Boi Brasão

Boi Brasão era uma fera

verdadeira, indomável

montasse nele, já era

não era nada amável

tinha que ter as malícias

nada tinha de caricias

não conhecia o afável.

De cidade em cidade

a Companhia União

levava à comunidade

a tal fera, Boi Brasão

quem parasse no seu pêlo

fazia barba e cabelo

ganhava meio milhão.

A companhia chegou

na cidade de Miranda

e bem rápido ela apelou

a quem topasse a demanda

desse Mar de Xaraés

do meio dos aguapés

saiu o Chico Varanda.

Chico era bem franzino

homem muito esquelético

mais parecia um menino

fugia a um bom arquétipo

mais na lida da fazenda

leitor, não se surpreenda

Chico era um bicho elétrico.

Em Miranda ele chegou

como o desafiador

pra o Brasão ele olhou

sem sentir um só temor

Disse: “ — Olha aqui Brasão,

só tenho um coração

me falta um grande amor.

Vamos nós fazer um trato

de um peão montador

e de um boi que é um fato

os dois por si sem amor:

não me jogue na arena

de ti então terei pena

não te farei passar dor”.

O boi olhava o Chico

querendo desafiar

era como se um cisco

querendo então lhe comprar

consigo então a dizer:

“— Vou botá-lo pra correr!

Ninguém pode em mim parar!”

O sol ia se escondendo

por trás de uma morraria

Chico ia se benzendo

sua hora chegaria

se apegava com os santos

aconchegado em seu canto

Dizendo: “— Chegou meu dia?”

A arena iluminada

a hora estava chegando

a assistência animada

muitos chegavam gritando

“— Nesta terra de Miranda

apostamos no Varanda;

a grana não sai voando!”

A montaria começa

primeiro com os cavalos

gente que monta à beça

que não tem medo dos ralos

mas na vida de peão

muitos conheceram o chão,

doía até nos talos.

Chegou a hora bendita

do Chico então montar

no brete Brasão se agita

viu o momento chegar

oito segundos são poucos

pra deixar os peões loucos

e meio milhão levar.

Abre a porteira do brete,

o povo fica de pé;

Chico parece um moleque,

porém bem cheio de fé;

Boi Brasão se esticava,

no alto rodopiava

com o filho dos Xaraés.

Para o Chico isto é um bom prato

que se deve comer quente

parecia um carrapato

no lombo de um boi demente

o tempo então passava

o tal Chico nem “morgava”

domou o tal boi valente.

O povo boquiaberto

com o que estava a mirar

este peão bem esperto

joga o chapéu para o ar

corre por toda a arena

já viu ali uma pequena

que estava a lhe olhar.

No regaço do povão

Chico era carregado

a Compania União

chama-o então para o tablado

entrega-lhe um troféu

um belíssimo chapéu

e o prêmio tão desejado.

Antes de ir para um hotel

Chico queria saber

a menina de chapéu

que estava a se benzer

alguma coisa dizia

que era a mulher que queria

para com ele viver.

O capataz da fazenda

em que Chico trabalhava

dizia: “— A bela prenda,

que pra você tanto olhava,

é filha do Juvenal

um rico industrial

que para cá já migrava”.

Chico estava no hotel

em que a prenda se hospedou

bancou então um segrel

uma canção poetou

quando foi de madrugada

com a cidade sossegada

o Chico então cantou.

Bem debaixo da janela

do quarto da tal amada

ele esperava que ela

desse então uma olhada

a janela se abriu

da alcova então surgiu

a bela emoldurada.

Chico abriu um sorriso

sacou então de uma rosa

se sentiu no paraíso

nesta noite gloriosa

deu um beijo na tal flor

bem cheio de muito amor

e ela sorriu dengosa.

“— Quero saber o seu nome!”

Disse o Chico atordoado.

Ela disse: “— É Simone!

Eu sou da Grande Dourados.

Amanhã nos falaremos,

melhor nos conheceremos,

mas, com o meu pai do meu lado.”

Chico então foi dormir

não querendo acreditar

no que estava a sentir

não dormiu só de pensar

que pela primeira vez

o suor em sua tez

estava então a rolar.

Era com medo do velho?

Com medo da emoção?

Ficava então vermelho,

palpitava o coração;

quando amanheceu o dia

Chico Varanda tremia

em pensar na situação.

Logo bem de manhãzinha

foi tomar o seu café

lembrou de sua mãezinha

fez uma oração de fé

quando olhou para a porta

o Seu Juvenal de botas

entrou tirando um boné.

Caminhou para o herói

dando-lhe os parabéns

“— Se fosse outro – me dói –

só de pensar no amém

já estava do outro lado

com Deus ou com o diabo

ou num hospital também.”

O Seu Juvenal pediu

para sentar do seu lado

a Simone então sorriu

parecia combinado

o Chico, então, sem rodeio

mesmo a temer fazer feio

foi logo ao interessado.

“— Seu Juvenal, me permita,

o senhor não me conhece,

a minha vida se agita

com o que comigo acontece,

sua filha eu conheci

e agora é que entendi

Deus atendeu minha prece.

Quero a sua permissão

pra sua filha namorar

mesmo eu sendo um peão

duro na queda a montar

sou um homem emotivo

sei que tenho meus motivos

pra o meu pedido deixar.”

“— Chico Varanda, o pedido

é honrado e sei eu

esse bicho atrevido

que tão já te acometeu

é coisa muito das boas

pois um dia em Três Lagoas

também me acometeu.

Simone, minha querida,

ouviu o apelo feito?

Pois é toda a tua vida

que pede este sujeito.

Você está com a palavra,

o que se falar, se lavra,

pois não quero o rejeito.”

“— Meu pai, eu sei o que quero!

Chico é um homem de bem,

tem a honra que venero,

honestidade também.

Se lhe der a permissão,

eu lhe dou meu coração,

com o meu amor recém.”

Chico Varanda e Simone

começaram a namorar

Seu Juvenal, um bom homem

pensa em os ajudar

Disse então: “— Monto um curtume,

a gente então se une,

vamos então prosperar.”

Chico e Simone casaram

felizes então viviam

montaram o tal curtume

os dois assim floresciam

sempre então no matadouro

verificava os couros

que então eles curtiam.

No frigorífico ele foi

pra ver a nova boiada

triste em ver cada boi

no fim da triste jornada

palpitou seu coração

viu então o Boi Brasão

nesta triste caminhada.

A dona da compania

de quem era o Boi Brasão

vendo que então falia

se desfez do ganha-pão

o touro agora era boi

agora tudo se foi

restou-lhe só a razão.

“— Por favor, pare a matança!”

Gritava desesperado.

“— Eu fiz uma aliança

com esse boi mais erado

se me deixasse viver

e eu chegasse a vencer

seria gratificado.”

Chico pagou o valor

que lhe fora exigido

levou-o com muito amor

para um pasto corrigido

pois além do meio milhão

recheou seu coração

com a flecha do cupido.

Aldair Lucas
Enviado por Aldair Lucas em 14/09/2007
Reeditado em 31/03/2018
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