NO TEMPO EM QUE EU ACREDITAVA EM PAPAI NOEL!!!

Eu fui menino da roça

Nascido numa palhoça

Nas brenhas dos cafundós,

Criado sob a essência

Da candura e da inocência

Que imperava entre nós.

Mas como todo menino

Desde muito pequenino,

De uma maneira fiel

Eu por ser um inocente

Dava crença plenamente

Ao velho Papai Noel.

E como toda criança

Alimentava a esperança

Que na noite de natal

O Papai Noel viria

Trazer o que eu lhe pedia

Nessa data especial.

E não era coisa fina

O que eu pedia, imagina!

Meu pedido era uma asneira,

Somente um caminhãozinho

Pequeno e bem vermelhinho

Que eu tinha visto na feira.

Pedi-o a papai querido

Que me disse comovido

Filho eu não posso comprar

Com o dinheirinho que eu tinha

Comprei feijão e farinha

Pra gente se alimentar.

Vi a imagem do fracasso

Nele, que com embaraço,

Comovido olhou pra mim,

E com a voz embargada

Pela mágoa sufocada

Começou dizendo assim.

Você entende meu filho?

Vi sua face sem brilho

Fazer-me essa indagação,

Eu, sem entender direito,

Fiquei um pouco sem jeito

Mas dei-lhe a confirmação.

Fiquei tristonho, no entanto,

Ao ver escorrendo o pranto,

Provindos do seu olhar

E a expressão decadente

Por eu pedir-lhe um presente

E ele não poder me dar.

Com a sua voz tremulante

Balbuciou soluçante,

Numa frase comovente

E em tom de desengano,

Filho espera, para o ano,

Vou tentar dar-te o presente.

Eu lhe disse com carinho

Não ligue não papaizinho,

O senhor fez seu papel!

Sei que não agiu por mal,

Deixa chegar o natal

Que eu peço a Papai Noel.

Minha frase desmedida

Magoou mais a ferida,

Contida no peito seu,

Porque ele já sabia

Que Noel não atendia

Aquele pedido meu.

Apesar de já saber

Ele não quis me dizer

Que aquilo era uma ilusão

Deixou-me a esmo pensando

E a mágoa lhe atormentando

No fundo do coração.

Passou-se o tempo, afinal,

Quando chegou o natal,

Eu fui até a janela

Sonhando com meu presente

Coloquei lá no batente

Minha surrada chinela.

Eu sempre ouvia o boato

Que colocando o sapato

De noite na janelinha

Ganhava um presente belo!

Coloquei só um chinelo,

Porque sapato eu não tinha.

Fiquei naquela tensão

Deitei na rede e então,

Logo o sono me embalou

Eu cochilei de repente

Dormindo profundamente

Nem vi que o natal passou.

Foi cedo que adormeci

Ligeiro, nem percebi,

Que era apenas nove e meia,

Comi fava com verdura

Por não ter outra mistura

Nem peru naquela ceia.

Lá qualquer comida é boa

Contanto que a pessoa

Possa dormir satisfeito,

Porque o natal no mato

O campesino de fato

Nem sabe o que é direito.

Quem mora nesse rincão

Não cultiva a tradição

De um jantar bem refinado

Pois junto com os filhos seus

Dar graças e louva a Deus

Se estiver alimentado.

Foi assim que fui dormir

Nem esperei assistir

De Deus Menino a chegada,

Sem festejos, sem foguetes,

Sem farturas nem banquetes

Só o flagelo e mais nada.

Quando o dia amanheceu

Fui ver se o presente meu,

Já estava a minha espera,

Fiquei infeliz, tristonho,

Ao ver que o meu doce sonho

Não passava de quimera.

Fiquei ali meditando

Cabisbaixo, observando,

O motivo do destrato!

Meu pedido foi negado,

Só por eu ter colocado

Chinelo ao invés de sapato?

Mas se na vida mesquinha

Um sapatinho eu não tinha

Por isso é que agi assim,

Mas Noel não foi sensato

Simplesmente foi ingrato

Sequer se lembrou de mim.

Em meio a desilusão

Eu pensei, tem nada não,

Parei de me lamentar

Papai veio aperreado

Deu-me um abraço apertado

Tentando me consolar.

Dizendo assim: meu filhinho

Você é pequenininho,

Mas em breve irá crescer

E verá que Papai Noel

É insensato, é cruel,

É um desmancha prazer.

E de fato eu fui crescendo

E aos poucos fui entendendo

Tudo que papai me disse

E vi que o tal velho chato

Era um fantoche barato,

Uma farsa, uma tolice.

O boneco bonachão

Tagarela, brincalhão,

Jamais cumpre o que promete,

Com a sua falsa alegria,

Pois é mera fantasia

Uma simples marionete.

Para a criança abastada

Ele serve de faixada

Pra vê-la feliz, contente,

Mas, é tudo falsidade,

Porque na realidade

Veio dos pais o presente.

Alguns anos mais além

Eu tornei-me pai também,

E senti a desilusão

Quando meu filho pediu

Um brinquedo que ele viu

E eu tive que dizer não.

Lembrei o caminhãozinho

Quando eu pedi com carinho

Ao meu pai antigamente

E provei do amargor

Do desconforto e da dor,

Que ele sentiu certamente.

Como ele, também eu,

Não dei para o filho meu

O brinquedinho sonhado

E ali naquele momento

Senti o remordimento

Que ele sentiu no passado.

Essas são realidades

Duras, porém são verdades,

Vividas no meu outrora

Que ainda abalam meu peito,

E em versos dei-me o direito

De relatá-las agora.

Não creio em Papai Noel

Pois esse velho cruel

Só me deu desesperanças,

Mas, de maneira geral,

Desejo um feliz natal

Para adultos e crianças.

Carlos Aires

21/12/2018