ainda soltava suas lágrimas de sangue.

Foi logo arrancado dali pelos invasores, que o arrastaram para fora com força e rapidez.

Assim que Tiago foi tirado da casa, os aldeões jogaram as tochas na casa.

As chamas começaram a consumi-la com rapidez, enquanto lágrimas salgadas corriam pelo rosto de Tiago e Márcio olhava sem entender.

-Por que tal crueldade? – Tiago murmurou.

-Aquela criatura era bela demais! Com certeza era um demônio e traria desgraça ao nosso povo! – O líder da aldeia sentenciou.

Os dois irmãos nada disseram. Já nada mais podia ser feito para salvar aquele ser benévolo que haviam encontrado. Ficaram apenas se perguntando, no fundo da alma, quão ignorante seria aquele povo ao qual pertenciam...