Cordelando com Frei Dimão
Enquanto Terezinha suspira
ralando de sol a sol
umas boas férias você tira
e nada no corgo do Paiol. Frei Dimão
Esse corgo tem um feitiço
Que nem posso lhe contar
O juízo fica em rebuliço
Quando nele fico a pensar. Nanda
Sei que também no teatro anda
vivendo a dramaturgia
mas o que quero, boa Fernanda
é que evite qualquer orgia. Frei Dimão
A primeira personagem
Numa velha me desmaio
E numa segunda roupagem
Já sou uma “mãe de maio”. Nanda
Como ando bem complacente
e eivado de benemerência
vou esperar que se apresente
para u'a pequena penitência. Frei Dimão
Espero mesmo de coração
Que light seja seu lema
Sem muita aporrinhação
Que atrapalha meu esquema. Nanda
Quero que evite qualquer traste
e que diga de bom coração
que de namoro de paiol se afaste
tal como corre do de portão. Frei Dimão
Pode ficar sossegado
Que pus fogo no paiol
E o portão tão alquebrado
A culpa foi do espanhol. Nanda
Vou estabelecer uma tabela
e que seja tudo anotado
como beijos deixam seqüela
só as curarei com meu cajado. Frei Dimão
Dizem que beijos dá sapinho
Será que isto é verdade?
Me dá só um remedinho
Pra me dar imunidade. Nanda
Sei que andas casando neto
portanto, comporte-se bem
receberá assim meu afeto
e o beliscão como convém. Frei Dimão
O afeto eu quero e muito
Mas de beliscão eu tô fora
Se está com este intuito
Vou saindo sem demora. Nanda
É bom que se mantenha casta
fugindo e esse turbilhão
que a pureza da alma gasta
e bem só faz ao garanhão. Frei Dimão
Frei Dimão, o que é isto?
Que pensamentos retrógados
Aos carinhos eu não resisto
Com beijo e abraço alternados. Nanda
Para resistir à tentação
Ouça bem o que agora lhe falo
mantenha os olhos presos ao chão
e nem olhe embaixo de cavalo. Frei Dimão
Vou dizer pro Frei Dimão
Que está muito rigoroso
Me dê logo a absolvição
E o papo fica gostoso. Nanda
Você terá a recompensa
que tanto pediu ao Pai
Vê-lo-á em sua glória imensa
e por aí a vida vai. Frei Dimão
É isto o que mais espero
Nesta vida transitória
Do males me regenero
E vou cantar a vitória. Nanda
Chegará em suma altura
é o que digo redigo e biso
provará quando doce é a rapadura
que servem lá no Paraíso. Frei Dimão
Frei Dimão, vou confiar
No que está me dizendo
Eu não vou desafiar
As palavras do reverendo. Nanda
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Se um ban-lon verde tiveste
em meus tempos de seminarista
eu temo que um cabra-da-peste
andou passando-te em revista.
No alpendre de tua casa
vivias a namorar
da basculante, sem asa
pendurei-me a espiar.
O galã te dava esfregadelas.
que me faziam arrepiar.
que casto inda guardo seqüelas.
que não se podem curar.
Mas agora tudo isso passou
e eu peço ao Pai clemente
que as bênçãos que ora lhe dou
te tornem uma penitente.
Enquanto aguardo de Roma
o mais sacro alento
de providência que se toma
para meter-te num convento.
E que o ban-lon do passado
se ao acaso voltar a lembrança
seja ele transformado
em manto da bem-aventurança...
Frei Dimão
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Enfim, te converteste
e assim andas mais catita
meus ensinamentos aprendeste
e agora és irmã carmelita.
Frei Dimão
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05/09/2014 - Frei Dimão admoesta Nanda Araújo
Viraste carmelita então?
Não deixe pois, que vire a balsa
E comecemos com a benzeção
enquanto, carmelita, tás descalça
Bem que eu desconfiava
de meu instinto visionário
enquanto te esperava
orando no confessionário
Agora que os votos fizeste
segue bem a sacra doutrina
não deixes que um cafajeste
ensombreie o que te ilumina
E para que tenhas
u`a morada bem segura
por que comigo não embrenhas
na mais serena clausura?
