O ENCONTRO DO ELEITOR ZÉ RUFÃO COM O DEPUTADO NESTOR PROMISSÃO
Meu caro amigo leitor
De folheto popular
A sua atenção eu peço
Pro caso que vou citar
Do eleitor Zé Rufão
Com o Nestor Promissão
Que se deu nesse lugar.
No Sítio Arapuá
Nos cafundós do sertão
Do estado da Paraíba
Habitava o Zé Rufão
Esse pacato matuto
Na leitura ele era bruto
Porém ele besta, não!
Era época de eleição
O Rufão foi à cidade
Fazer compras costumeiras
Pra sua necessidade
Logo, então, se deparava
Com Nestor que discursava
Ali pra comunidade.
Pra matar curiosidade
Do palco se aproximou
Em tais palavras bonitas
Muito atento ele ficou
E o que Nestor dizia
Rufão com sabedoria
Lá na cachola guardou.
Muito tempo se passou
O Rufão não esqueceu
O que ouviu naquele dia
O que Nestor prometeu
Todas aquelas promessas
Não passaram de expressas
Já que nada aconteceu.
O Zé Rufão resolveu
Procurar esse Nestor
Foi até o gabinete
Desse jovem promissor
Se apresentando a ele
Disse-lhe: eu sou aquele
Que acreditou no senhor.
Então, me diga, doutor
O que foi que aconteceu?
Você esteve doente
Algum bicho lhe mordeu
Que mal o sertão lhe fez?
Faz mais de ano talvez
Lá você não apareceu.
Nestor empalideceu
Ficou, pasmo e sem ação
E para responder as
Tais questões de Zé Rufão
Pois logo ele desconversa
E deu essa adversa
Ridícula explicação.
Você tem toda razão
Vir aqui me procurar
Em nome do meu partido
Pois queira me desculpar
Desde já está agendado
Fique despreocupado
Lá no sertão vou voltar.
Nestor para que desculpas
Já basta a embromação
Pois vocês só nos procuram
Em época de eleição
Porém tim-tim por tim-tim
Vais me ouvir até o fim
Que você queira ou não.
Deputado cadê à luz
Pro Sítio Arapuá?
Até agora só vi
Luz de vaga-lume lá
Se depender de você
Já vi que esse á-bê-cê
Nunca sai do bê-á-bá.
Zé Rufão pode apostar
O Nestor lhe respondeu:
Hoje mesmo meu amigo
Eu desato esse nó seu
Vou ligar pra o gabinete
Do senador Clarinete
Que é do partido meu.
Zé Rufão lhe rebateu
E muito provocador
Onde está a ambulância,
A enfermeira e o doutor?
Queixa é só o que tem
Sempre na boca de alguém
Essa jura do senhor.
Nestor não se intimidou
Disse-lhe: com precisão
Oh meu correligionário
Meu caro amigo Rufão
A ambulância, enfermeira,
Já, já com doutor Junqueira
Logo vai pra região.
Também tá encaminhado
Lá pra sua região
Um plano de moradia
É o maior do sertão
Desde já estás convidado
Para cortar ao meu lado
Fita de inauguração.
Rufão fixou-lhe o olhar
Odioso à provocação
Respondeu: para Nestor
E com muita educação
Doutor, não tenho leitura
Só entendo de agricultura
Porém não sou besta, não!
Essa sua sugestão
De nada me agradou
Você que é autoridade
Pode pedir que eu lhe dou
Uma quarta de feijão
Uma arroba de algodão
Aplaudi-lo eu não vou.
Pois me responda Nestor
Cadê o grande hospital?
Que seria construído
Pra depois do carnaval
E tantos já se passaram
Quantos blocos desfilaram
No seu pleito eleitoral.
Na maior cara de pau
O Nestor se defendeu
Disse: amigo Zé Rufão
É pouco o alcance meu
Porém peço paciência
Aquela sua incumbência
Expedi para Aristeu.
Esse tal também é outro
Mente feito um camelô
Ele é mais enrolado
Do que carta de tarô
Nem tudo que brilha é ouro
E nem todo boi é touro
Já falava o meu avô.
