O estranho bilhete

Era uma manhã chuvosa, daquelas que a cama te prende, mas a campainha insistia, sem parar e ele não conseguia mais dormir.

Assim não havia jeito de dissimular e voltar a dormir.

Então como um sonâmbulo Júnior foi abrir a porta e só viu uma mão com luvas entregar-lhe um envelope pardo e logo imediatamente sumir entre os grossos pingos de chuva, rua abaixo.

Ainda com as pálpebras meio entreabertas colocou o envelope na mesinha de cabeceira e voltou a dormir.

Daí em diante só teve sonhos sinistros, com vozes que o chamavam, imagens de outros séculos, cabeleiras loiras e dentaduras extremamente alvas e grandes escancarando risos de todas as formas. Eram sinistros os cochichos.

E o pior era o cãozinho que lhe falava, como um ser humano. Reclamava a falta de atenção, de um osso de carne mal passada.

- Que louco! pensou entre intervalos de sonhos de Alfa a Beta. Até que incomodado decidiu-se por acordar.

Aí esbarrou no copo d'água na mesinha de cabeceira e reparou no envelope pardo, que continha um bilhete insonso onde diziam: Juninho,

te esperamos no velho convento da cidade às 19 horas em ponto. Assinado: Turma do passado.

- Que turma é essa? pensou o jovem irritado. Não conheço nenhuma turma do passado. Além do mais esse convento está abandonado.

- Devia ser alguma gozação do Bola, ou vingança do Grude, que perdera sua namorada para ele.

Não importava o que fosse, pois ele não era pessoa para ser desafiada sem dar resposta.

Assim pontualmente às 19 horas lá estava ele frente ao portão enferrujado do convento, alheio à coruja que já despertara num galho alto do velho Jatobá do jardim e exibia enormes olhos amarelos ao visitante.

Júnior irritado, incomodado e todo molhado pela chuva que insistira em cair o dia inteiro e colaborar com aquele cenário sinistro decidiu tirar a limpo aquela história.

Ele só queria ver a cara dos cafajestes que lhe aprontavam isso e num ímpeto chutou a porta emperrada e pesada, que se abriu após longo rangido.

O salão de entrada estava empoeirado e nu, sem um móvel sequer.

A luz tênue que o iluminava provinha de um poste da rua deserta.

Todavia os olhos aguçados de Júnior avistaram fagulhas por debaixo da porta lateral que conduzia a um outro salão.

E agora já apavorado e furioso moveu a maçaneta cuidadosamente para surpreender o fanfarrão e o que viu foi um facho de luz intenso direto nos seus olhos.

Ao fundo, um coro de vozes eufóricas gritavam:

- Feliz aniversário.... Parabéns pra você Juninho.

E logo, não se soube quem, colocou-lhe nos braços um pequenino presente: Um peludo e meigo cãozinho com o seguinte pedido pendurado ao pescoço... Preciso muito de carinho. Então me ame Juninho!

- UFA, pensou Júnior, será que sonhei com tudo isso ou o que estou vivendo é um sonho?

anna celia motta
Enviado por anna celia motta em 01/12/2015
Reeditado em 01/12/2015
Código do texto: T5466154
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