Contando o passado

Hoje velho e cansado

Recordo o meu passado

Com amargura e emoção

Vou contar a minha história

Que ainda tenho na memória

De uma triste desilusão

Foi num baile de um amigo

Que para o meu castigo

Conheci uma linda morena

Percebi pelo seu olhar

Que ela queria me namorar

Aí começou o meu problema

Começamos a namorar

Mas para o meu azar

Ela sempre mentia

Pensava que era otário

E no conto do vigário

Odiotamente eu caía

Cada cano que ela dava

O namoro eu terminava

Ela me enviava cartinha

Dizendo que estava sofrendo

Nem dormindo e nem comendo

Que grande amor por mim tinha

Quanto mais o tempo passava

Mais dela eu desconfiava

Estranhava seu comportamento

Cada dia mais apaixonado

Era louco alucinado

Minha vida era tormento

Lembro que numa noite

Para mim foi um açoite

Em pleno sabadão

Fui trabalhar contrariado

Com o peito machucado

Temendo uma traição

Enquanto eu otário

Com um tal de Januário

Ela dançou a noite inteira

Vieram me contar

Resolvi de me vingar

E fazer uma besteira

Passado uns dias

Para minha melancolia

Um amigo me entregou

Uma carta do Januário

E me disse: deixe de ser otário

Outra vez ela te enganou

Deu o endereço do amigo

Pensando evitar o perigo

E ninguém desconfiar

Se a esposa dele recebesse

Talvez ela escondesse

Que ninguém ia notar

Como sou um homem discreto

Tudo o que faço é concreto

Não abri a carta, embora a curiosidade

Estivesse quase me matando

O meu ódio foi aumentado

Matá-la era minha vontade

Esfriei a cabeça e caprichei

Uma carta enviei

Ao meu recente rival

Contado-lhe toda história

Ele me respondeu com glória

Me chamando de anormal

Terminei tudo imediatamente

Jurei que aquela serpente

Eu não a queria nem pintada de ouro

Fiquei sabendo que o moço

Fez um tremendo alvoroço

Enchendo a de desaforo

Muito meses ela ficou sozinha

Começou a me enviar cartinha

Dizendo estar arrependida

Jurando que me amava

Eu de novo acreditava

Naquela mulher mesquinha

Como quem ama perdoa

Voltamos num boa

Resolvemos noivo ficar

E para todo esse dilema

Para acabar com o problema

Resolvemos nos casar

É necessário eu entrar

Nesse detalhe e explicar

Ela era muito pobrezinha

Morava num cômodo só

Dava pena, dava dó

Nem luz elétrica tinha

Parecia brincadeira

Eu sentia numa cadeira

Ela sentava na minha frente

Nada de beijo, de abraço

Nem pensar num amaço

Sua mãe era uma serpente

A mãe dela ficava na cama

Espiando todo drama

Do nosso namoro antigo

E na hora da despedida

Ela nos acompanhava na saída

Era um verdadeiro castigo

Eu noivo, com casamento marcado

Sendo assim vigiado

Malmente pagava na mão

Aquilo era muito desaforo

Mas para terminar ao namoro

Não ia aguentar a paixão

Até um dia apareceu um vizinho

Dando uma de bonzinho

Colocou luz no barraco

Deu-lhe emprego de balconista

Para aquela vigarista

Dar um ponta pé no meu saco

Fiquei sabendo que ela de minissaia

Foi tomar banho de praia

Junto com o seu patrão

Aí não teve mais jeito

Resolvi tirar do peito

Aquela louca paixão

Rompi o noivado, pedi a aliança

Tirei a ideia de vingança

Me mudei pra capital

Fui morar com o meu padrinho

O chefe era seu vizinho

Me arrumou de servente geral

Fábrica de tinta Suvinil

A melhor do Brasil

Eu todo cheio de vontade

Em todo setor que me colocava

Minha habilidade eu mostrava

Com muita facilidade

Com pouco tempo fui promovido

Eu era era muito querido

Meus chefe e os companheiros

Passei a ser escriturário

Dobrou o meu salário

Mas não guardava dinheiro

Fiquei sabendo estava arrependida

Transformou-se em mulher da vida

Uma tremenda amargura

Eu tornei-me num terrível namorador

Me fechei para o amor

Viva somente de aventura

Até um dia conheci, a querida

A mulher da minha vida

Que me ensinou a amar de verdade

Faz 43 anos de casado

Sou um homem apaixonado

Na mais plena felicidade!

Dedico este cordel à minha amada esposa Nilza, mulher que me compreende, me completa e me faz feliz!