''AB-ORIRI...intervidas...pro'-vida...pro'-escolha '''

Magda acordou, olhou o relogio em cima do criado-mudo...sete horas, segunda feira, dia de trabalho pesado, jogou as cobertas longe, se aprontou, tomou um cafe' rapido, trancou o apartamento e saiu apressada. Demorou quase dez minutos para sair `a rua e quando colocou o nariz fora da porta do predio sentiu o frio cortante, ainda bem que estava bem agasalhada e foi caminhando apressada.

Teria que andar quatro quadras ate` seu trabalho na loja em que era gerente, um bazar de aviamentos, linhas e botões, fivelas e zipers, tecidos e enfeites para noivas, festas de debutantes e de quinze anos, era um bazar grande e vivia lotado desde oito da manhã ate' seis da tarde, mal tinha tempo para um lanche ao meio dia, era um corre corre danado e isto ja' fazia quase quinze anos que Magda por la' trabalhava, desde que tinha vindo da pequena cidade do interior onde nunca tinha trabalhado fora, costurava vestidos e roupas em casa mesmo e quando sua mãe faleceu e ela ficou sozinha decidiu e veio para a cidade grande, conhecia uma familia amiga de sua mãe e ficou um mes na casa deles e quando arrumou emprego no bazar foi morar no quarto, sala, cozinha e banheiro em cima do bazar, gostava do que fazia, tinha começado como atendente de balcão, passou para balconista numero um, e foi crescendo dentro da loja ate' chegar ao cargo de gerente cinco anos atras.

Ganhava bem, tinha comprado, financiado, o apartamento em que morava agora, no centro da cidade, bom local, bom predio, boa vizinhança, e carro não precisava e nem sabia dirigir mesmo, tinha uma boa poupança no banco, vivia bem, era solteira e estava agora com trinta e cinco anos, morava so', pouco saia, quase nenhuma vida social tinha, gostava de ler, assistir tv, ouvir musica e suas unicas conhecidas, que amigas intimas não tinha, eram as colegas de trabalho, algumas vezes ia a uma festa, um passeio com algumas delas, algumas reuniões e isto bastava para ela...

Magda sempre teve saude, era forte, dificil ficar doente, de cama, mesmo gripes era dificil ter e resfriados pouco ela teve na vida toda, mas semanas atras começou sentir tonturas, depois nauseas, vomitos, teve sangramento uma noite, pouco mas ficou um pouco preocupada, foi ao medico, fez exames e ele lhe receitou remedios, melhorou um pouco, mas na ultima semana os sintomas tinham aparecido de novo, uma manhã acordou muito mal, ligou e não foi trabalhar, dia seguinte foi e dois dias depois ficou de cama de novo...tomava seus medicamentos , melhorava um pouco e na ultima sexta e sabado não foi trabalhar, ficou de molho na cama por treis dias, suava, tinha febres , delirava, mas aguentou tudo sozinha, não chamou ninguem, melhorava, piorava e foi na segunda que acordou atrasada, sete horas e saiu apressada....

Estava quase chegando no trabalho, mais uma quadra e estaria la', parou na esquina, no cruzamento grande e movimentado, esperava o sinaleiro dar sinal que podia atressar a rua...quando ele deu sinal verde começou a caminhar na faixa para pedestre e viu, viu ''ela'' mesma vindo em sua direção...piscou, tinha parado no meio da rua, pessoas quase a empurravam, o sinal iria virar vermelho, uma mulher deu um esbarrão forte nela, e a outra ''ela'' vindo devagar, caminhando em sua direção, olhando nos seus olhos, mesma roupa e sapatos, mesmo cabelo, tudo, tudo igualzinho..e a outra ''ela'' foi passando devagar por ela, ela se virando e seguindo a outra ''ela'', ela atras, hipnotizada, e a outra '' ela'' olhava para frente de repente olhava para ela, e a outra ''ela'' chegou na calçada e foi seguindo e ela atras, impossivel não seguir a outra ''ela'', pensava ela...impossivel, tenho que saber quem e'...como? como pode ter outra tão igual, igualzinha a mim? e foi seguindo...seguindo, virando esquinas, mudando de ruas, saindo do centro, chegando ao primeiro bairro...a outra ''ela'' andava rapido e de vez em quando olhava para tras, como para se certificar que ela a estava seguindo ainda e continuava quando via que ela estava....

