DILATANDO A PUPILA (VOLTANDO AO PASSADO)

DILATANDO A PUPILA DA MEMORIA

FORAM AS COISAS QUE NELA ECONTREI

01

Em lembrança viajo num momento

Pra buscar num passado preguiçoso

Não importa tristeza ou mesmo gozo

Desaguando o pomar do pensamento

A infância num gesto turbulento

Saudade do chicote que apanhei

Cada açoite uma pétala que ganhei

Pra somar nessa vida ilusória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

02

Minhas vacas de osso pelo chão

A poeira em cima dos brinquedos

As cartinhas lacradas dos segredos

Bem escritas no fogo da paixão

Ao reler dava a noite de plantão

Ao dormir quantas vezes despertei

Acordado, sonhando o que sonhei!

Não restou-me se quer uma vangloria

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

03

Um namoro, um beijo e um abraço

Um fora pesaroso ainda lembro...

Uma roupa comprada em dezembro,

Um sonho dividindo o mesmo espaço.

Esperança matando no cansaço...

A mulher que nem em sonho alcancei,

As palavras erradas que falei

Na linguagem matuta aleatória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

04

Enlatados, me lembro que não tinha

A indústria fornecia só jabá

Mais fácil uma piaba ou um preá

Pra o escape a mistura era farinha,

Que às vezes comia com sardinha

Ou água, quantas vezes saciei....

A sombra que jamais esquecerei

Nos frechais dessa mente provisória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

05

O vigor de menino já perdi...

A coragem da minha juventude,

Tentei reencontra-lá mas não pude

Bem maior à tristeza que senti

Na lembrança somente revivi

Foi num sonho profundo que tentei

A angustia mais forte controlei

Dessa mágoa fervente compulsória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

06

Lambú pé, gavião e urubu

Pinta silva, três coco e sabiá

Casaca emboladeira de um juá

Juruti, carcará e o carão.

Na ameaça cruel de extinção

Com pesar esse fato observei

Na chapada ou na brenha que deixei

São viventes na mente e na história

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

07

A anágua compondo um vestido

Foi usada nas mulheres das antigas

O timão bem composto nas barrigas

O tergal do liso e o colorido

Volta ao mundo também foi excluído

Sem voltar esse mundo de nem sei...

Procurei uma amostra e não achei

Para expor nessa pasta meritória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

08

Do cangaço não sobrou um cangaceiro

A garruncha por sinal foi esquecida

Uma turma de homens sem guarida

Só a pólvora e grude como cheiro

A riúna, fal e o artilheiro ...

No sertão cada bando tinha um rei

Mais ou menos nesse fato atinei,

Lampião deixou honra muita glória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

09

Palmilhando o nortista sobrevive

No fracasso, o dom que alimenta

Rodeado de dores que atormenta

Lágrimas são fiéis onde convive

Animado assistindo seu declive...

Insondável, sofrer que relatei,

Lentamente lembrando soletrei...

Quem não tem uma chance de vitória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

10

Bença pai, bença mãe, um bom dia

Foi assim que meu pai me ensinou

Com o tempo esse afeto dilatou

E as famílias perderam a harmonia

O respeito perdeu sua valia

Eu não posso dizer que acostumei

No carinho dos pais eu apanhei

Sem contar o valor da palmatória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

11

A lembrança eu sei que tem valor

Nos arquivos da mente e da saudade

Se o passado de ontem foi verdade

O futuro lhe enxerga incolor

O presente por certo é traidor

Por mudar o que agora apurei

Fui somar o valor e não somei

Não preencho se quer a promissória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

12

O jumento a cangalha e o cambito

A enxada honrando sertanejos

Vão brilhando traçando seus manejos

Só gemendo sem a força de um grito

Consagrado inda canta seu bendito

Merecia a coroa de um rei

Mais que isso eu já lhe nomeei

Mesmo sendo minha tese irrisória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

13

O passado é o presente da ativa

Vem vovô a vovó e os conselhos,

Pagina reluzente nos espelhos,

Dessa posse se conclui que é adotiva.

É a parte vigorosa e positiva

No castelo ilusório que formei.

Da escada do declive me armei

Resultado mais certo dessa escoria

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

14

Vai meu brado espargido no deserto

Resmungando um cordel chei de conflito

No alpendre do passado foi escrito

Nos arreios do confronto me aperto

Na secura da saudade que é o certo

Vão se indo os arranjos que formei

Tudo passa foi assim que informei

Na lembrança soletrando a oratória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

15

Quem não sente não sabe o quanto dói

Esse vulto postado sem querer

Uma réstia grudada no meu ser

Lentamente por dentro me destrói

Como a vaca faminta que remói

Com os dentes eu nada triturei

Mastigando onde nada mastiguei

Só a mente é quem é mastigatória

Dilatando a pupila da memória

Foram as coisas que nela encontrei

JAILTON ANTAS*****

Jailton Antas
Enviado por Jailton Antas em 12/10/2013
Reeditado em 16/11/2016
Código do texto: T4522235
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