São João da Rua da União
Na última fogueira junina
Quando já acabara os milho
Ouvi a zueira matutina
Dum forrozin bem tranqüilo
Era a Rua da União
Comemorando o seu São João
Pensei até que era delírio
Delírios esses por causa
Das lembrança cá em mim
Então dei uma pausa
E pensei comigo assim
Isso me deu até saudades
Das coisas de minha cidade
Lá no agreste, em Surubim
Logo desci pra conferir
Mesmo estando sem dinheiro
Ao chegar logo vi:
Um zabumba e um sanfoneiro
Era um ambiente família
Organizaram uma quadrilha
Fizeram da rua um terreiro
Muita gente num tinha não
Mas com eles não se engane
Por causa da animação
Parecia até um enxame
Tinha gente de toda idade
Num lugar de tranqüilidade
Tava eu, a sogra e Viviane
Depois de muito dançar
Já dando dor na barriga
Para poder descançar
E recomeçar em seguida
Foi quando fiquei abismado
Com um velhinho animado
Que tava ca gota e ca bixiga
Ele saia por lá sozinho
Se enfiando no meio do povo
Sua filha com carinho
Ia buscá-lo e trazer de novo
Ela com toda paciência
Ele com aparente inocência
Tentando fazer o seu jogo
Depois de dançar ca filha
Em seguida c’a sua mulher
Não gastando sua pilha
Ainda ficou lá em pé
Sério feito porco mijando
Com o pescoço se esticando
Parecendo um garnizé
Ele estava tão centrado
Olhando numa só direção
Que quando questionado
Dizia: simbora agora não
Percebi que de todo jeito
Ele só iria ficar satisfeito
Ao cumprisse sua missão
Quietinho no meu canto
Me senti como um aprendiz
Vendo aquele aparente santo
De movimentos sutis
Indiferentes aos outros tantos
Se render aos encantos
Da morena e seus quadris
A mulher de cor parda
Tava muito bem vestida
Parecia está de farda
De calça branca comprida
Igualzinho a uma enfermeira
Linda, serena e faceira
Pronta pra salvar vidas
Nunca imaginei na vida
Ver beleza em tal cena
Num cortejo duma investida
Num forró como arena
E no meio daquela festa
O veio franziu a testa
E partiu para a morena
Com toda a sabedoria
De seus cabelos brancos
Com elegância e ousadia
Mesmo que ainda manco
Saiu aos pouquinhos
Fazendo o seu caminho
No meio dos solavancos
Quietinho na sua, sossegada
Distraída naquele forró
As lapa de perna incruzada
Arrochada feito um nó
Só pudia ser solteira
Uma mulé dessa de bobeira
Não poderia está só
O velho muito destemido
Repleto de confiança
Foi ao pezin do ouvido
Pertinho de suas trança
E fez o seu convite:
A senhorita me permite
O prazer dessa dança?
Sem dó e sem pena
Sem muito o que dizer
E não foi o que a morena
Aceitou pra valer
No balanço da labirintite
Ele feliz no seu convite
Começou a se remexer
Abraçou aquele mulherão
Com toda a sua compostura
Laçou como um cinturão
Arrudiando aquela cintura
Se enquadrou nos quadris
Brincou por ali feliz
Com tanta formosura
Admirei o senso esportivo
Da atitude daquela moça
Aquele mestre se fez ativo
Nos ribuliço daquelas cocha
Mesmo magro feito triziu
O véi lá se garantiu
Até as perna ficar roxa
E na virada do baião
Ele não ficava quieto
E dava um rudupião
De movimentos corretos
Acompanhava a sanfona
Arrochando sua dona
Um dançarino completo
Valendo se de sua fama
Ele não deixava barato
Pilotando a sua dama
Um cavalheiro de fato
Tratando a como donzela
Era a coisa mais bela
Só faltou um retrato
Terminando a canção
Ele levou-a a sua mesa
E com sua educação
Agradeceu com fineza
Deu as costas e partiu
A moça calada sorriu
Diante de tal delicadeza
C’a mulé e a fia de tucaia
Ele voltou pro lugar
Conhecendo o rabo de saia
Num quiseram questionar
Mesmo na terceira idade
Em prol de sua felicidade
Valeu a pena se arriscar
Quando chamaram embora
Finalmente ele aceitou
Tinha terminado a história
Sua missão completou
A conta do bar pagaram
Todos se levantaram
E ele na bengala se apoiou
Bengala esta que esquecida
Em qualquer cantin de pé
Já que’a vontade destemida
Lhe deu fôlego, força e fé
Agora devolta a sua escora
Que ele quase joga fora
Por causa daquela mulher
E pra a minha surpresa
Aquilo tudo não acabou
Ele voltou áquela mesa
Pra o adeus com ela falou
Lembrando seus carnavais
Sem ter intenções sensuais
A mão dela ele beijou
Se eu fosse esse senhor poeta
E a moça como eu de surubim
Lá de minha infância sapeca
Eu escreveria um bilhete assim
E jogava pela sua janela
Para quando eu lembrar dela
Ela lembrar se de mim
“Quando lembro d’ocê, moça
Tomando banho de açude
As lágrimas se fazem poça
Aposento minha juventude
Ponho de luto minha alegria
Vira vulto qualquer companhia
Entra em coma minha saúde
O que eu mais queria agora
Era lembrar com todo esforço
Daquelas lindas histórias
Dos tempos que fui moço
E te dar um abraço bem forte
E assim ter novamente a sorte
Dum cheirin no pé do teu pescoço”