Zé Rufão continuava
Na sua vindicação
Para Nestor assim disse:
Você preste atenção
O senhor fique esperto
E fique de olho aberto
Em breve tem eleição.
Cá nas bandas do sertão
Vosmecê está marcado
O que você prometeu
Nada foi concretizado
Ouvi o povo dizer
Que você vai responder
Diante do eleitorado.
Por isso tome cuidado
Meu caro rapaz Nestor
Quem avisa amigo é
Pois sabe disso o doutor
Esse dito é mais velho
Que o próprio evangelho
Do nosso Pai Redentor.
O Nestor não se abalou
Com o aviso de Rufão
Respondeu-lhe bem assim
Eu gosto de emoção
Aliás, aposto contigo
O povo estará comigo
Nessa próxima eleição.
Você tem toda razão
Caro amigo deputado
A besta aqui sou eu
Ouvindo palavreado
O melhor que faço agora
Retirar-me e ir embora
De volta pro meu roçado.
Você não é o culpado
Prometer e não fazer
Responsáveis somos nós
Que votamos, a saber,
Uma praça e um chafariz
Já faz o povo feliz
O resto pode esquecer.
Caro amigo Zé Rufão
Responda-me, por favor
Se você fosse político
O que faria o senhor?
Barba, cabelo e bigode
Ou dançava um pagode
Para agradar o cantor.
Essa pergunta doutor
Não sei eu lhe responder
Política nada entendo
Nem almejo entender
Só abranjo o meu roçado
Do meu cachorro pintado
E a cadela bem-querer.
Eu não quero me meter
Nesse tema de política
É coisa para bacana
Não para gente titica
Gosto mesmo é do roçado
Da cadela e seu pintado
E da vaquinha peitica.
Raimundo de Dona Chica
Pois comigo comentou
Tem boato no sertão
Sei lá onde ele escutou
Que o doutor deputado
Se já era afortunado
Mais rico agora ficou.
E você acreditou?
Nestor indaga Rufão
Seja o que você ouviu
É uma mera falação
O meu intento maior
Fazer sempre o melhor
Para o povo do sertão.
Tenho consideração
Com o meu povo eleitor
Sei de suas precisões
Sua, fome e sua dor
Por onde eu tenho andado
Sempre tenho observado
O nosso trabalhador.
O Rufão disse: doutor,
Você está de brincadeira
Queres enganar a quem?
Essa não é a vez primeira
Que o povo do sertão
Só escuta embromação
A sua vida inteira.
É a máxima da besteira
Que já ouvi de você
Oh meu caro deputado
Deixe de tereterê
Tenha ao menos dignidade
Sabe-se que não é verdade
Que se diz em comitê.
Pois deixe de fingimento
Meu caro amigo Nestor
Eu recordo muito bem
Do discurso do doutor
Sei lá por que dei ouvido
Fui vítima do seu alarido
Sendo assim seu eleitor.
De que vosmecê falou
Nada foi realizado
Agora vem me dizer
Que está preocupado?
Pobre de mim eleitor
Que é outro pelo senhor
Que também foi tapeado.
Rufão não fique zangado
Meu mandato não acabou
O Nestor lhe respondeu:
E dele também zombou
Ano que vem lhe garanto
Vou trabalhar mais um tanto
Para quem em mim votou.
Oh deputado Nestor
Vossa lábia em mim soais
Não esqueci os juramentos
Nem de outros festivais
E dessa sua professa
Abastada de promessa
Já estou farto demais.
Cadê aquele rapaz
Avesso à corrupção?
De punho unido gritava
Cana para esse ladrão
Ao se eleger deputado
Você ficou mascarado
Virou Nestor Promissão.
Oh meu caro Zé Rufão
Você está mal informado
Todo mês subo à tribuna
Pelo assalariado
Apresento meu projeto
E coloco em decreto
Tudo pro descamisado.
Eu tenho muito lutado
Em honra do bem-estar
De qualquer trabalhador
Não falo pra me gabar
Para todos dou atenção
Capital ou no sertão
Estou pronto pra atuar.