E Magda de tão confusa que estava nem se deu conta do cominho que fazia , do tanto que havia caminhado, e engraçado, não sentia canseira e nem estava sem folego e viu quando a outra ''ela'' entrou portões a dentro e foi seguindo e de repente, como se acordasse Magda se deu conta...estava em frente a um tumulo recem-cavado, um monte de terra ainda cobria a cova, uma cruz de madeira e varias coroas de flores, ramalhetes de rosas, e não havia placa indicando de quem era o tumulo, quem estava por ali enterrado e ela tentando ver a outra '' ela'', não mais a via, mas sentia sua presença, e fixou seu olhar nas coroas...todas tinham fitas com palavras gravadas...roxas as fitas, douradas as palavras e a que estava bem por ultimo ela viu e leu o que estava escrito:-

Saudades de suas amigas do Bazar Sto.Antonio...Magda, repouse em paz, sentiremos sua falta amiga.

E em todas as coroas ela agora lia seu nome e nome de quem as tinham enviados, e ela conhecia todos muito bem...e viu a coroa que a familia que a acolheu na cidade grande enviou, inteirinha de margaridas, sua flor preferida...que bondosos , pensou , pensou e se arrepiou e se aprumou e se deu conta....estava morta, sabia agora, estava sim, aquela doença estranha de repente, aqueles sangramentos e viu a outra ''ela'' indo embora...seguiu-a e de repente estava em seu apartamento e via agora como em um filme o que tinha acontecido...

Acordou vomitando, estava sangrando, correu para o banheiro, sentou no vaso e o sangue jorrou e junto com ele o 'feto'', o filho que ela agora abortava, tinha tomado remedios caseiros que ela tinha aprendido com sua mãe que aprendeu com a mãe dela e alem disto tinha colocado agulhas de tricot la' por baixo, tinha cutucado tanto, tanto e agora sentia o efeito do que tinha feito, se sentiu fraca e caiu, bateu com a cabeça na parede com tanta força que ouviu um barulho tão grande de ossos se quebrando e sentiu sangue escorrendo, tentou gritar, pedir ajuda, sua voz não saia, ficou ali largada no chão por treis dias e quando o zelador passando pelo corredor sentiu cheiro mau e usando sua chave mestra abriu o apartamento e colocando a mão no rosto para não sentir o forte cheiro a viu....chamou a policia, e a levaram embora ,ela tudo seguia agora no filme de seu enterro ,ate' a hora em que haviam coberto toda a cova com terra ela viu, depois tudo sumiu e ela apenas se lembrava de estar acordando na segunda feira , as sete horas, estava atrasada e foi saindo em direção ao bazar e foi quando viu a outra ''ela'' e soube de tudo...e sabia que outro jeito não teria....

Sua outra ''ela'' a esperava agora, deu-lhe a mão, seguiram juntas para a eternidade...e de repente começou a sentir que a outra ''ela'' estava ''adentrando'' dentro dela...sentiu uma força, uma energia e sentiu mais ainda uma luz, branca, vindo em sua direção e tudo sumiu...tinha chegado aonde tinha que chegar e sentiu, mais do que viu....um portão se fechando e tudo ficando para tras, sorriu...seguiu, tinha que seguir, haviam muitas e muitos seguindo...foi junto.

Quem se sentiu aliviado com a morte de Magda foi Julio, o dono do bazar, pronto, acabou, finalmente acabou meu tormento, pensava ele, era casado, tinha filhos, estava com quase cincoenta agora e desde que aquela garota bonita, exuberante no seus vinte e cinco anos começou a trabalhar no bazar ele ficou louco por ela e enquanto não a teve na cama não sossegou, no começo ela recusava, chorava, ameaçava contar para a esposa dele ou de ir embora, ele parava uns tempos e depois continuava e depois de dois anos ela cedeu, ele comeu, ela se enamorou dele, amou de verdade, ele cansou, mas como dizia, de vez em quando ''batia o ponto'' que era para não perder o costume e controle dela ter...e meses atras ela vindo com esta historia de gravidez...mais esta agora, pensou ele e dizia que o filho ele não assumiria, que não era dele e ela fazendo tudo aquilo, tomando remedios para abortar, se cutucando e deu no que deu....

Julio sentiu alivio total, ninguem nunca saberia do que entre eles tinha acontecido, a policia ainda tentou esclarecer alguma coisa, nada conseguiram, caso encerrado....

Julio saiu uma tarde do bazar, ia tomar um cafe' no bar da esquina e distraido tentava atravessar a rua e viu,..viu ele, seu outro ''eu'' vindo em sua direção e de braço dado com seu outro ''eu'' vinha Magda...rindo, feliz e ele não teve tempo e nem soube nunca como tudo aconteceu...apenas sentiu a batida , o farol vermelho, o carro veio em toda velocidade.....ele apenas teve tempo de ver seu outro ''eu'' nele ''adentrando'' corpo adentro...e viu Magda rindo...feliz...feliz., e quando ela lhe estendeu a mão para ajuda-lo a levantar, ele aceitou.

Que outro jeito teria senão aceitar uma mão amiga estendida?

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WILLIAM ROBERTO CUNHA
Enviado por WILLIAM ROBERTO CUNHA em 02/02/2011
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