LÁGRIMAS DO PASSADO

LÁGRIMAS DO MEU PASSADO

Cícero Modesto Gomes

Ao meu Deus quero pedir

Grande Rei do paraíso

Memória para escrever

Falar do que for preciso

Pois do que vou relatar

Eu me responsabilizo.

Batendo meu coração

Na hora de escrever

Falando de um lamento

De quem tanto vi sofrer

Que me deu vida e criou

Pra neste mundo viver.

Conheço que tudo devo

Desde minha geração

Na vida me ensinou

Cumprir a religião

Trabalhou pela família

Sem deixar faltar o pão.

Dando continuação

Falo bem do meu estado

Maranhão onde nasci

Dando volta no meu passado

E morando no interior

Trabalhando com cuidado.

Estava na Cajazeiras

Sempre de meus pais ausente

Quando chega uma notícia

Que papai estava doente

Foi mesmo que uma seta

Que crava o peito da gente.

Fiquei logo muito triste

Sem demora viajei

Pra ver em Igarapé Grande

Chegando não encontrei

Tinha ido a Terezina

Daí mais triste eu fiquei.

Grande dor senti no peito

Por ele já ter seguido

No final fiquei sem vê-lo

Por isso fiquei sentido

Voltei para Cajazeiras

Com um plano resolvido.

Horas e horas fiquei

Sem saber o que fizesse

Mas como em Deus eu confio

Sempre a jesus faço prece

Para quem vive isso é

Coisa que sempre acontece.

Influiu na minha ideia

Com um plano tão certeiro

Para ir a Terezina

A papai deixar dinheiro

Depois voltar para casa

Trabalhar de carpinteiro.

Tão jovem tinha por plano

Em pensar sempre direito

Quanto ao castigo de Deus

Tinha que ser bem aceito

Se não fosse de ter cura

Então ficava sem jeito.

Louvo a Deus supremo Pai

Misericórdia pedindo

De meus pais distanciado

Com tristes notícias vindo

Vi correntezas fazer

Muita lágrima caindo.

Meu peito sentiu um abalo

E o meu coração gelou

Viajei pra ver papai

Que não sei como chegou

Na viagem meu cunhado

Comigo também viajou.

No outro dia bem cedinho

Ouvi o cantar da cauã

Que é uma ave agoureira

Ao despertar da manhã

Quando deu as nove horas

Despedi da minha irmã.

O meu semblante mudou

Minha mana soluçava

Viajei triste por ver

Que nada me conformava

Viajando a pé pra ver

Se um transporte encontrava.

Pernoitando em Água Branca

Aonde o sono me trouxe

Pertubações e tristezas

E a viagem demorou-se

E espera de um transporte

Que para Pedreiras fosse.

Quando então caiu a noite

Soprava um vento tão forte

Foi que passou um caminhão

Pegamos aquele transporte

Em cima de carga sujeito

A todos reveses da sorte.

Regresso que eu fazia

Com pesar no coração

Fitava os olhos ao céu

Tão veloz o caminhão

Sem saber que papai tinha

Ficado internado ou não.

Se tinha sido internado

Se era finda a existência

Senti saudades ao passar

E a Deus pedi clemência

Quando vi Igarapé Grande

Nossa antiga residência.

Também não mais encontramos

Passagem com garantia

Ao chegarmos em Pedreiras

O último carro saía

Nós tiramos as passagens

Pra manhã do outro dia.

Um momento eu medito

Nossa vida é natural

Paramos no dezessete

Que é meu berço natal

Chega o expresso que vinha

Da linha de Bacabal.

Vi quase como um milagre

Misericórdia divina

Parou o expresso de luxo

Com tanta gente granfina

Foi quando avistei meus pais

Voltando de Terezina.

Xará tendo o mesmo nome

Mas não sente a mesma dor

Lamentável esta hora

Bem imagine o leitor

Quando se ver quase morto

Da gente o progenitor.

Zela o filho pelo pai

Quando mamãe me avistou

Que fui lhe tomar a bênção

Lágrimas no chão rolou

Como estava sua vida

De tristeza me contou.

Assim falando me disse

O teu pai estar sofrendo

Um grande baque levou

Veja o que estou dizendo

Desenganado do médico

Seu estado estais vendo.

Brilhou no meu pensamento

Uma fé pura e tão viva

Que em Terezina tivesse

Medicina positiva

Pra que eu visse com saúde

A desventura me priva.

Cheio de lágrimas seus olhos

Mamãe assim me dizia

Eu penalizado e trêmulo

Ia falar, não podia

E papai o seu estado

Jamais ninguém conhecia.

De que maneira eu estava

O leitor deve saber

Tomei a bênção a papai

Me abençoou com prazer

Tão decaído fazia

A gente se comover.

Era tão grave a doença

Que médico algum atrevia

A curar, pois tinha um olho

Perdido que nada via

As dores mais tormentosas

De vez em quando sentia.

Fitei vendo deformado

Com grande tumor na face

Mamãe fazendo promessa

Afim que ele escapasse

Mas fica sujeito a tudo

A pessoa quando nasce.

Grande martírio era o seu

Nesta viagem penosa

Sofrendo o mesmo tormento

Com lágrima copiosa

Sozinha junta com ele

A minha mãe temerosa.

Horroroso para mim

Tornou-se aquele momento

De ver o meu genitor

No mais triste sofrimento

E eu sem poder dá um jeito

Fiquei neste desalento.

Indo para Terezina

Terminou os nossos planos

Pelo encontro que tivemos

Com uma ajuda dos arcanjos

Onde eu tinha nascido

Já a vinte quatro anos.