Como é fácil falar
Zé Rufão interferiu
Disse: meu caro Nestor
Em tempo você mentiu
Pois é muito zombeteiro
Político mais ligeiro
Que esse sertão já viu.
O que você proferiu
Eu guardei com atenção
Eu me lembro muito bem
Numa festa de São João
Você reuniu o povo
Falou para velho e novo
Projeto de irrigação.
Até o compadre Antão
Ficou muito entusiasmado
De tanto contentamento
Ele se encheu de pingado
Nesse dia bebeu tanto
Jurou ter visto um santo
De mãos-postas no roçado.
E ele agora coitado
Vive só se lastimando
Ele quando vai à feira
Dele ficam caçoando
E não pode nem ouvir
Seu nome se proferir
Fica logo se enjoando.
Até hoje está esperando
O que você prometeu
Anda muito cabisbaixo
Decepção que sofreu
Ficou mais amofinado
Do que o cachorro pintado
Quando bem-querer morreu.
Até Seu Bartolomeu
Desapontado ficou
Foi até à minha casa
E comigo se queixou
Disse-me: caro Rufão
Esse Nestor Promissão
Ele nos engabelou.
Que situação doutor
Em que você se meteu
Logo tem nova eleição
Como fica o nome seu?
Sua fama está feia
Caiu em sua própria teia
E mais um voto perdeu.
O seu grande coavalista
O deputado Aristeu
Aliás, dizem por aí
Em falcatrua se envolveu
Já se fala em delação
Jornal na televisão
Divulgou o nome seu.
Que humorista você é
Caro amigo Zé Rufão
Pois ninguém nesse país
É preso por corrupção
Antes de tudo ocorrer
Renuncia-se o poder
E aguarda nova eleição.
Amigo preste atenção
Que vou dizer pra você
Sei de cor e salteado
Como girar bambolê
Quanto maior a panela
A gente degusta dela
Lá mesmo no comitê.
O Zé Rufão quis morrer
Ouvindo esse comentário
E disse para si mesmo
Nestor é um salafrário
Que deputado sacana
Orelhudo e ratazana
Sem-vergonha e ordinário.
Eu fui mesmo um otário
Usou-me como um ioiô
Amaldiçoo o momento
Que ouvi esse gigolô
Agora estou entendendo
Porque vivia remoendo
Seus lamentos o meu avô.
Zé Rufão disse: doutor,
Chega de explicação
O que já ouvi de você
Já me serviu de lição
Porém eu vou lhe dizer
Se prepare pra perder
Essa próxima eleição.
Oh caro amigo Rufão
Pois de nada tenho medo
Já enfrentei tempestade
Bem maior do que torpedo
Eu tenho toda certeza
A eleição vai ser moleza
Para mim não há segredo.
Vejo que é muito cedo
Pra você contar vitória
Não se deslumbre Nestor
Diante dessa vanglória
Tais promessas proferidas
Além disso não cumpridas
Estão na minha memória.
No Agreste tenho história
Oh meu caro Zé Rufão
E por isso me garanto
Confio no meu povão
Até hoje não me neguei
Com bons olhos sempre olhei
Para o povo do sertão.
Quanta dissimulação
Rufão o interrompeu
Disse: meu caro Nestor
Você já se esqueceu?
Seu amigo fogo-pagou
Aristeu, o que lhe apoiou
Nunca mais se elegeu.
Que digo ao filho meu
Quando voltar ao sertão?
Nestor logo atravessa
E orienta Zé Rufão
Diga que teve comigo
Que encontraste um amigo
Pra qualquer ocasião.
Nunca que vou dizer isso
Oh meu caro deputado
Eu não quero partilhar
Do seu bloco censurado
Minha pessoa é do bem
E mentir não me convém
Tô fora do seu tratado.
Não quero ser apontado
Como o seu coautor
Todos meus amigos sabem
Não sou aliciador
Sou homem de integridade
Não aceito leviandade
O meu voto tem valor.
Oh deputado Nestor
Escute com atenção
Estou retornando lá
Pro meu querido sertão
Aliás, eu lhe garanto
Você jamais será um santo
Porém sempre Promissão.
FIM.