O BONDE DA MEIA NOITE

Houve um tempo em que não existiam ônibus, isso quando minha avó ainda era uma mocinha e esbanjava uma beleza bem natural. Existiam os bondes, no início puxados a burros e depois elétricos. Fausto era um solteirão que gostava das noites regadas a uma boa bebida, passando horas na farra e chegando em casa muitas vezes pela manhã. Um copo na mão e um charuto na boca era a sua diversão, além de uma mulher de lado. Não tinha um bar ou restaurante que ele não conhecesse no Recife. Ultimamente havia dispensado alguns amigos ao notar que apenas se aproveitavam da sua grana, da sua boa vontade, preferindo a companhia feminina, era mais lucrativo, já que depois da bebedeira vinha uma noite de amor. Sempre quando dispensava a “madame” ele apanhava o último bonde que o deixava próximo de sua casa, isso antes da meia noite, pois depois disso só alugando um automóvel. Gostava do bonde por causa dos papos durante a viagem com os notívagos.

Certa noite Fausto resolveu “largar” mais cedo da farra e pegar o último bonde, mas não olhou direito o relógio e acabou perdendo. Não se via na hora nenhum carro de aluguel, deixando ele preocupado, pois já estava meio grogue. Surgiu ali então uma mulher, o que animou o nosso notívago. Se entreolharam e Fausto tomou a iniciativa da conversa. Ela lhe falou que esperava o bonde que passaria por volta da meia noite, o que fez ele aguardar junto com ela na parada. Conversa vai, conversa vem e os dois já pareciam grandes amigos, apesar dele se sentir tonto e doido para chegar em casa. Sua cabeça rodava e num certo momento teve que ser amparado pela desconhecida mulher com quem conversava. Alguns minutos depois ela anunciou que o bonde estava vindo e embarcaram no mesmo. Fausto estava em confusão mental e já nem conseguia falar nada. Com a visão turva viu apenas um bonde se aproximar e mais nada.

Acordou já pela manhã deitado na calçada do bar com os bolsos revirados e sem nenhum tostão. Levaram até o seu relógio “Mido” e o cordão de ouro que tinha no pescoço. Um velho amigo que por ali passava informou o que ele também sabia: não tinha esse bonde da meia noite e ele não soube explicar o que realmente aconteceu.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 23/02/2013
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