A pior seca

O sertanejo esperando

florir o mandacaru

só vê chegando urubu

e asa-branca voando

Com isso fica pensando

bastante contrariado

que o momento é chegado

de fugir pra capital

deixando a terra natal

de solo já enrugado

Procurando por barreiro

pra encher sua cabaça

nos lugares onde passa

consome um dia inteiro

Vendo muito atoleiro

que nem o gado sacia

sem chuva na freguesia

continua procurando

e as fontes vão ficando

mais distantes cada dia

Os rios de correnteza

secados na soalheira

são estradas de poeira

que percorre com tristeza

não mostrando a natureza

nem os sinais da mudança

Quando vê uma criança

passar num leito vazio

as águas daquele rio

correm na sua lembrança

Nos campos é acuado

pelo arbusto espinhoso

retorcido e venenoso

agressivo e ressecado

E o solo desfigurado

já febril e macilento

compara nesse momento

a um corpo agonizando

também ele esperando

cair a chuva sedento

Ele vê que em sua mão

a folha do jericó

esfarela e vira pó

caindo no pó do chão

E a feia vegetação

antes verde e viçosa

é a seca impiedosa

alastrada que só peste

mostrando pelo nordeste

a sua imagem nervosa

Existe algo pior

que sertanejo sem norte

vendo a face da morte

na paisagem ao redor?

Pois flagelo inda maior

que o da seca no sertão

fervendo num caldeirão

no ano de muito rasto

é florar o mata-pasto

dentro de um coração

Carlos Alê
Enviado por Carlos Alê em 04/10/2006
Reeditado em 08/08/2017
Código do texto: T255948
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2006. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.