Festa de aniversário

Sou um daqueles sertanejos

Que se larga nos traquejos

E nem lembra de almoçar

Certa vez levantei cedo,

Um frio que até dava medo,

Mas eu tinha que encarar.

Tinha até vaca caída,

Mandacaru para comida

E só eu pra labutar

Era um dia de São João,

Coisa que no meu sertão

Não pode deixar passar.

Lembrei-me d’uma morena

Coisa bela, tão serena

A menina era faceira.

O diabo lhe atentou

E não é que ela passou

Bem em frente da porteira...

Puxei logo uma conversa

Me mostrou que tinha pressa,

Estava indo se arrumar

Mas falou na minha testa

-Te espero lá festa,

Não me deixes esperar!

Com o resto d’água do cocho

Deu mal para lavar o rosto,

Mas compensei com perfume...

Logo cheguei na cidade

Todo cheio de vaidade,

Tinha mulher pra cardume...

Encontrei com Zé da Nica,

Pedi logo uma dica,

Velho amigo estudado...

Não sei bem o que fazer

Se entro ou se vou beber,

- Meu dinheiro está contado.

Quando eu olhei de lado,

Vi que um certo rebolado

Vinha pra cima de mim

-Perguntou não vai entrar?

Estou a fim de esquentar,

Eu também estava a fim...

Só não posso ir agora,

Vou ficar um pouco fora

Acompanhando um amigo

-Ela disse eu vou lá dentro

Mas, não fique com tormento

Hoje eu vou ficar contigo.

Zé então me perguntou

Onde você arrumou

Esse belo avião?

-Ela está apaixonada,

Sou eu que não quero nada

Tá doidinha de paixão...

Volta e meia vinha ela,

Linda como a primavera

Comigo se abufelar.

Falei pra rapaziada

Esta é a namorada

Que todos sonham casar

Lá pras três da madrugada

Uma confusão danada

Para as bandas do salão...

Eu como bom curioso,

Sertanejo, astucioso

Emburaquei no portão.

Forcei logo a minha entrada

Junto com a molecada

Pra perto dos alvoroços;

Duas mulheres agarradas

Nos cabelos, nas dentadas

E unhas pelos pescoços.

Comecei logo indagando

Porque elas estão brigando?

- Vão acabar o forró.

-Macho! É a razão das brigas

Dessas duas, e eram amigas,

Me respondeu Zé Gogó.

Uma das duas safadas

Era então a namorada

Que mais cedo me gabei

O homem era casado,

Um cabra desmantelado,

Sujeito fora da lei.

XV

Fui saindo de fininho

Peguei logo o meu caminho

Sem responder comentário

A estória se espalhou

Tem dez anos que eu não vou

Nem festas de aniversário!

Ticiano Félix