ENXADA VELHA

Eu sou uma enxada velha,
Sou uma velha enxada,
Já cortei a terra seca,
Já cortei terra molhada,
Ja esperei paciente
Guardada com a semente
Que chegasse a invernada.

Me lembro que fui comprada
Numa barraca de feira,
Quando nova recebi
Um cabo de aroeira;
Hoje um cabo me suporta
De jurema preta e torta
Com cunha na cabeceira.

Já sofri com aridez
Do solo dessa caatinga,
Já bati em pedra dura,
Já quebrei até moringa,
Eu já feri pra valer
Agricultor, sem querer,
Com a cara cheia de pinga.

Eu já matei cascavel,
Já matei escorpião,
Eu já matei jararaca,
Já matei camaleão,
Eu já espantei formiga,
Já cortei muita urtiga
No meio da plantação.

Pertinho do pé de milho
Já tirei mato rasteiro,
Somente pro milharal
Poder crescer mais ligeiro;
Fiz o mesmo com feijão
Só pra ver a plantação
Efeitar o meu terreiro.

Se hoje vivo esquecida
O meu viver é um saco,
Guardada bem escondida
Na solidão de um barraco;
Sem ninguem me procurar
Tenho que me conformar,
Não passo de um velho caco.


IMAGEM: Google.