Dar-te-ei sábia companhia
no ramo espiritual
ministrando-te a liturgia
que sobrepuja todo o mal
E que fiquem para trás
os atos de imaturidade
e o maligno vencerás
conquistando a perpetuidade
E se lembrares que um dia
desenrolou-se um drama,
enquanto banhavas na bacia,
co`um marmanjo sob a cama
Recorre pois à oração
que sempre encontrarás abrigo
fugindo à tentação
irás morar comigo
Juntos rezaremos o ofício
da Imaculada Conceição
enquanto me dás o orifício
que abençoarei em profusão
E juntos em contemplação
alcançarás o arrebol
sem namoro de portão
e sem encontro no paiol...
Frei Dimão
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Teu afastamento do Recanto
sabemos que é temporário
mas diz Jesus, homem santo
confiemos, todos, no Sacrário.
Sabemos que teu tempo é escasso
para múltiplas ocupações
e se penitência ora te passo
é pra afastar tentações.
E quando olhas pra bacia
pensando num bom banho
fecha bem a gelosia
pra evitar olhar estranho.
Assim também cuida do paiol
onde mora e cruel espiga
pois enquanto aguardas o arrebol
ela finge ser tua amiga.
Mas motivo de mais atenção
pra não ferir o decoro
está junto ao teu portão
onde proíbo todo namoro.
Frei Dimão
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E vai se formando um passivo
de indagações não respondidas
sinal de o tempo tens cativo
para ações das almas perdidas.
E quando sinto resistência
aos meus sábios conselhos
eu dobro a penitência
e a exijo de joelhos.
Mas se tiveres real pesar
dos pecados cometidos
vem em meu colo sentar
e os castigos serão diluídos.
E posso até ir mais além
anulando todo pecado
se me entenderes bem
e tocas meu sacro cajado.
Frei Dimão
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Finalmente o sinal deste
de tua augusta presença
vê agora, se investe
em reduzir tua sentença.
Andaste pelo Recanto
e comentário fizeste
falta agarrar com o santo
pra te livrares da peste.
A peste a que me refiro
e à qual muitos nomes se dão
mata mais do que um tiro
e se chama devassidão.
Ela pode causar muitos danos
pelo sacro desrespeito
dos assuntos ditos mundanos
que em minha fé eu rejeito.
Pega pois com Maria
pega pois com José
e corre pra sacristia
lá te espero de pé.
Vou te dar a confissão
se estiveres bem contrita
vem logo a absolvição
e te salvas da desdita.
E se tocas meu paramento
Sacro como ele é
pegue um negócio lá dentro
que é relíquia de fé.
Esse é um divino produto
que digo, repito e biso:
teu vero salvo conduto
para entrar no paraíso...
(Frei Dimão)
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Agora que deste o sinal
de teu retorno à lide
o livrar-te de todo mal
com meu desejo coincide
Mas já falas em passear
por Mônaco, Paris, Roma
o que deves é peregrinar
senão o maligno se assoma
E o que mais importante
pra que evites u`a nova fria
é saber bem adiante
quem terás por companhia
Enquanto o tempo passa
ouve bem o que disse o Senhor
se um dia é o da caça
o outro é do caçador
E que tudo se cumpra bem
pra evitar coisa malina
quero alertar também
se a companhia for masculina
Depois de seis da tarde
emito uma proibição:
sabendo que como o corpo arde
jamais vás até o portão
E se no sofá sentares,
vou ser peremptório:
seja só para rezares
diante de um oratório
Ao te recolheres ao leito
desliga-te das divagações
aquele recanto foi feito
para o recato e as orações
E se porventura sonhares
que sejam sonhos bem castos
nada de bailes ou bares
senão secarão os pastos
E o teu futuro vou antevendo
enquadrada em linha dura
ouvindo o teu reverendo
e se fechando na clausura
E se de antiga paixão
ainda pintarem fagulhas
toma logo a comunhão
enquanto o terço debulhas
Recuerdos quiçá terás
de teu namoro de paiol
que logo te arrependerás
se queres um lugar ao sol.
E lembra-te da confissão
que deves fazer contrita
no adeus a qualquer tesão
senão o Pai se irrita
E se ainda restar
um resquício de reticência
vou já já te ministrar
proporcional penitência
E aqui eu nem preciso
ser preciso como oráculo
basta-te um pouco de juízo
e te agarrar ao meu báculo!
