O caçador de assombração

Eu e mais meu jumento valente

Temos muita história minha gente

Para mó de logo lhes apresentar

Andamos por todo esse Brasil

E num tem lugar que nunca viu

O cavaleiro do jumento passar

A primeira cidade que visitamos

Foi por um trabalho que aceitamos

Uma assombração desassombrar

Na cidade sertaneja de Pombal

Onde um espírito daqueles do mal

Estava aos moradores atormentar

Padres, pastores não tinham conseguido

Até pai de santo da luta saiu ferido

Ao tentarem exorcizar a assombração

O prefeito estava bastante desesperado

A mim e meu jumento todo preocupado

Veio pedir humildemente uma salvação

Eu que de medo não tenho nada

Fui atrás da criatura mal assombrada

Mandar ela enfim ao encontro do cão

Depois de três horas e meia de caçada

Após entrar adentro na madrugada

Eu e jumento valente tivemos uma visão

Um bicho no céu passou bem avoando

Meus pelos tudinho foram se arrepiando

A criatura logo da gente desceu atrás

Sem conseguir acreditar no que via

Rezei para Deus e para Virgem Maria

Ajudarem a eu matar a besta de satanás

Parecia uma quimera da antiguidade

Bufafa forte com maldade, perversidade

Senti sua vontade, querendo nos matar

Montado firme em meu bravo jumento

Não tremi sequer apenas um momento

Puxei meu facão e fui cavalgando lutar

Meu facão melei com sal e água benta

Que qualquer besta e vampiro arrebenta

Mata os filhos do capeta tudo queimado

Quando bem cheguei perto da criatura

Pulei com tamanha heroica desenvoltura

E meti uma facãozada no quengo do safado

No mesmo instante a peste desapareceu

E, rapidamente, o nosso céu esclareceu

A paz na cidade de Pombal voltou a reinar

O meu primeiro trabalho foi bem sucedido

Na cidade fui um caçador muito querido

Fiquei conhecido em tudo que é lugar

Depois fomos a sertaneja Cajazeiras

Pois a população daquela cidade inteira

Sofria com um lobisomem sombrio

Quando chegava a noite de lua cheia

Onde a lua fica grande, tudo encadeia

Sair de casa era um perigoso desafio

Trezes pessoas tinham sido assassinadas

Todas estavam pra lá de desesperadas

Não sabiam nem mesmo o que fazer

Contrataram a mim e a meu jumento

Pra gente acabar com tal sofrimento

Fazer o lobisomem de vez desaparecer

Eu peguei uma espingarda de prata

Que a todo monstro peludo mata

E saí forte, cavalgando na escuridão

Depois de várias horas procurando

Encontrei a besta se transformando

Meti uma pedrada em seu cabeção

A besta orelhuda ficou bem irritada

Pôs-se a dar uma carreira danada

Veio com toda em minha direção

Eu com a maior calma do mundo

Dei uma rasteira no ser imundo

E disparei um tiro no seu coração

Depois de mais um trabalho realizado

No Nordeste já tava todo considerado

Era o melhor caçador de assombração

Depois o povo lá das bandas do sul

Daqueles que repetem demais o “Tu”

Me pediram uma brava intervenção

Queriam que eu fosse para lá viajar

Que um monstro estava a atormentar

Os moradores da cidade Santa Maria

Eu o trabalho pedido logo aceitei

Com jumento valente pra lá cavalguei

Viajei por cento e vinte horas: cinco dias

Lá chegando, fui rapidamente descansar

Acomodei meu jumento e fui deitar

Pense num sono; o dia todinho dormi

Quando acordei fui saber da situação

Dar cabo em mais uma assombração

Fazer o povo gaucho novamente sorrir

Até a residência do prefeito me levaram

No caminho muitas histórias me contaram

Coisas que fariam qualquer um se mijar

Mas como sou cabra demais valente

Não existe no mundo minha gente

Alguém que consiga me amedrontar

À casa do prefeito a gente chegou

O doutor educado me recepcionou

E terminou das histórias me contar

Disse que me daria o que eu pedisse

Se fosse eu o cabra que conseguisse

Encontrar a besta fera e ela matar

O trabalho pedido eu alegre aceitei

Peguei jumento valente, o montei

E fomos atrás da besta fera acabar

Seguimos o caminho que foi ensinado

Sem medo, mas um tico preocupado

Do que iria muito em breve encontrar

Fomos subindo uma grande serra

Onde o forte sol lá enfim encerra

Caçando mais um filho do capeta

Passando por fechados arbustos

Eu e meu jumento levemos susto

O mostrou tinha feito uma cruzeta

Esperou o momento da gente passar

Para nas costas da gente logo pular

Pegar eu e valente desprevenidos

Assim que nas costas da gente pulou

Jumento um coice com raiva soltou

Fez o monstro cair no chão perdido

Com os dentes de sangue melados

Percebi que ele tinha se alimentado

Fiquei com ódio; ainda mais furioso

Pulei rápido na garganta do safado

Com os pés o matei devagar, asfixiado

Mandei pro inferno, o maldito tinhoso

Assim foi a minha vida; minha história

Sempre bem vivida, recheada de glórias

Por todo o meu lindo, grande país andei

Juro que até hoje nesse imenso Brasil

Não há um cidadão sequer que não ouviu

Sobre os mais de mil monstros que já matei