ACONTECEU NUM MILÉSIMO DE SEGUNDO

   Bartolomeu olhou o tempo e viu que ia chover. E era uma chuva das fortes, daquelas que causam alagamentos e desabamentos. Ele já havia passado por situações assim e perdera tudo, a aflição era tremenda. Morava com a mulher e dois filhos em uma pequena casa na beira de uma barreira, infelizmente. Gostaria muito de não estar ali, mas a necessidade o obrigava. Mas uma vez olhou para o céu, as nuvens negras se formavam numa velocidade incrível e ele já antevia o sufoco que ia passar, tinha que fazer alguma coisa para salvar a si e a sua família, algo dizia para ser bastante rápido.

   O tempo parou para Bartolomeu no exato momento em que pingos fortes caíam sobre sua cabeça, foi como se tivesse apertado a tecla de pause de um computador durante uma cena de um filme. As nuvens não se moviam mais, os pingos da chuva forte ficaram em pleno ar, o vento parou e as pessoas que por ali estavam ficaram paralisadas tais quais estátuas, apenas ele conseguia se mover e indagar o porquê desse fato estranho. Viu a esposa abrir a porta e sair com as crianças, aparentava chorar dirigindo-se a ele. Abraçou-se a ele e tentou dizer-lhe algo, mas ele não a ouvia e nem o choro dos filhos. Impressionante tudo isso, pensou. Foram momentos de indecisão, não sabia o que fazer. Compartilhou o abraço com a mulher e segurou nas mãos das crianças, mas aquele silêncio sepulcral o incomodava. Pensou em sair dali logo, afinal a chuva já iniciara mesmo percebendo que tudo parou. Andou alguns passos com a família até chegar a uma escadaria, desceu com cuidado vendo que as pessoas pareciam estátuas, gostaria de ajudá-las, mas não sabia como. Chegando lá embaixo procurou um abrigo, um local seguro para ficar, viu aquelas "estátuas" todas sem movimento algum, nem poderia lhes perguntar alguma coisa, com certeza não responderiam.

   Uma névoa clara envolveu Bartolomeu e sua família, ele teve a sensação de desmaiar e de repente tudo escureceu. Sentiu o fôlego lhe faltar e finalmente ouvir o som da pesada tempestade que caía. Todo mundo agora se movia e gritava, a água começou a encharcar a terra e escorrer morro abaixo. Um estrondo seguido de outros, pedras rolando do alto junto com galhos de árvores, relâmpagos e trovões e muita água desabando. Procurou mulher e filhos e não mais viu, apavorou-se. Tentou sair de onde estava e conseguiu, mesmo ouvindo pessoas o alertarem para não subir a escadaria que agora transformara-se numa cachoeira. Subiu assim mesmo, quase sem forças, mas chegou lá em cima e viu que sua casa não mais existia, estava totalmente destruída e nem sinal dos familiares. Chorou e caiu em profundo desespero. Em meio aos destroços procurou por eles, mulher e filhos, mas não encontrou. Achava que estavam mortos. Súbito tudo se transformou, ali estava sua casa, intacta, dela saiu a mulher puxando os filhos e correndo para abraçá-lo. Agora ele ouvia a sua voz e o choro das crianças. Os pingos fortes da chuva caíam impiedosamente, o que o fez sair imediatamente do local com eles. Desceu a escadaria tendo a impressão de que já fizera isso há poucos segundos. As pessoas por quem cruzou gritavam como loucas, uns desciam, outros subiam e ele viu sua própria imagem também subindo no maior pranto. Imaginou estar louco. Desceu sem mais prestar atenção a esse fato, afinal já estava adentrando um local para se proteger junto com sua mulher e os dois filhos. Olhou para o alto e viu uma enorme pedra destruir sua casa. Chorou assustado, na verdade todos choravam de tristeza vendo aquela cena. Foi tudo muito rápido.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 01/11/2020
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