A OUTRA FACE DO CANGAÇO

A OUTRA FACE DO CANGAÇO

Francisco Luiz Mendes

Meu caro amigo leitor

Do folheto popular

Nestes versos quero apenas

Com clareza relatar

“A outra face do cangaço”

Que ficou, pois, sem contar.

Quando se fala em cangaço

Lembramos de Lampião

Tudo que ele praticou

Nas quebradas do sertão

Do Nordeste brasileiro

Conforme a divulgação.

Lampião foi bandoleiro

E não tem como negar

Nem tudo aquilo que dizem

Ele veio a realizar

O outro lado da história

Ninguém se atreveu a falar.

Naquela época a imprensa

Igualzinha em cada estado

Divulgava o desgraceiro

Por Lampião praticado

Porém do seu inimigo

Nadinha era comentado.

Naquele tempo a polícia

Versava-se por volante

Era um grupo chefiado

Por um certo comandante

Opondo-se ao cangaço

E a qualquer simpatizante.

Com a caça iniciada

Na busca dos cangaceiros

Era para executar

Todos esses bandoleiros

Não era nem pra ficar

Rastros desses desordeiros.

Essa era a ordem do tal

Chefe de estado da vez

Pois cumpri-la era preciso

Para ele uma honradez

Ver o bando cangaceiro

Na sua total viuvez.

Esses grupos de soldados

À caça de Lampião,

Eles saiam sertão afora

Feito cavalo do cão!

E ai daquele coitado

Que não desse informação.

Aliás, qualquer suspeito

Não importava etnia

Tão logo era questionado

Em pleno brilho do dia

Se gaguejasse nas frases

Depressa o couro comia.

A volante era perversa

Não havia piedade

Temida do sertanejo

Por sua brutalidade

Agia com força total

Em nome à juricidade.

Incriminava o cangaço

Ali por toda a fronteira

Lá na casa dum roceiro

A sua filha solteira

Era estuprada sem dó

E não tinha choradeira.

Semana subsequente

No jornal da região

Notícia tava estampada

Sobre essa defloração

Que o feito foi praticado

Do bando de Lampião.

O pacato lavrador

Tava sempre vigiado

Por fim, qualquer burburinho

Esse era logo intimado

Para ir à delegacia

Para ser interrogado.

Perante tantas perguntas

Aquele pobre senhor

Com tais respostas confusas

Irritava o ouvidor

A volante entrava em cena

Aí era aquele horror.

Todo “não” para a volante

Era a pior a resposta

Mentira a incomodava

Deixava-a descomposta

Só a verdade convinha

Perante a sua proposta.

A pressão era medonha

Lá no Agreste nordestino

Lares eram invadidos

Em nome de Zé Rufino

O tenente caçador

Do capitão Virgulino.

O sujeito se gabava

Dos seus feitos praticados

E com naturalidade

Contavam bem detalhados

Desses muitos sertanejos

Por ele foram surrados.

E famílias agrestinas

Sem paz e desesperadas

Pois além dos cangaceiros

Tantas vezes saqueadas

Também havia volantes

Roubando suas moradas.

A volante era covarde

Açoitava a sangue frio

O trabalhador brejeiro

Que vivia do plantio

Ele nada tinha a ver

Com esse seu desafio.

A volante era pior

Que o bando de Virgulino

Assassina e sanguinária

Feito um animal felino

Na sua atrocidade

Terror do povo agrestino!

De senhor Ladislau Reis

Era chamado um tenente

Que chefiava a volante

Temida por muita gente

Um homem sem coração

Era sórdido e delinquente.

Esse senhor Ladislau

Apelidado o Santinho

Mas por onde ele passava

Deixava ali o seu selinho

Ai daquele cangaceiro

Que cruzasse seu caminho.

Famoso em toda a ribeira

Por sua ferocidade

Assim era o Ladislau

Praticante da maldade

Perverso e mau-caráter

E sem personalidade.

O cangaceiro Baliza

Vítima desse sujeito

Em território baiano

Passou a ser o alvo eleito

E nas mãos de Ladislau

Era um deleite perfeito.

De cabeça para baixo

Numa árvore pendurado

O cangaceiro ficou

Exposto a cada soldado

Pra fazer o que quisesse

Com o tal famigerado.

Foram diversos disparos

No alvo à disposição

Ladislau lá no comando

Sem dó e nem compaixão

Atiçou fogo no corpo

Completando sua ação.

Após aquele seu feito

A vítima degolou

Aquela cabeça exposta

Para a cidade levou

Como se fosse um troféu

Para o povo apresentou.

O ato de selvageria

Foi mesmo de arrepiar

A repercussão enorme

Fez a imprensa se calar

Aliás, pois, ai daquele

Que viesse a comentar.

Essa prática era praxe

De cangaceiro e volante

Numa caçada e noutra

A barbárie era atuante

Ambas as partes sabiam

Da ira dos comandantes.

Contudo, essas volantes

Tais quais mais violentas

Coiteiros nas suas mãos

Sofriam grandes tormentas

Os cercos eram constantes

Dessas tropas truculentas.

Pra obter informação

Do coito de cangaceiro

A volante vigiava

Certo suspeito roceiro

Bem na calada da noite

Feito velho raposeiro.

Não tivesse o que queria

A volante era sem dó

Atacava o agricultor

Feito abelha-sanharó

E ameaçava afogar

Família num igapó.

Esse camponês coitado

Tava entre a cruz e a espada

Sua vida tava em jogo

A família ameaçada

Nem pensava duas vezes

Dali fazia arribada.

Todo tipo de violência

O sertanejo sofria

Na vida não tinha paz

Nem de noite e nem de dia

Volante não dava trégua

Mais vítima ela fazia.

Já chegava advertindo

O senhor daquele lar

Queria por que queria

Uma pista farejar

Se dali nada saísse

O cancão ia piar.

A qualquer preço a volante

Queria uma informação

Na base da bofetada

Pontapé e muxicão

Era a cena produzida

Na pista de Lampião.

Quando alguém anunciava

Lá vem a volante tal

Aquele pai de família

Corria pro matagal

Para bem se proteger

Desse bando bestial.

Outra era a tal volante

Do tenente Ladislau

Também era apelidada

Pelo nome de Anjo Mau

Matuto dela fugia

Feito o cão da cruz de pau.

Tal foi a situação

Da vida do sertanejo

E também do agrestino

Passando-se por despejo

E tantas humilhações

Dum bando de malfazejo.

Enquanto rondou volante

Camponês não tinha espaço

Corria dum lado pro outro

Tal qual um bicho no laço

Assim, pois, se revelou

“A outra face do cangaço”.

FIM.

Francisco Luiz Mendes
Enviado por Francisco Luiz Mendes em 04/07/2020
Reeditado em 09/01/2022
Código do texto: T6996330
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