Vida no campo
O trabalhador rural
Quase sempre é esquecido
Para ele isso é normal
Não fica desiludido
Quase sempre ganha mal
Pelo trabalho exercido.
A vida no campo é bela
Assim sempre é declamada
Por quem não sabe que ela
É dura e assoberbada
Em geral ela é aquela
Que há no cabo da enxada.
La o ar é sempre puro
Diz assim o saudosista
Que apesar do esconjuro
La na roça é um turista
La na roça é tudo escuro
Novela não se assiste.
La se planta o que se come
Diz quem não sabe plantar
Esqueceu que la há fome
Mesmo pra quem trabalhar
A saúde se consome
Para o outro alimentar.
La a água é sempre limpa
Assim diz o acomodado
Que não sabe que cacimba
É um buraco alagado
Para ele existe ainda
O trabalho escravizado.
La há sol, há lua cheia,
Assim diz o sonhador
Está com a barriga cheia
Liga o ventilador
Folga a sua correia
Quer silêncio, por favor.
Poucos la usam calçados
Vivem com a natureza
Isso diz o recalcado
Que viu lamparina acesa
Mas não sabe que o roçado
Traz em si muita aspereza.
O trabalho assaz pesado
Exige pouca destreza
A comida é requentada
Numa fogueirinha acesa
Sua calça é remendada
No falar mostra tristeza.
Alimenta a utopia
De vencer a sua guerra
Suportando a agonia
De olhar para a serra
Onde espera algum dia
Ter um pedaço de terra.
Quando planta uma lavoura
O patrão quer a metade
Dá o chão que tem vassoura
Que há na propriedade
Pra depois pôr algum touro
Pra deixar posteridade.
Se o rebanho do patrão
Rompe a cerca de arame
Come toda a plantação
Deixando somente a fome
O patrão prega um sermão
Diz a todos que se danem.
A mulher é lavadeira
Lava a roupa do patrão
Também é arrumadeira,
Passadeira e de fogão
Trabalha a semana inteira
Sem direito a ter um pão.
O filho é analfabeto
Quer ser jogador de bola
O patrão diz que é afeto
Quando dá alguma esmola
O garoto é objeto
Nunca foi a uma escola.
A filha é a empregada
Pra cuidar do senhorzinho
Ela também ganha nada
Quando muito um vestidinho
Não pode ter namorado
Seu destino é ser sozinha.
Se um dia aposentar
Coisa que não é comum
O patrão vai procurar
Para exigir algum
Que jamais irá pagar
Diz que não deve nenhum.
No final da sua vida
O trabalhador rural
Vai ver que a sua partida
É vista como o sinal
Pro velhaco ou vigarista
Imitar seu ritual.
Aproxima da viúva
Diz que ama a sua filha
Diz que a vida faz curva
E que a sua sorte brilha
Ele quer é que a viúva
Trate da sua família.