A moça que não sabia ter PAI

Ela teve um pai rigoroso, perfeito como os tempos exigiam. Apesar da austeriadade a criou com muito carinho e, embora incomum para a época, lhe proporcionou a oportunidade de estudar. Considerado um luxo para aquelas atuais circunstâncias, situações onde para a mulher somente era permitido casar, ser senhora do lar, cuidar dum marido e filhos. Sendo assim, já estava mesmo de bom tamanho. E ela também estudou música. Se apaixonou pela música, e, futuramente trocaria quase tudo pela música, abrindo mão algumas vezes até da maternidade. Paixão é paixão e, como já diria Eliz Regina quando questionada sobre o significado da música em sua vida, que "cantar é mais importante até que ser mãe". Assim foi para ela a música. Era dona de uma inquietante e visionária personalidade. Uma visionária que nunca simplesmente aceitava as coisas como sempre foram e, olhando para além, enxergava que poderiam ser diferentes e melhores. Tamanha era a inquietude e a visibilidade de uma vida diferente que não sujeitou-se na vida a ser propriedade de um homem. Libertou-se, ganhou sua vida como era imperativo para desenvolvimento de sua personalidade, e pagou como preço o desprezo dum pai que a renegou como filha até o fim dos seus dias. Certamente que sofreu muito por isso. A liberdade porém possibilitou-lhe tamanho alcance na utilização do seu potencial incomum que, no final das contas, pesando na balança da vida, os pratos se equilibraram. Foi feliz, só não aprendeu a ter PAI.

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Ela nasceu de novo. E, claro, ela não sabia ter PAI. Ela escolheu uma situação duvidosa. Seria coincidência? Ou proposital e imperiosa necessidade? E continuou na mesma condição.

PAI para ela, uma incógnita. Nasceu e não o conheceu. Sofreu todas as dores da ausência. Conseguiu alguem que lhe pode fazer as vezes de Pai, que se esforçou, mas não o substituiu. Seria acaso? Não, não há substitutos para esse mister. Embora não se possa deixar de admitir a louvável atitude de quem se faz presente na necessidade de um ser ausente.

Repetiu a situação. Renegada pelo PAI. Só que desta vez, desde que nascera. Desta vez paraceu-lhe mais doído. Ficou um bom tempo sem referência, parecia uma meia pessoa. Em parte de si mesma não se enxergava. Até que pode vê-lo. Completou-se. Inclusive num misto de sentimentos contraditórios que fundia a completude de si mesma, proporcionando uma reconfortante alegria, com a revolta de estar nessa condição de renegada, abandonada. E assim continuaria. Agora completa. Muito bom, melhor inteira. Não culpa o PAI por nada. Concluiu apenas que não aprendeu a ter PAI.

Nilamaria
Enviado por Nilamaria em 10/08/2011
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