Paralisia do sono

E de repente, escuridão e um silêncio sepulcral. Apenas alguns milésimos de segundos atrás, estava em um mundo cheio de cores, imagens e sons que representavam a vida na sua totalidade de força e vitalidade, e agora se encontrava como se estivesse em um pesadelo macabro. O que será que poderia ter acontecido? Será que tinha batido a cabeça depois de um tombo e se encontrava no purgatório ou nas portas do inferno já pagando por seus pecados? Poderia ser uma conclusão bem plausível se no canto esquerdo do seu campo de visão não estivesse as horas marcadas digitalmente no aparelho de televisão que ficava em seu quarto. Então era o contrário do que supôs primeiramente. Aquele mundo tão vivo era o seu subconsciente desperto enquanto se encontrava adormecido; e esse suposto pesadelo macabro nada mais era do que a própria vida consciente logo após acordar. Tentou se mexer, levantar-se, sair daquela situação, mas seu corpo não obedeceu o que sua mente tinha ordenado; parecia que tinha algum problema com o seu sistema nervoso que impedia a conexão entre a mente e o corpo. Quase no mesmo instante em que percebeu essa situação no mínimo embaraçosa, apesar do frio, sentiu uma gota gelada de suor escorrer pela testa, passar por trás da orelha esquerda e cair na cama. Conseguiu ouvir o barulho da gota de suor quando caída no lençol. Esse detalhe fê-lo esquecer apenas por alguns segundos a situação que se encontrava. Era uma ironia. Como é que não conseguia mexer nem ao menos um dedo do pé mas a sua audição estava tão aguçada a ponto de poder ouvir um som tão imperceptível? Tentou gritar, mas só saiam grunhidos pela sua boca, já que assim como cada fibra do seu corpo, tanto a língua como as cordas vocais estavam também estagnadas, fazendo com que o ar que era expelido de seus pulmões não passassem de sons inaudíveis e de certa forma aterrorizantes. Mas mais aterrorizante ainda era o que acabara de acontecer logo após a tentativa frustrada de gritar: um sussurro no pé do seu ouvido de palavras nunca antes ouvidas, palavras que pareciam fazer parte de um idioma jamais conhecido. Não podia acreditar que tudo isso estivesse acontecendo realmente. Sempre se considerou uma pessoa guiada apenas pela lógica e pela razão, e todos esses acontecimentos que haviam começado a cerca de poucos segundos, mas que para ele já pareciam uma eternidade, estavam indo completamente em desencontro com todo ceticismo que já considerava estar impregnado no seu espírito, um espírito racionalista e, portanto, científico. Mas tudo estava tão real. Será que tudo o que acreditava estava indo por água abaixo? Foi a primeira vez em sua vida que lhe havia surgido essa pergunta. Mas na situação em que se encontrava não tinha tempo para pensar sobre essas conjecturas metafísicas, a única coisa que importava no momento era poder se levantar da cama e pôr fim a todo esse sofrimento que parecia não mais ter fim. Mas para seu total desespero, as sensações não só não tinham cessado, como estavam aumentando de uma forma mais intensa à medida que o tempo ia passando. Conseguiu dar mais uma olhada para o relógio e o horário continuava o mesmo, 3:33 da madrugada. Ora, tinha passado um longo período de tempo nessa angústia infernal e o relógio continuava marcando o mesmo horário. Mais uma vez surgiram questões pseudo-filosóficas, mas agora sobre o tempo e o espaço. Não! Isso não podia estar acontecendo. Desejava apenas uma coisa, poder sair da cama de onde parecia estar grudado, petrificado, como se fosse uma escultura renascentista, como se fosse um Cristo morto nos braços da suposta virgem, representada pela cama que tanto lhe dera conforto, assim como uma mãe dá a um filho. Mas nem Michelângelo ou muito menos Freud com suas teorias do inconsciente estavam em seus pensamentos. De repente, começou um formigamento na sola dos pés que vinha subindo aos poucos pelas canelas e coxas até chegar ao abdômen e ao tórax. Pôde sentir o esôfago esquentando e a voz querendo sair. Nesse exato momento saiu um grito de sua garganta, um grito que mais parecia um rugido de uma fera sendo morta da maneira mais brutal que se possa imaginar. Mas ele não estava morrendo, pelo contrário, estava voltando à vida.

Quando olhou para o relógio mais uma vez, o mesmo estava marcando 7:06 da manhã. Um feixe de luz oblíquo do sol passava por uma fresta da janela e pousava sobre sua cabeça, mais precisamente sobre a orelha direita, aquela mesma orelha que lhe fez lembrar do sussurro ouvido em seu pesadelo dessa mesma noite. Não conseguiu se lembrar dos detalhes do acontecido, mas lhe veio uma sensação estranha, uma sensação de que tudo aquilo tinha sido real. Levantou-se normalmente da cama mas não sem antes desejar que isso nunca mais acontecesse e que as respostas para os acontecimentos da vida continuassem vindo através de interpretações baseadas em métodos lógicos. Chegou a conclusão que independente de qualquer coisa, mesmo ainda não tendo a oportunidade de ter lido Dante e a sua Divina Comédia, sabia mais ou menos como era o inferno.

Igor Grillo
Enviado por Igor Grillo em 20/02/2022
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