Depois do Natal: Um conto para não ser lido à noite (cap XV - A FAMÍLIA DO TAXISTA)

A família do taxista?

Só ficou sabendo de sua morte na manhã do dia seguinte.

Não tendo aparecido em casa por volta das sete horas, como de costume, sua esposa foi procurá-lo, no ponto da rodoviária, onde ele tinha sua placa registrada.

Não por desconfiança, mas para lhe levar uma garrafa de café e uns bolinhos fritos.

Era esse o costume para uma atitude pouco costumeira. A esposa sabia que em algumas oportunidades o marido deixava de ir para casa para aproveitar melhor o tempo e alguns viajantes desavisados, retardatários que tendo perdido o último ônibus e na pressa de chegar, alugavam um táxi para chegar em casa numa das cidades vizinhas.

Ela sabia que o marido fazia esse tipo de sacrifício, de trabalhar a noite, para pagar logo as prestações do carro. Esse era seu ganha-pão e sua honestidade não lhe permitia deixar de saldar uma dívida.

O sacrifício, portanto, era pela família.

Não era ele, isso sabia a esposa, como alguns de seus colegas que deixavam de ir para casa, dizendo que ficavam a trabalhar, mas passavam a noite nas casas das amantes ou em noitadas.

Com ele não era assim. Por isso quando ele deixava de aparecer em casa ela lhe levava o café. Como estava fazendo nessa manhã.

Na mais perfeita confiança de um casal que se conhece e confia nas atitudes e decisões do parceiro.

Em casa ficaram os dois filhos: uma menina, fazendo os primeiros serviços de limpeza da casa; e o menino, um pouco maior, se preparando para sair também.

O menino, fora do período de aula fazia pequenos serviços para um escritório de contabilidade, próximo de sua casa. Dizia que não queria seguir a mesma profissão do pai. Sempre via os noticiários e acreditava ser, aquela, uma profissão perigosa.

A esposa chegando pergunta pelo marido.

Os colegas contaram que ele tinha saído, na noite anterior, para atender um telefonema, e não voltara mais. Mas isso era comum: um passageiro chamar, de casa para uma viagem mais longa! Ou então estar fazendo uma viagem e na volta pegar outra e na sequência mais outra. Além do fato de algumas dessas chamadas de casa serem para uma viagem mais longa. Não era esse o costume dele, responde a esposa, já preocupada.

- Sempre que ele arruma uma viagem mais demorada liga para casa, avisando. Não ligou!

Nesse momento toca o telefone do ponto. O homem que conversava com a mulher do taxista atende.

Faz um ar de espanto!

Balança a cabeça, como quem está querendo negar alguma coisa!

Balança, novamente a cabeça, agora afirmando algo que não diz ao telefone. Todos percebem que algo mudou em seu rosto.

O sorriso que havia se desenhado na suposição de mais um cliente se desmancha numa nuvem de dor, apreensão e tristeza. Não consegue nem se preocupa em esconder.

Olha para a mulher e fala para quem com ele fala por dentro do fio do telefone:

- Ela esta aqui! Quer falar com ela?

Entrega o telefone à mulher. A voz mal consegue sair pela garganta, prese por um nó que não deixa explodir o pronto que poderia aliviar a dor que sente no peito:

- É da polícia! Encontraram seu marido! Ligaram para sua casa e disseram que a senhora estava aqui…

(Continua na próxima semana...)

Neri de Paula Carneiro

Rolim de Moura – RO

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