American Adventures of Bud Caramelo

Owensboro, Kentucky, 1999

Galopou em seu exuberante corcel negro, ou marrom, pouco importava agora. O importante era que pegara a mocinha pela cintura e a colocara na garupa, atravessando assim a rua movimentada e recebendo o beijo de gratidão tão merecido.

Voltou à realidade. Não havia corcel, nem beijo algum. Era só um esquálido saco de ossos com um bigode ridículo. Aquela mocinha jamais lhe daria moral alguma.

Seu nome era Gilberto, mas o pessoal do escritório o chamava de Snip. Era porque ele fazia um barulho esquisito quando espirrava. Chegou na sua cabine e sentou. Ligou o computador e olhou para o cantinho do café. Isaías estava lá. O safado que lhe dera o apelido de Snip.

Poderia se levantar agora e vestir seu traje robótico com foguetes propulsores. Iria simplesmente sacar uma espada laser e fazer Isaías se ajoelhar no chão, implorando. Não o mataria, simplesmente arrancaria suas calças num movimento circular com a espada laser e sairia voando sobre o escritório, recebendo aplausos de todos.

- Fala aí, Snip, seu cabeçudo - Era Dorival, assessor de contabilidade e cretino de marca maior - Diga aí, você não vai adivinhar quem eu tracei ontem a noite. A Martinha.

Martinha, o sonho de qualquer estagiário, o pesadelo de todos os chefes casados. Ela tinha coxas roliças, como a Marilyn Monroe. Tinha lábios grandes e curtos, como Rita Raysworth. Tinha olhos grandes e verdes como Anna Chlumsky. Andava suave pelo escritório, deixando um rastro de um perfume só dela, uma mistura do Central Park numa manhã de inverno com o hálito de Jackie Kennedy.

Ele chegaria em Martinha e olharia nos olhos dela. Diria, venha, vou lhe mostrar algo. Subiriam no telhado, logo nas primeiras horas da manhã, os raios de sol ainda fulgurando entre os prédios e a névoa ainda sobre o capô dos carros lá embaixo.

E a pegaria pela mão e sairiam voando, com o sol em seus rostos. E ela o acharia maravilhoso, o melhor homem do mundo, e o prometeria amor eterno e fiel, sem jamais olhar para nenhum outro. Eternamente sua.

- Pois é, Snip. Ali é só pra quem pode. Ha ha, se você pegasse uma dessas nem saberia o que fazer não é? - Snip deu uma risadinha com o canto da boca e Dorival saiu para contar a novidade a todos no escritório.

Enquanto ele digitava os relatórios no computador, ouviu os comentários sobre a guerra no oriente médio. Lançavam bombas em alguém, pois alguém sempre está lançando bombas em alguém. E alguém sempre responde lançando mais bombas em outro alguém. Serão o problema as bombas ou os alguéns?

Pegou a caneta e olhou seus assessores. Assinou o decreto que decretava que nunca mais iriam existir bombas no mundo. O povo o aplaudia e ele saiu na sacada da Casa Branca e acenou. Sua bela esposa veio ao seu encontro e o povo vibrava e gritava o nome do casal. Ele pulou da sacada e deu uma cambalhota, aterrissando no chão de pé. A Primeira Dama também pulou e ele a segurou em seus braços. Eles passeavam pelo jardim enquanto o povo aplaudia.

- Uma carta da chefia pra você, Snip. Parece que você foi enfim, promovido. Ele abriu o envelope e leu, ao sr. Gilberto Felipe Souza, comunicamos com antecedência sua dispensa dos serviços desta firma. Snip fechou o envelope e abriu a camiseta, revelando o uniforme laranjado. Foi tirando as roupas enquanto corria e logo sua capa amarela esvoaçava pelo escritório. No beiral da janela, pulou para a imensidão de carros e concretos a vinte andares abaixo. E assim, o capitão Bud Caramelo voou. E ele voou como nunca, para longe de tudo aquilo, para longe de toda aquela gente.