Cordel - Num dia de Halloween (Lê-se "Ralouim")
Num dia de Halloween (Lê-se "Ralouim")
(Poeta Felipe Amaral)
1
Fui a uma velha casa
De um lugar malassombrado,
Deparei-me com finado
E alma co'os olhos em brasa.
Ante horror que se extravasa,
Eu contemplei um motim
De almas penadas que vim
A consultar, na intenção,
De obter uma predição
No dia de Halloween.
2
Perante uma assombração
De um velho bruxo ancestral,
Obtive um claro sinal
De que havia na mansão
Uma botija no chão
Do ressequido jardim.
Nele abundava um capim
Que escondia o tal tesouro.
Desenterrei muito ouro
No dia de Halloween!
3
Alma de judeu e mouro
Vieram me auxiliar
Pra que o pudesse levar
Pra fora, sem mau agouro.
Vulto de hiena, cão e touro
Se aproximavam de mim
Pra me assustarem e, assim
Que adentrei meu casarão,
Todo o ouro virou carvão
Num dia de Halloween.
4
Fiz ma convocação
De amigos pra me ajudarem
A, comigo, retirarem
De casa todo o carvão.
Lamentaram que a visão
Quedasse em tão triste fim.
Mas, depois dessa hora ruim,
Dei um baile a fantasia,
Trazendo nova alegria
Ao dia de Halloween.
5
Na minha sala, uma tia
"Operava" um caldeirão,
Preparando uma poção
De um livro de bruxaria
Com flor de Santa Maria,
Mastruz, arruda e alecrim,
Malva e óleo de benjoim,
Pernas de aranha e morcego
Pra "sessão do descarrego"
Do dia de Halloween.
6
Tudo corria em sossego,
Quando um "bicho" apareceu.
Um vulto da cor de breu
Em pleno "Ritual Grego"!
Tirou do lar o aconchego,
Vociferando em latim.
Alto como um "Enaquim",
Feio como um "Anunaque"
Desferindo-me um ataque
No dia de Halloween.
7
Não vendo bruxos de araque
Fitando o seu abantesma,
Murchou, então, como lesma,
Envergonhado e basbaque.
É que o forte contra-ataque
Dos magos, frente ao festim
Desse espírito arlequim,
Subjugou-o ali de vez
Com rigor e rapidez
No dia de Halloween.
8
Mas esse dia se fez
Inda mais sinistro e lívido,
Mesmo ante o festejo vívido
Da data daquele mês.
Fomos, eu e mais uns três,
À mata de algum confim
Pra, em rito tupiniquim,
Falar co'um antepassado,
Demos co'um vulto abusado
No dia de Halloween.
9
O fantasma endiabrado
Perseguiu-nos no retorno,
Só pra nos causar transtorno,
Ao adentrar o sobrado.
Unimos todo o listado
Grupo de magos pra, enfim,
Expulsarmos o Caim
Que adentrara o nosso Éden
Com condões que não se medem
No dia de Halloween.
10
Ele era dos que não cedem,
Nem diante de feitiços
E prodigiosos serviços
Dos que, em arte e dom, excedem.
É que, pra que esses arredem,
É necessário, outrossim,
Peitá-lo co'o espadim
Da resistência ordenada
Que não falha ou teme nada
Em dia de Halloween.
11
Assim, a noite calada
Tornou-se oportunidade
De mostrar autoridade
E empenho ante a questão dada.
Foi a sala organizada
Sem nenhum bruxo mirim
Pra se acabar co'o "pantim"
Desse espectro zombeteiro,
Mangador de feiticeiro
Em dia de Halloween.
12
Xamã, pajé, mandingueiro,
Magista com nigromante,
Juntaram-se todos diante
De uma mesa de pereiro
Pra seguirem um roteiro
De ocultismo sem esplim,
A fim de estarem a mim
Unidos nessa disputa
Contra essa entindade bruta
No dia de Halloween.
13
Iniciamos a luta
Com Goétia e com grimórios,
Poções, passes, infusórios,
E uma Teurgia arguta.
Talismã que a luz desfruta,
Mantra, esconjuro e anexim
De rito em grego e latim
Pra exorcizarmos o vulto
Hostil ao Saber Oculto
No dia de Halloween.
14
Apresentava-se inculto
O solo ritualístico,
Então, com mais ardor místico,
Lidamos com tal tumulto.
Tal espírito insepulto,
Já co'os olhos cor carmim,
Praguejava, no estopim
De um outro de seus levantes,
Lançando ao chão as estantes
No dia de Halloween.
15
Em meio a "mesas girantes",
Lâmpadas intermitentes,
Gritos e ranger de dentes,
Cadeiras esvoaçantes,
Portas batendo em rompantes
De violência sem fim,
Da alcova do "camarim"
Saiu de uma alma um insulto
Que assustou aquele vulto
No dia de Halloween.
16
Vi aquele vulto estulto
Calar-se ante o tal fantasma,
Quedado e co'a alma pasma
Qual guri frente a um adulto.
O espectro jurisconsulto
Pôs naquele pleito um fim
Citando o "Abramelim"
Com tremenda maestria
E operando uma magia
No dia de Halloween.
17
Nunca esquecerei o dia
Que isso tudo aconteceu,
Que o evento que se deu
Foi de causar agonia.
Mas, inda bem, que, por via
De algum anjo querubim
Ou arcanjo serafim
A peleja foi findada,
Presa aquela penada
Num dia de Halloween!