É CACHAÇA DE "A" A "Z"

1-Eu já contei história

Para adulto e criança

Eram todas muito boas

Ainda tão na lembrança

Agora escrevo cordel

Sou o poeta Miguel

De tudo faço festança.

2-Agora bem diferente

Vou, porém versificar.

Sobre a tá da cachaça

Que serve pra embriagar

Muitos nomes ela tem

Com certeza é mais de cem

E eu aqui vou narrar

3-Começarei então

Pela ta da abrideira

O nome já diz tudo

Ela é, é a primeira.

A ser tomada no dia

E encher de alegria

E o bebum sai na carreira

4-Corre logo toma outra

Ta nem ai pra a saúde

Diz que é a água-benta

É assim que se ilude

Por esta água-santa

O coitado se encanta

Vai ganhar um ataúde

5-Não ta nem ai pra vida

O que ele quer é beber

Mete o dente na marvada

Esquece até de viver

Toma uma logo cedo

De morrer perdeu o medo

É cachaça de “A” a “Z”.

6-Lembrei agora, porém.

D’uma expressão antiga

Que por causar confusão

A chamavam água-de-briga

Imaginem o seu poder

É só beber para ver

O tamanho da intriga

7-Ela causa um bafafá

De quebrar até dente

É por isso que a danada

Tem o nome de aguardente

Quem demais ela toma

Pode entrar em coma

E morrer de repente.

8-Mas o danado do bebum

Bebe que fica mole

Em todo bar que chega

Vai logo pedindo um gole

Joga um pouco no canto

Dizendo que é pro santo

O resto logo engole.

9-Acha-se santificado

Pela ação que fez

E o dono do boteco

O chama de freguês

Oferece outra pinga

Batizada de gringa

Ele toma outra vez

10-Ele já cambaleando

Continua a beber

Pede logo a saideira

Tira-gosto pra comer

Toma e vai embora

Nem ai para a hora

É cachaça de “A” a “Z”

11-E cheio de respeito

Por toda comunidade

Conhece todo mundo

Desde sua mocidade

Não tem preconceito

Dentro do próprio peito

Existe sinceridade

12-Já noutra localidade

Dá mais uma parada

Chega pro dono do bar

Pede uma calibrada

A-se no direito

Pede arrebenta-peito

Para se equilibrar

13-Toma umas cinco doses

Cara feia ele não faz

Bebe com tanto prazer

Chama a dita até de gás

Continuando de pé

Engole outra diz ser mé

Enfrenta até o satanás

14-O dia só começando

O cara ainda disposto

Pede mais uma caninha

Bebe com muito gosto

Quando toma a dindinha

Diz: adoro esta branquinha

Com sorriso no rosto

15-Acha boa a danada

Isso lhe dá prazer

Toma tanto esse goró

Não quer saber de comer

Ficando na gorobeira

Chamada de brasileira

É cachaça de “A” a “Z”

16-Eitcha gosto danado

Que essa birita tem

O cara toma um copo

Quer logo tomar mais cem

Inicia também uma prosa

Saboreia uma dengosa

Às vezes sem um vintém.

17-A que matou o guarda

É bebida a vontade

Tal como a azuladinha

Ela é azul de verdade

Mas tem de tomar cuidado

Para não ser condenado

Por conta de sua idade.

18-Se você é um menor

Não entre nessa não

Pode acabar sua vida

Pô-lo também num caixão

Viva tranquilamente

Com saúde em sua mente

E um forte coração

19-Pois, cambraia e caiana,

Bagaceira, girgolina

A tá desmancha-samba

Irmãs da camjibrina

Prejudica o seu viver

Você não vai perceber

O que faz essa menina

20-Amansa-corno também

Possa assim se dizer

Deixa o cara molinho

Pensando que vai morrer

É a que matou o guarda

Por ser bem destilada

A cachaça de “A” a “Z"

21-Dona-branca é ela

Também engasga-gato,

Esquentando por dentro

Torna o bebum um chato

Que só ta satisfeito

Quando põe o ar no peito

Com um pedaço de pato

22-Faz com que o individuo

Fique rico e corajoso

Beije quase todo mundo

Torna-se muito fogoso

É chamada meu consolo

Quando o homem é tolo

E totalmente teimoso

23-Beberei desse xinapre

Sem nenhuma parcimônia

E o suor do alambique

Darei a dona Antonia

Para também provar

E poder se embriagar

Juntamente com a Maria

24-Este néctar dos deuses

Muita gente saboreia

Com muita moderação

Ou viram cabra-de-pêia

Fazendo muita bagunça

Filhos duma ronca e funça

Fazem muita coisa feia.

