RELATO DE UM PESADELO

Uma vez, em meus sonhos, assistia a uma filmagem de um programa jornalístico. Creio eu, da TV Globo ou outra emissora popular. Em meu sonho, um repórter mostrava os destroços de uma igreja

incendiada. Havia um menino do qual se comentava, que teria falecido no incêndio. A câmera mostrava destroços cobertos de fuligem, inclusive uma grande estrutura de ferro em forma de flor

de lis. A estrutura estava toda deformada e coberta de sujeira. Não me lembro ao certo das palavras narradas, nem se o repórter era homem ou mulher. Mas a reportagem situava o acontecido no

passado, acredito eu, nos anos 80.

A reportagem então exibe uma filmagem que seria do dia do incêndio. Uma câmera de filmagem antiga, creio que exatamente das décadas descritas, pois a imagem se assemelhava aos vídeos antigos caseiros feitos por VHS, descia lentamente por uma igreja bem pequena, com dois andares. Na parte de cima, havia um parapeito alto com a parte de cima de madeira marrom e a parte de baixo com barras brancas grossas. O parapeito era baixo e ali estavam as crianças. Elas estavam aparentemente em pé, cantando, entoavam um hino. Havia centenas de crianças, cada uma com uma vela à frente. Mas nenhuma delas segurava uma vela. As velas eram grandes, daquelas que você coloca em copos.

A câmera desceu mostrando que a estrutura de metal do início era um imenso castiçal com muito mais velas penduradas, e a filmagem deslizou pelo andar de baixo, onde havia muito mais crianças, sentadas em bancos de madeira. À frente e atrás dos bancos, havia muito mais suportes de velas, bem como castiçais de chão (um na frente de cada banco). O que me impressiona era a riqueza de detalhes das crianças. Eram todas muito pequenas, provavelmente com menos de 10 anos, ricamente vestidas. As meninas estavam todas de vestido, com laços coloridos nos cabelos, tiaras, sapatinhos com meias altas. Os meninos usavam coletes com gravatas, tanto tradicionais como borboletas, gorros, bonés, boinas. E eram praticamente todas crianças brancas, que pareciam de famílias abastadas.

A câmera focaliza então para uma parede com janelas na lateral da igreja, atrás das crianças (como se o operador da câmera estivesse no meio do corredor). Havia algumas figuras passando muito rápido, ricamente vestidas, como se fossem padres com vestes festivas. Não consigo precisar a cor dos costumes.

Foi aí que a câmera captou algo estranho. Enquanto ela focalizava para as janelas, que davam para o exterior (provavelmente era noite, pois tudo nelas estava escuro), vi um ponto onde havia uma labareda mais alta sobre os bancos. De repente, em uma fração de segundo, ela pareceu ter aumentado, mas não havia vento. Alguma coisa havia se incendiado. Percebi ali que provavelmente era onde o incêndio havia começado.

O mais estranho, entretanto, é que as crianças permaneciam ali. Elas estavam brincando, cantando hinos, sorrindo – sendo crianças. A câmera então se apagou, e eu podia apenas continuar a ouvi-las. Percebi que elas gritavam, muito, mas não era de dor, medo ou sofrimento. Elas ainda estavam ali, como se nada tivesse acontecido. Foi quando acordei.

***

Mesmo acordado, demorei para me levantar. Quando o fiz, fui ao banheiro, tomei água, prossegui com minha vida. Mas demorei para dormir. Ainda mais pela sensação perturbadora que tive ao me cobrir: precisei retirar as cobertas o tempo todo.

Pareciam se esquentar mais que o normal ao meu redor.