O Curral

Um jovem mochileiro está perdido no meio do nada. Com apenas uma garrafa de água sobrando e algumas moedas em mãos, decidiu procurar por algum local seguro para descansar à noite.

Seguindo estrada adiante, o rapaz avistou uma pequena fazenda cercada com alguns bois pastando dentro. Havia uma bela casinha vermelha e um curral perto, e uma notável grande árvore negra na frente da casa. As folhas dessa árvore tinham um brilho fluorescente bem distinto. Parecia néon.

A portinha da cerca de madeira estava entreaberta, então ele pensou em se aproximar para perguntar direções se encontrar alguém. Ao entrar, viu um idoso de chapéu de palha sentado sob um toco de árvore. Parecia exausto.

— Com licença, senhor. — O viajante se apresenta e pergunta se o dono do sítio conhecia alguma pousada perto. O velho fazendeiro olhou para o jovem perdido fixamente, mas não o respondeu.

— Bem, me desculpe por inco- — Podes passar a noite aqui. — Interrompeu o proprietário.

— Mas só com uma condição.

A condição era trabalhar no sítio dele como forma de pagamento. O garoto deveria ajudá-lo a carregar toda a palha deixada pelo pasto longe dali. Hesitante, olhou para os lados pensativo e concluiu que estava falido e preocupado em não conseguir outra opção de estadia no meio do nada, então aceitou os termos de hospedagem.

O jovem rapaz percorreu pela roça segurando um carrinho de mão e colhendo todas as palhas que achava pelo caminho. Deu a hora de voltar para dentro, e quando retornou, as coisas começaram a ficar meio estranhas... De repente o recinto estava todo sujo, enferrujado e tão coberto de mofo que sua cor original mudou de castanho para verde-acinzentado. Os telhados da casa estavam quebradiços, a árvore negra estava caída e ressecada, e as suas folhas haviam se dissipado todas. “O que aconteceu aqui?” Pensou o jovem. “Eu só fiquei fora por 50 minutos”.

O rapaz correu em direção ao portão da estrebaria e notou vários jornais e folhetos colados um em cima do outro em toda a parte externa da cavalariça. Algo chamou sua atenção, então ele arrancou um dos jornais da parede e para a surpresa do mesmo, havia a foto do velhinho com uma legenda embaixo dizendo que o representado havia morrido de manhã e seu cadáver estaria sendo procurado. E a data dessa notícia é de... Hoje.

“É uma piada de mau gosto? Eu estava com ele há pouco.” Indagou, incrédulo. Mal ele parava para olhar pra trás que percebe que toda aquela palha no carrinho ficou mais volumosa do que antes. Foi mexer nas palhas e encontrou o tal idoso deitado em posição fetal. Seu corpo estava rígido, frio, arroxeado, e havia sangue escorrendo pela boca, nariz, olhos e testa fora. A ferida na testa parecia um grande corte longitudinal provocado por uma agressão violenta.

Tão logo o moço absorveu o triste fato que choramingou uma lágrima, mas logo se recompôs e voltou a empurrar o carrinho de mão até o estábulo, devolvendo toda a palha à onde pertence, inclusive... O cadáver.

“Foi a viagem mais estranha que já tive”, refletiu o garoto enquanto se debruçava na cama do falecido senhor. A lua nascente estava visível por entre as brechas do telhado quebrado. Ele não conseguiu relaxar e dormiu mal.

Na manhã seguinte, tomou o café da manhã correndo, pegou a mochila e saiu correndo jurando fugir o mais depressa possível. Mas infelizmente não pôde sair da fazenda porque a cerca “virou” uma grande grade de aço repente. “Que estranho...” Pensou ele. “Ela não estava aí antes”.

Então o jovem ficou procurando por uma saída em todo o entorno do sítio mas nada de porta, abertura ou sequer buraco. Essas grades são altíssimas, e no topo delas havia arames de concertina em toda a extensão.

Desconcertado, o moço volta para a casa do velho tentar descobrir algo. Quando chegou perto... Percebe que toda a propriedade do velhinho estava em um estado de completa destruição e ruínas. Estava pior do que antes. Agora o que restou da casinha foi uma construção inacabada, com telhados faltando, parte dos tijolos que revestiam as paredes estavam sem tinta e esburacados. O que era para ser um curral se transformou em uma estrutura de madeira com um design confuso, com as colunas empilhadas em ziguezague e uma deitada, não havia mais teto e todo o local estava encoberto de bolor e teias de aranha. A árvore caída sumiu.

Contudo, notou que havia alguns jornais a menos cobrindo o pouco do que restou das paredes. Retirou um deles e viu a foto do velho com a legenda escrita: “Recompensa: R$ 20.000” logo acima. Essa página estava dizendo que o dono da fazenda era, na verdade, um serial killer e estaria foragido há 4 anos.

“Mas ele não estava morto?” Questionou ele, ainda cético. E quando se virou a 180º viu o referido assassino, muito bem vivo... Só que mais calvo, mais magro e muito mais envelhecido. Ele estava sem o habitual chapéu de palha. Mas estava visivelmente sedento por sangue... Levantou os dois braços para cima em posição de ataque, revelando a machadinha em suas mãos. O rapaz tremeu, mas não conseguiu reagir.

Tão logo o desafortunado alvo foi tomado por uma dor avassaladora em seu busto que deu um estrondoso grito de horror. Seu rosto, pescoço e torso foram banhados em sangue, e parte desse fluído vermelho respingou em toda a face, macacão e braços do homem, seu enfim, algoz.

Agora o jovem descansa em paz no curral. Seu sangue foi usado para regar a árvore negra e ela voltou a brilhar néon pelas folhas exóticas dela, devolvendo toda aquela ilusão de um sítio pacífico. Seus restos mortais estão escondidos dentro de gados empalhados, junto dos de outras vítimas anteriores e tudo volta ao normal, até aparecer outro viajante zanzando pela roça...