Já fazendo oito meses

Que eu vivia separado

De papai que em Santa Inês

A pouco tinha chegado

Nas matas do Miarim

Era onde eu tinha ficado.

Lamentei muito em olhar

O seu estado e não poder

Dá um jeito e ainda mais

Me comoveu ele dizer

Sem ter engano queria

Perto dos filhos morrer.

Mil suspiros se dá

Num momento de agonia

Buzinava o motorista

Dando sinal que partia

Completo de passageiros

Que gente, mais não cabia.

Não se viajava antes que

As passagens fossem pagas

Desceram dois passageiros

E ficaram duas vagas

Imputamos esta ajuda

A São Francisco das Chagas.

O expresso viajava

Quem olhava causava dó

A poeira da estrada

Do chão levantava pó

Para hora do almoço

Parou no Peritoró.

Parada muita pequena

Para sermos bem feliz

Na cachucha entrocamento

Quem vai para São Luís

Na curva pra Bacabal

Prece ao Senhor Deus, eu fiz.

Quando chegamos fizemos

Logo em primeiro lugar

Casa para hospedagem

Tivemos que procurar

De um amigo velho seu

Teodorico Bacelar.

Regressamos a Santa Inês

Foi na agência Pindaré

Que tiramos as passagens

Na viagem tendo fé

No cordeiro do Deus vivo

Bom Jesus de Nazaré.

Sempre será bem guiado

Quem tem fé no Rei dos reis

Encontramos bem cuidado

Chegando a Santa Inês

Meu irmão de treze anos

E minha irmãzinha de três.

Tinham ficado na casa

De um vizinho que cuidou

Com todo carinho deles

Meu irmão assim falou

Mamãe onde estar papai?

Por que também não chegou?

Um momento parou e disse

Papai não estar presente

Do jeito que ele saiu

Daqui muito doente

Só parece é que morreu

Mas a mãe não diz a gente.

Vi quando mamãe falou

Para lhe esclarecer

Teu pai ficou em Bacabal

Pois não podemos trazer

Vamos embora e em outra

Terra nós vamos viver.

Xodó quem tem, também deixa

Vamos residir na mata

Pertinho da tua irmã

A sorte sempre é ingrata

E para seguirmos amanhã

A viagem não se delata.

Zunideira nos ouvidos

Todos sentiram na hora

Quem tem o costume na rua

Para mata ir em embora

Mas não pode ter alegria

Aonde a tristeza mora.

Arrumamos a bagagem

Retornando novamente

Ao vizinho agradecemos

Que cuidou bem paciente

Dos meus irmãos que ficaram

A criança e o adolescente.

Bacabal quando voltamos

Tinha feira ao meio dia

Para ir ao Lago da Pedra

Novo transporte seguia

Um misto estava na linha

Atendendo a freguesia.

Com a força que nos foi dado

O poder de quem nos guia

Nosso eterno Salvador

Numa tarde tão sadia

Colocamos as bagagens

Dentro da carroceria.

Do amigo deixamos a casa

Agradecemos até demais

Que tratou bem do papai

Chegando o dias finais

Seguimos naquela estrada

Avistando os palmeirais.

Em Lago de Pedra a noite

Dormimos numa pensão

Papai me fez um pedido

Que fizesse o seu caixão

Assim preferiu que fosse

Feito pela a minha mão.

Foi uma graça alcançada

Somente um ano eu teria

Papai fez meu caixão

Eu escapei da enxovia

Se eu tivesse morrido

Seu funeral não fazia.

Generosidade tinha

Um homem hospitaleiro

Trabalhei junto com ele

Na arte de carpinteiro

Como aprendi fiquei sendo

Da profissão um herdeiro.

Herança de pai pra filho

Conforme a profissão

Para o interior por sorte

Encontramos um caminhão

Para chegar no Angico

Pequena povoação.

Ia na estrada pensando

Que precisava encontrar

Tabuado de enfeites

Para o caixão preparar

Depois mostrar para ele

Antes de Deus lhe chamar.

Do Angico viajamos

Por um tropeiro levado

Ia um cavalo com sela

Para o papai ir montado

Com mais outros animais

Pois foi esse o combinado.

Chegando em casa tratei

De seu pedido cumprir

Para o ataúde fazer

Jamais pude desistir

Chora quem está tristonho

Já que não pode sorrir.

Filomeno era seu nome

Pra mamãe um bom marido

Chamado de mestre Silva

Tinha como um apelido

Pelo o seu serviço era

Sempre bem reconhecido.

Três meses no sofrimento

Contra o câncer resistiu

Depois que eu preparei

O caixão eu mostrei, ele viu

Me disse como pensou

Do mesmo jeito saiu.

Vinte oito de outubro

Foi que cobri o caixão

Foi no ano sessenta e três

Numa tarde de verão

No momento derradeiro

Botaram a vela na mão.

Dando o último suspiro

Para mim tudo mudou

Saber que não mais veria

Quem tanto me ajudou

Que seu percurso de vida

Neste momento acabou.

A noite de segunda-feira

O seu corpo foi velado

Em casa, e pela manhã

Pelo o povo acompanhado

Pro cemitério local

Onde ele foi sepultado.

Meu nome vou declarar

Sentido grande tristeza

Cícero Modesto Gomes

Pode até ser uma surpresa

Que do passado as lágrimas

No chão faça correnteza.

FIM

Cícero Modesto Gomes
Enviado por Cícero Modesto Gomes em 29/11/2011
Reeditado em 10/01/2012
Código do texto: T3363490