FRUTUOSO E ZÉ PINTADO
Sumiu Lissa de Frutuoso,
Homem terrível e tinhoso,
Sanguinário quando convinha.
Lissa, de cheiro e beleza,
Tratada como princesa,
Da nascença até mocinha.
Há de ser Zé Pintado,
Pensou Frutuoso irado.
Aquele bandido da feira,
Não tarda, vai ser achado,
Nem que seja agachado
Na saia de Ló Pereira.
Frutuoso, faca e pistola,
Raiva que mata e degola,
Saiu em busca do macho.
Na feira, grande alvoroço,
Bem na hora do almoço.
Não adianta fugir. Eu acho!
Onde o cabra se escondeu?
Zé, de muito, escafedeu.
Frutuoso bufava forte.
Ló Pereira bem sabia,
O lugar que se escondia,
O Zé jurado de morte.
Vai ver, foi pra igreja,
Esse baitola cereja,
Dedurou Tião Moisés,
Chifrudo, de termo passado,
Por obra de Zé Pintado.
Covarde, mijava nos pés.
Zé Pintado tinha fama
De roubar donzela e dama,
Bem antes do alvorecer.
Fugia montado a cavalo,
Ligeiro que nem estalo,
Pra distante se esconder.
Frutuoso insistiu,
Pra Igreja ele seguiu.
Frei Gouveia o aguardava,
Pronto a esclarecer:
Não veio aqui se acolher,
Noutro canto se achava.
Zé Pintado é cabra incerto,
Nunca ficava por perto,
Varava brejo e montanha.
Caatinga pra ele é relva,
Não respeita nem a selva,
Nem lhe falta artimanha.
Não deixo isso por pouco,
Por Lissa, eu fico louco,
Bradava o valentão.
Sou de perder o miolo,
Se alguém me fizer de tolo,
Corto todinho a facão.
Dali, já bem distante,
Zé Pintado e sua amante,
Aqueciam-se na fogueira.
Atrás de uma lapa cerrada,
Bem no sopé da chapada,
Se encontrada, a derradeira.
Lissa jurava-lhe amor,
Relatava-lhe o horror
De viver com aquele tal.
Apanhava todo dia,
Pra dormir era agonia
Ao lado de um animal.
Ainda batia-lhe o medo
Mas, disso fazia segredo,
Ter de um dia de voltar
Pra casa de Frutuoso
Viver com aquele seboso?!
Preferia se acabar.
Juntos por muitos anos,
Vivendo como ciganos,
Um tempo em cada lugar.
Temendo ódio e vingança
Mas, curtindo a esperança
De um dia poder voltar.
Saudades de Ló Pereira,
Amiga e mãe criadeira,
Do vigário, Frei Gouveia,
Do botequim de Sofia,
Da turma da pescaria,
A falar da vida alheia.
Coisa que vem na mente,
De quem ama sua gente,
Pensando pra lá voltar.
Quem sabe o mau Frutuoso,
Fique bem menos raivoso,
E possa até perdoar.
Um dia chegou notícia,
De que enfrentando a polícia,
Frutuoso morreu baleado.
Já com filho, voltou o casal,
Em casa, varanda e quintal,
Agora, Lissa de Zé Pintado.