25-Vai logo pra agressão

Ingere uma tioba

Desconhece o irmão

Manda-o tomar no toba

Depois do suco de cana

Perturba a irmã Ana

Chama de peixe cioba

26-Quarenta e duas citei

Você encontra-se a ler

Lembrando de mais algumas

Querendo me escrever

Conhecer todas cachaças

Caminhar pelas praças

Com cachaça de “A” a “Z”

27-Qualquer um se embriaga

Com cachaça de “A” a “Z”

Quando o cara é viciado

Bebe tanto até morrer

Perde logo o emprego

Da família o apego

E começa a sofrer

28-Lá no sul do país

Tem uma ta de guampa

E se não me engano

Tem também em Sampa

Mas é boa a caninha

Chamada de sinhazinha

Da que arranca a tampa.

29-Arrancou põe no copo

Ergue o mesmo logo bebe

Ela pela goela desce

Com um pedaço de lebre

Tira-gosto de primeira

Seja até na saideira

Beba e o copo quebre.

30-Quando perde o controle

Isso claro acontece

O bicho fica brabo

E logo enriquece

Enfrenta delegado

Às vezes sai algemado

E no outro dia esquece

31-Tudo que aconteceu

Saber fica sem querer

Some uns dias da favela

Pois tem medo de perder

Dos vizinhos, amizade.

E pra falar a verdade

É cachaça de “A” a “Z”

32-Vai beber novamente

Uma daquelas boas

Ou seja, até boinha.

Que se tem em alagoas

E deixa o cabra bebinho

Sem acerta o caminho

Ficando todo atôa

33-Voltemos aos nomes

Desta bela bebida

Que seduz e conquista

Deixa tonto na vida

Pois tomando cambraia

O cara cai na gandaia

E demora na saída

34-E dentro da gafieira

Vai cerveja e elixir

a catuta e a cobreira

Ai ele demora a sair

Atraca-se a morena

Dá-lhe beijos sem pena

Não precisa nem pedir

35--Quando chega sua hora

Começa a se despedir

O pobre bebum agora

Fica doido para ir

E a dona o segura

Chama-o de beleza pura

Para ele não fugir

36-Consome todo dim-dim

Dele não quer o prazer

Quando o doido se alisa

Põe logo para correr

E o bicho já lascado

Fica logo preocupada

Com a cachaça de “A” a “Z”

37-toma uma dose limpa

Para poder recomeçar

Pois a danada limpinha

O faz se apaixonar

Fica com a cara lisa

Capaz de levar uma pisa

Quando passa a abusar.

38-Às vezes com cuidado

Bebe uma ta mafunga

Para não ter problemas

Quando fica só de sunga

E por causa da mardita

Conhecida por birita

Começa com funga-funga.

39-Portanto meu amigo

Não tome esta bebida

Que passarinho não bebe

É a mesma jeritiba

Sei que a vontade dobra

Pelo assovio-de-cobra

Como pela chiquitita.

49-Januária, já começa,

Inox bidestilada,

Catuta, isca de bebo,

Bela cana imaculada.

Nome forte baronesa

Às vezes é a princesa.

Umas são boas geladas

50-Bebe homem e mulher

Só pelo fato de querer

Aliviar emoções

Ou então se entreter

Afogando a tristeza

Destruindo sua beleza

Com cachaça de “A” a “Z”.

Listei sessenta e sete

Se mexer, achamos mais.

Encerro os meus versos

Este cordel satisfaz

Não querendo ser ímpio

Nem beber o pau do índio

Pois disso não sou capaz.

Miguel Nascimento

Rio Largo – AL