Frei Dimão
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Nanda responde a Frei Dimão:
Estou bastante atrasada
Com as minhas confissões
Oh, meu frei, que bagunçada
Neste mundo de atrações!
Tive que dar um sumiço
Para um lugar distante
Longe de qualquer rebuliço
Sem chamado cintilante.
Pensa que virei carmelita
Por causa daquela roupagem?
É uma vocação bem bonita
Mas não tenho esta coragem.
Estive mesmo no Carmelo
E lembrei-me de Frei Dimão
Meu pensamento aqui revelo
Que isto iria achar muito bom.
Muitas horas em meditação
Seguindo seu sábio conselho
Estaria livre da condenação
Pois ali não me destrambelho.
Agora contrita venho confessar
Ao mui venerável Frei Dimão
E o senhor pode acreditar
Que pecado não tenho não.
Uma coisa posso-lhe garantir
Com forte e grande convicção
Que lá não tem como existir
Nem paiol e nem portão.
Então que seja bem suave
O que vier de penitência
Pois não tem nada de grave
Nesta minha conferência.
Nanda Araújo
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De lado deixamos Terezinha
em meio à troca de tiros
perdoe a ingerência minha
que nem provei dos suspiros.
Mas passando ao livro sagrado
sobre o qual porás a mão
descobrirás que teu fado
é contrita confissão.
Nas tuas flertações
saibas que ando de olho
elas são veros senões
que, contrafeito recolho.
Precisas retornar à doutrina
sacra que ora lhe confio
pois sabes bem menina
que sou curto de pavio.
Assim uma forma encontrarei
e a que se me afigura
inspirado em Cristo-Rei
melhor meter-te na clausura.
E no casto recolhimento
o terço debulharás
e pra livrar de tormento
meu bastão tocarás.
(e vade retro, Satanás)
Frei Dimão
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Frei Dimão é entusiasta
De uma vida em clausura
De uma vida toda casta
E com muita compostura.
Fico muita admirada
De ter este pensamento
Será que é avesso à balada
E vive de arrebatamento?
Se pensei acertadamente
Se sua vida é na clausura
Vou seguir prudentemente
E querer sua benzedura.
Mas se gosta de escapulida
Antes que chegue o arrebol
Estarei também absolvida
E voltarei para o paiol.
Também me agarro ao portão.
Digo isto, se por ventura
Não aparecer Frei Dimão
Me mostrando a escritura.
Nanda
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Nosso embate revelaste
pra todo esse Recanto
sinal que não valorizaste
o meu lado mais santo.
Ao invés de botar mãos postas
e ir a caminho do céu
no fundo vejo que gostas
das insídias do cordel.
Em dura penitência
hei de te postar de quatro
pela grave concupiscência
de tua troupe com o teatro.
Onde é que já se viu
vestir-se de irmã carmelita
crime mais torpe e mais vil
esses pecados a gente evita.
E esse teu diretor
por ele muito lamento
quando peca, contra o Senhor
te digo que não é bento.
O teatro eu reprovo
embora arte milenar
e aqui meus votos renovo
para que o troques pelo altar.
Essa terra dos Candidés
anda cada vez mais profana
deixa tudo, lava teus pés
vem pro claustro uma semana.
Conduzir-te-ei na sacra doutrina
onde o banho é de bacia
e dessa droga que alucina
serás liberta num dia.
E basta que confies em mim
e que na fé te enfoques
e que em meu cajado, enfim,
com toda fé, nele toques.
Frei Dimão
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Se é para entrar no céu
Qualquer coisa eu farei
Lavo os pés, ponho o véu
E com este monge cantarei.
Quero, sim, a absolvição
De todas as minhas faltas
Paro com a agarração
No namoro de portão.
E vou ser uma carmelita
Mas daquelas de verdade
E estarei toda catita
Quando aparecer o abade.
Direi sempre, “sim, Senhor”
A todos os seus conselhos
Que nada seja abrasador
Pois vou receber de joelhos.
E para bem finalizar
Esta minha confissão
Quero ao menos abraçar
Ao bondoso Frei Dimão.
Nanda Araujo